Contemplando as Palavras

Abril comemorativo

24 de Abril de 2024, por Regina Coelho 0

Em comum, além do fato principal de serem dois gigantes imortais da literatura universal, Miguel de Cervantes (*29/9/1547 - suposta data/ †abril de 1616) e William Shakespeare (*1564 – abril - †1616) morreram em dias aproximados. O primeiro, em 22 de abril, com sepultamento no dia 23/4 seguinte, registro datal esse (contestado), o qual também é o do falecimento de Shakespeare, que teria morrido em 3 de maio. Em que pesem essas imprecisões de datas, o 23 de abril foi instituído em 1995 pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, em inglês, United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) como o Dia Mundial do Livro pela relevância de ambos nas artes literárias.

Romancista, dramaturgo e poeta, Cervantes é considerado o precursor do realismo espanhol pelo seu magnífico Dom Quixote de La Mancha, um dos livros mais lidos e traduzidos do mundo, perdendo apenas para a Bíblia. Nele, o protagonista Dom Quixote é um fidalgo de meia-idade que, totalmente envolvido pela intensa leitura de obras sobre cavaleiros e seus grandes feitos, acaba enlouquecendo e parte em aventuras pela Espanha (terra do autor), em seu delírio, acreditando ser um cavaleiro e por isso poder se tornar um herói. A história é uma paródia bem-humorada dos romances de cavalaria da Idade Média. E o personagem Dom Quixote é a representação do homem ingênuo e improvável sonhador em quem certamente se inspirou o brasileiro Lima Barreto, três séculos mais tarde, ao criar nosso similar nacional na figura do quixotesco Policarpo Quaresma do seu pré-modernista O triste fim de Policarpo Quaresma.

Não menos merecedor de ter o nome associado definitivamente ao livro e, por óbvio, ao que de mais extraordinário esse objeto guarda em suas páginas, o criador do grande clássico Romeu e Julieta, só para ficar no mais conhecido, foi poeta, dramaturgo e ator. Para muitos, o maior escritor da língua inglesa. Sua obra, por sinal, marcada pela atemporalidade, é constituída, notadamente a parte teatral, por um vasto cenário que suscita desde sempre reflexões sobre a condição humana, o que o consagrou mundialmente, ao longo dos anos, lido e admirado pela força universalista de sua produção. A Shakespeare cabe com perfeição o honroso título de “o poeta nacional da Inglaterra”, na verdade, do Reino Unido como um todo.

No Brasil, por força de uma lei federal (de 2002), o 18 de abril se tornou o Dia Nacional do Livro Infantil, uma homenagem a Monteiro Lobato (1882-1948) pelo dia do seu nascimento. Reverenciado como o primeiro (ou um dos primeiros autores) a escrever para crianças, Lobato é lembrado, entre outras proezas artísticas, por dar “vida” a personagens memoráveis: a boneca Emília, Narizinho, Pedrinho, dona Benta, tia Nastácia, o visconde de Sabugosa... todos habitando “O Sítio do picapau amarelo” (nos dicionários, pica-pau). De uns anos para cá, parte de seus escritos vem sendo questionada, atacada até, por seu viés racista, assunto para discussão em uma outra oportunidade.

Datas comemorativas são dias naturalmente marcados ou escolhidos para relembrar eventos históricos, conquistas importantes ou lutas que ainda estão sendo travadas por um grupo ou pela sociedade, em geral. Já as menções acima se prestam a propostas de incentivo à leitura, de difusão da literatura e do compartilhamento do saber.

Em se tratando de abril, aqui associado à lembrança dessa celebração dupla a cada ano em prol do livro, essencial destacar os 21 anos de existência do Jornal das Lajes, neste mesmo mês completados. Um bonito feito, convenhamos, desse nosso queridíssimo periódico, que vem a cada mês registrando e construindo histórias, produzindo conhecimento e promovendo leitura de boa qualidade a seus leitores.

 

P.S. – Dedico o presente artigo a Ziraldo (in memoriam), sobre quem escrevi aqui na edição de novembro de 2022 o texto Eterno Maluquinho. Eterno Ziraldo, ferrenho defensor da ideia de que “ninguém tem de ser premiado porque lê”. Segundo ele, “ler já é o prêmio. Gostar de ler, a distinção”.

