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Desejos malucos

14 de Abril de 2016, por José Antônio

Sempre nutri uma simpatia pelo Schopenhauer. Não acho que ele seja tão pessimista assim. Se fosse, não escreveria coisa alguma, pois quem escreve é movido pela expectativa de ser lido e comentado por alguém. E isso é um tipo de otimismo.

Uma das coisas que me fascina no velho mestre é a sua discussão do desejo e do sofrimento. O homem está condenado a sofrer, pois o que move o ser humano é o desejo. Ora, desejamos o que não temos, logo... sofremos por isso. Como é o desejo que nos impele a viver, temos que desejar, temos que sofrer, senão a vida fica estagnada. Deve ser o tal do Vale de Lágrimas.

Nas cercanias do Vale de Lágrimas, já ouvi histórias das mais malucas envolvendo o desejo. Meu amigo Leovaldo, sempre cismado, uma vez me contou um desejo antigo seu: gostaria de ser mágico de circo. Ponderei que ele pode achar vários livros que ensinam a fazer mágicas. É só comprar um, procurar uma festinha de família e fazer uns numerozinhos com a cartola. Mas não. Tem que ser num circo.

Até a minha Tia Zenóbia, filósofa macróbia e de talento sagaz para as sutilezas da vida, já me confessou um desejo secreto: pular de paraquedas, mas de cabeça pra baixo.

Grávidas, então... Elas são prenhes dos mais inusitados desejos. Já vi mulheres grávidas com as mais estranhas vontades de comer o absurdo: chantily com coca-cola, sabonete ralado, pó compacto, pizza de jiló com cobertura de banana, miojo com acarajé, café com talco...

Cá comigo, também carreguei e carrego alguns desejos malucos. Uns eu já abandonei, uma vez que foram consumidos pela própria esquisitice. Dois deles eram da minha infância: queria ser dono de funerária, coveiro e sineiro de igreja. Kit completo do funeral. Também andei desejando ser o Batman. Essa eu levei pra frente, mas o riso alheio me levou pra trás.

No entanto, há uns desejos malucos que me perseguem até hoje. Por exemplo, tenho uma vontade louca de ter um caminhão. Conservá-lo caprichosamente na garagem, passar uma flanela nele, sair com o meu caminhão só nos fins de semana para um passeio tranquilo. Outro desejo que tenho é o de ter um guarda-chuva amarelo. Bizarrice, confesso, mas fazer o quê? Sei lá se eu sairia com o meu guarda-chuva amarelo na rua. Acho que não. Mas só de saber que eu consegui ter um guarda-chuva amarelo eu já ficaria contente.

O último desejo maluco que me assaltou foi uma dessas vaquinhas de borracha. Elas são pequenas e baixas, tem umas azuis e outras vermelhas. De vez em quando, aparece alguém vendendo uma porção delas por aí. Um dia, ainda vou comprar uma dessas vaquinhas de borracha. Quando conto isso, riem de mim... principalmente do nome que vou dar a ela: minha vaquinha vai se chamar Farofa. Nem ligo.

 

O vale das lágrimas é um mistério. Desejar também é um mistério. Se um dia eu conseguir o meu caminhão, abrir o meu guarda-chuva amarelo e comprar a Farofa, eu vou ter que começar a desejar outras coisas. Caso contrário, minha vida perderá o sentido, pois deixarei de desejar. Seria, então, o tempo de eu precisar do agente funerário, do coveiro e do sineiro pro meu enterro. Tô fora! Nem que eu tenha que ressuscitar o Batman!  

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