Entre o bem e o mal

27 de Marco de 2024, por Regina Coelho 0

Alguém já disse que o celular é hoje o que foi a antes imprescindível campainha das casas de uma época não tão antiga. Ao tocar, e toca em qualquer lugar, ele leva a vantagem (ou seria a desvantagem?) de ser ouvido sempre, o que costuma não ocorrer com os quase esquecidos din-dons soando em vão nos ambientes vazios e contando cada vez mais com a concorrência dos interfones. Nesse contexto, sendo isso bom ou ruim, fica difícil a pessoa não ser encontrada, melhor, contatada nos dias atuais.

Assim, através de mensagens de textos e/ou de áudios, de chamadas de voz e de vídeo, vamos encontrando as pessoas diariamente pelos cliques constantes dos nossos smartphones, às vezes até quando o fazemos estando num mesmo pequeno espaço físico em que está a pessoa com quem falamos. Curiosamente, a simples ligação, é claro, pelo celular (os telefones fixos são uma espécie ameaçada de extinção), por meio da procura e do uso da lista de contatos, substituta do nosso desaparecido catálogo telefônico, parece não ter a preferência geral.

Inimaginável é viver os dias de agora sem o celular (e, de quebra, sem o computador). Chega a causar espanto a muitos constatar que ainda existe uma minoria, bem minoria de fato, que resiste a usar o tal aparelho. O mesmo que praticamente desbancou o relógio de pulso, a calculadora, o despertador, a agenda, o gravador, a máquina fotográfica e por aí vai. Que coisa fantástica! Sim. Viva a tecnologia! Viva! A gente anda é pra frente. Certo. Mas, com o tempo, algumas correções de rumo vão se fazendo necessárias pelo caminho.

Nestes ultraconectados tempos, por exemplo, uma questão encontra-se na pauta de discussões e deliberações mundo afora e aqui, com o propósito de balizar, de demarcar o que se desenvolve em terreno saudável e o que se alastra de maneira desordenada e danosa, principalmente na faixa que abrange os mais jovens.

Fala-se da presença maciça dos celulares nas mãos de crianças e adolescentes nos domínios das escolas, nas salas de aula em especial, e do que isso impacta no aprendizado escolar. Seguindo o fluxo observado em muitos países, Itália, França, Reino Unido, Holanda, entre outros, o Brasil se mexe também, igualmente na direção de saídas para essa nem sempre positiva relação aluno/celular/escola. Incluídas aí as escolas de Resende Costa, onde os celulares não são bem-vindos.

Em agosto do ano passado, Eduardo Paes, prefeito do Rio, assinou um decreto que obriga os estudantes da rede municipal a manter guardados seus aparelhos, mas abre exceção para que os professores possam requisitá-los às turmas para fins pedagógicos. Iniciativas semelhantes já vêm sendo testadas por toda parte, como Finlândia e Alemanha, que amenizam a vigilância de acordo com a idade do aluno – quanto mais velho for, maior o uso que fará do smartphone para os estudos ou para a hora do recreio. Por outro lado, os celulares não têm vez nas escolas chinesas (nos ensinos fundamental e médio).

Existe um consenso entre os educadores sobre como esses eletrônicos podem tirar a concentração dos alunos. Um outro ponto a considerar é que, usados em solitária navegação, estando cada um(a) no seu canto do próprio ambiente da escola nos momentos de relaxamento, eles podem dificultar e até impedir a necessária interação social entre os que estão próximos. E o que é ainda pior. Há comprovações de que o uso dos smartphones nesse mesmo cenário favorece o surgimento dos casos de bullying, nesse caso, o cyberbullying, logicamente um problema que extrapola os limites dos prédios escolares. Se nos inocentes anos de outrora somente a rua com tudo o que ela tem de perigoso causava grande temor aos pais, dentro de casa hoje pode morar também o perigo com a internet e seu uso indiscriminado pelos filhos ainda imaturos.

A respeito disso, um acerto: os ataques virtuais são práticas agora configuradas como crime previsto no Código Penal por lei aprovada em dezembro último no Congresso e sancionada pelo presidente Lula.

Internet? Sim, mas só para o bem. E não mais uma terra de ninguém.

O uso de citações

28 de Fevereiro de 2024, por Regina Coelho 0

em excelente entrevista publicada na edição de 31 de maio de 2023 de Veja, nas suas tradicionais Páginas Amarelas, espaço nobre do semanário, o consagrado escritor moçambicano Mia Couto foi lembrado pela repórter da revista, no transcorrer da conversa, que certa vez o escritor Umberto Eco (1932-2016) disse que as redes sociais deram voz aos imbecis. Instado pela entrevistadora a responder se concordava com o colega italiano, Couto foi mais comedido. Nem por isso deixou de se posicionar. Entre outras considerações, afirmou que na era da internet percebe que muitas pessoas só leem frases soltas dos livros nas redes. E lhe dizem ter adorado aquela sua frase, que é apenas o fragmento de uma obra muito maior, e ela é ignorada. “Os escritores viraram frasistas”, lamenta ele.

Imagino que Mia Couto nada tenha contra os frasistas, aquelas pessoas que se destacam por expressar com propriedade única ideias sobre política, pessoas, costumes, relacionamentos, enfim, ideias sobre a vida por meio de frases lapidares. Isso acontece em situações diversas. Ser letrado(a) não é necessariamente condição para que alguém produza uma frase marcante. Trata-se de um talento natural e verbal, mas daí a ver alguém desconhecer ou desconsiderar uma obra literária em si e reduzi-la a meras frases descontextualizadas, exaustivamente exploradas principalmente pelos internautas de plantão, é pra lamentar mesmo.

   Sobre essa questão, no entanto, a gente vai e volta porque, para além da larga utilização (pelos usuários assíduos das tais redes sociais) desses fragmentos de textos extraídos não se sabe de onde exatamente e transformados em mensagens, existe a possibilidade interessante do uso de uma citação. Na verdade, citar o que foi dito/escrito por alguém, famoso ou não, para ratificar como ponto de apoio a exposição de nossas opiniões não é demérito para ninguém. Muito pelo contrário. Ao mencionar e usar como argumento de sustentação um pensamento alheio vindo principalmente de gente cuja fala tem peso, como a de especialistas no assunto tratado, estamos legitimando também nossa própria opinião. Vale dizer também que esse recurso linguístico costuma ser empregado para refutar, questionar a argumentação do que foi afirmado.

De um jeito ou de outro, seja para reafirmar ou rebater um ponto de vista, não devemos é pecar pelo excesso de citações nos textos que produzimos, pois com isso podemos revelar insegurança pessoal ou afetação na tentativa de demonstrar erudição.

Um outro problema é o crédito equivocado dado a elas. No ano passado, ganhou repercussão nacional esta “pérola”: “Como diz O Pequeno Príncipe, os fins justificam os meios”. Quem disse isso foi Hery Kattwinkel, advogado de um dos réus condenados pelos deprimentes episódios de 8 de janeiro (2023) em Brasília, confundindo a obra do francês Antoine de Saint-Exupéry com O Príncipe, de Nicolau Maquiavel. Detalhe: nem mesmo Maquiavel escreveu a tal frase. Ela é atribuída ao poeta romano Ovídio. Aliás, usar o verbo atribuir quando não se sabe com certeza a autoria do que foi escrito (em sentido mais amplo, o que foi feito) por outro(a) é uma boa saída. Sobre essa questão toda, nessa e em outras áreas, esse assunto renderia um outro artigo.

Considerando os autores de língua portuguesa, Guimarães Rosa, Fernando Pessoa, Cora Coralina, Clarice Lispector, Drummond e o educador Paulo Freire são, entre outros, alguns dos mais citados pelos falantes. Às vezes, equivocadamente, em relação ao que, de fato, teriam (ou não) escrito. Por vezes, citados textualmente, ao pé da letra. Ou por meio de paráfrases, em que são mantidas no novo texto as ideias do texto original, um tipo de intertextualidade entre os dois.

Voltando às citações propriamente ditas, confesso a vocês que sou chegada a usá-las. Com moderação e pertinência, é claro. Gosto de me cercar das boas companhias, também nos meus escritos. Aprendo muito com elas sem deixar de ter minhas convicções pessoais.

Inspiração

25 de Janeiro de 2024, por Regina Coelho 0

“Quem tem fome tem pressa”. de mãos dadas com o bispo paulista Dom Mauro Morelli, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho (1935 - 1997), criou a frase que serviria de slogan da seminal Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria pela Vida, criada nos anos 1980. O movimento, bonito e fundamental, ajudou, se não a resolver, ao menos a iluminar um problema trágico do Brasil, o da insegurança alimentar, que ainda hoje é uma sombra incômoda. Morelli desde a juventude, logo depois de se formar em filosofia e teologia, se dedicou ao tema, tão próximo dos fiéis que o buscavam na diocese de São Paulo, no início dos anos 1970, como bispo auxiliar de Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016).

   A partir de suas experiências, Morelli ajudou a criar o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional durante o governo Itamar Franco (1993-1994) e o Fome Zero do primeiro mandato de Lula. Em maio de 1981, foi nomeado como o primeiro bispo da então criada Diocese de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Ele morreu em 9 de outubro (2023), aos 88 anos, em Belo Horizonte.

(Seção “Datas”, Veja, 13 de outubro de 2023)

 

Ativista dos direitos humanos, Betinho morreu antes. Mineiro de Bocaiúva, desde a infância teve a saúde frágil. Hemofílico como seus irmãos Henfil (cartunista) e Chico Mário (músico), ele tinha de se submeter frequentemente a transfusões de sangue em razão da hemofilia, uma condição hereditária que se caracteriza por hemorragias precoces, abundantes e prolongadas. Formado em Sociologia e Política de Administração Pública pela UFMG, ergueu a bandeira da transformação social voltada para o sentido do coletivo e da congregação. Após o golpe militar de 1964, atuou em organizações de combate ao regime político recém-implantado na época por aqui, motivo pelo qual foi exilado, indo morar primeiramente no Chile e depois, no Canadá e no México. Foram sete anos na clandestinidade e oito no exílio. Em 1979, com a anistia política, Betinho retornou ao Brasil.

Mencionar esse momento é lembrar a belíssima música O bêbado e o equilibrista, de João Bosco e Aldir Blanc, composta um ano antes e eternizada na voz de Elis Regina. A respeito dessa composição, João Bosco conta que, inicialmente, a ideia era fazer uma homenagem a Charles Chaplin, que havia morrido pouco tempo antes, no Natal de 1977. Mas seu parceiro musical lhe sugeriu, por conta do período sombrio de repressão que ainda se vivia no país, que fosse criado na letra um personagem chapliniano falando, através de metáforas, da condição dos mortos, torturados e exilados pela ditadura. A menção ao Brasil “que sonha com a volta do irmão do Henfil,/ com tanta gente que partiu/ num rabo de foguete” representou o anseio pela abertura política, mais tarde referendada pela lei que concedeu anistia aos perseguidos políticos e abriu caminho para o retorno da democracia brasileira.

Sonho de tantos concretizado com o retorno de Betinho e muitos outros anistiados à “nossa pátria, mãe gentil”, o cidadão Herbert de Souza voltou à luta, dessa vez engajado em várias e diferentes frentes de trabalho voltadas para a sociedade e promovendo uma verdadeira mobilização nacional em favor do seu projeto contra a fome e a miséria. O que ainda hoje é uma situação dramática vivida por milhões de brasileiros, é verdade, mas com a atenção já despertada lá atrás por gente como Betinho e Dom Mauro, para o seu enfrentamento.

Sobre os filhos de dona Maria (famosa pelas “Cartas da Mãe”, de Henfil) aqui nominados, as histórias são parecidas. Tendo driblado a morte por muito tempo e cada um obtido reconhecimento profissional e respeito também pela profunda preocupação social demonstrada em seus respectivos trabalhos, os irmãos hemofílicos acabaram contraindo o HIV em transfusões que não foram bem-sucedidas e sucumbiram. Fica a inspiração. Inspiração para as essenciais causas coletivas e para os nossos acalentados projetos pessoais.

E uma dica, a (re)visitação à vida e obra desses três irmãos de sangue na dor e no amor.

Papai Noel

20 de Dezembro de 2023, por Regina Coelho 0

é inevitável. Falar em Natal é recorrer automaticamente à imagem do Papai Noel, uma das representações mais emblemáticas da festa em que, de acordo com os preceitos do cristianismo, comemora-se o nascimento de Jesus. O aniversariante é o Deus-Menino, mas quem tem ruidosa e onipresente participação nos festejos de todo final de ano é ele, o Bom Velhinho.

Sabe-se, sob o ponto de vista cristão, que a origem desse personagem está intimamente ligada à figura de São Nicolau de Mira, um bispo nascido na Turquia em 280 d.C. que ajudava as pessoas carentes. O que se conta, entre outras coisas, é que esse santo deixava moedas perto das chaminés das casas dos menos favorecidos durante a noite. A descrição física que se tem dele é a de um homem idoso, com roupas vermelhas e uma grande barba branca, praticamente um protótipo do Papai Noel de hoje, também pela generosidade.

Quanto à ficcional criatura desenhada originalmente pelo cartunista Thomas Nast em 1862, ela nem sempre foi assim. Até 1931, o queridinho das crianças era descrito como um homem alto e magro, ou até mesmo como um duende de aparência assustadora, com uma batina de bispo e uma pele de animal de caça. Transformações visuais efetuadas ao longo dos anos à parte, inclusive com a substituição desse traje pelo agora tradicionalíssimo casaco vermelho, credita-se às campanhas publicitárias de Natal da Coca-Cola nas décadas de 1920 e 1930 e atreladas à figura de Papai Noel a consolidação desse “garoto propaganda”, literalmente também de peso, tal qual o vemos já há bastante tempo.

Para muito além da sua simples configuração humana, há um aspecto relevante envolvendo a relação das crianças com esse senhorzinho boa gente, risonho e bonachão. Na infância, até por incentivo dos pais e, sem dúvida, por influência direta da sociedade de consumo como um todo, os pequenos são levados a acreditar na existência real do Papai. Segundo especialistas do comportamento humano, a crença em mitos é saudável até perto da pré-adolescência, uma vez que o faz de conta é um artifício positivo para o desenvolvimento das crianças. E não se deve abreviar esse caminho desfazendo as fantasias naturais do mundo infantil. Por outro lado, advertem que fantasia tem limite, pois a criança não pode ficar fechada o tempo todo em seu mundinho imaginário. E aí? Eis a questão.

Li, faz uns poucos anos, uma matéria a respeito de uma pesquisa na qual se analisou o relato de cerca de quatro mil pessoas, em diversos países, sobre o momento em que descobriram que o morador do Polo Norte, seus trenós e suas renas não passam de uma lenda. De acordo com o autor do projeto, Chris Boyle (psicólogo britânico), 15% dos entrevistados admitiram ter sentido raiva diante da descoberta. E três em cada dez participantes do estudo disseram que à época da revelação passaram a confiar menos nos adultos.

“Recebi histórias muito interessantes sobre meninos que perceberam que Papai Noel não existia ao ver que sua caligrafia é a mesma de seu pai ou da mãe. Também há meninos que perguntam como um homem gordo pode descer pela chaminé ou por que um estranho pode entrar em casa. Além disso, os pais não são capazes de dizer por que as crianças ricas recebem presentes melhores do que as pobres”, comentou Boyle, cujo estudo revela ainda que, em média, crianças perdem a fé nesse senhor em forma de bondade aos oito anos.

De qualquer maneira, tão acostumados à aguardada chegada do Papai Noel com seu enorme saco de presentes para a criançada, em especial e a cada Natal, permitamos que ele se faça presente entre todos, vá lá, como uma brincadeira saudável e, de fato e acima de tudo, como um símbolo dos indispensáveis propósitos de alegria e solidariedade que devem nortear a nossa vida.

Fabular é preciso, mas há beleza real no entorno das nossas fantasias. E, se viver é mesmo melhor do que sonhar, como diz o poeta, saibamos enxergá-la por aí.

Desejo aos leitores do Jornal das Lajes um Natal de paz.