Contemplando as Palavras

Entre o bem e o mal

27 de Marco de 2024, por Regina Coelho 0

Alguém já disse que o celular é hoje o que foi a antes imprescindível campainha das casas de uma época não tão antiga. Ao tocar, e toca em qualquer lugar, ele leva a vantagem (ou seria a desvantagem?) de ser ouvido sempre, o que costuma não ocorrer com os quase esquecidos din-dons soando em vão nos ambientes vazios e contando cada vez mais com a concorrência dos interfones. Nesse contexto, sendo isso bom ou ruim, fica difícil a pessoa não ser encontrada, melhor, contatada nos dias atuais.

Assim, através de mensagens de textos e/ou de áudios, de chamadas de voz e de vídeo, vamos encontrando as pessoas diariamente pelos cliques constantes dos nossos smartphones, às vezes até quando o fazemos estando num mesmo pequeno espaço físico em que está a pessoa com quem falamos. Curiosamente, a simples ligação, é claro, pelo celular (os telefones fixos são uma espécie ameaçada de extinção), por meio da procura e do uso da lista de contatos, substituta do nosso desaparecido catálogo telefônico, parece não ter a preferência geral.

Inimaginável é viver os dias de agora sem o celular (e, de quebra, sem o computador). Chega a causar espanto a muitos constatar que ainda existe uma minoria, bem minoria de fato, que resiste a usar o tal aparelho. O mesmo que praticamente desbancou o relógio de pulso, a calculadora, o despertador, a agenda, o gravador, a máquina fotográfica e por aí vai. Que coisa fantástica! Sim. Viva a tecnologia! Viva! A gente anda é pra frente. Certo. Mas, com o tempo, algumas correções de rumo vão se fazendo necessárias pelo caminho.

Nestes ultraconectados tempos, por exemplo, uma questão encontra-se na pauta de discussões e deliberações mundo afora e aqui, com o propósito de balizar, de demarcar o que se desenvolve em terreno saudável e o que se alastra de maneira desordenada e danosa, principalmente na faixa que abrange os mais jovens.

Fala-se da presença maciça dos celulares nas mãos de crianças e adolescentes nos domínios das escolas, nas salas de aula em especial, e do que isso impacta no aprendizado escolar. Seguindo o fluxo observado em muitos países, Itália, França, Reino Unido, Holanda, entre outros, o Brasil se mexe também, igualmente na direção de saídas para essa nem sempre positiva relação aluno/celular/escola. Incluídas aí as escolas de Resende Costa, onde os celulares não são bem-vindos.

Em agosto do ano passado, Eduardo Paes, prefeito do Rio, assinou um decreto que obriga os estudantes da rede municipal a manter guardados seus aparelhos, mas abre exceção para que os professores possam requisitá-los às turmas para fins pedagógicos. Iniciativas semelhantes já vêm sendo testadas por toda parte, como Finlândia e Alemanha, que amenizam a vigilância de acordo com a idade do aluno – quanto mais velho for, maior o uso que fará do smartphone para os estudos ou para a hora do recreio. Por outro lado, os celulares não têm vez nas escolas chinesas (nos ensinos fundamental e médio).

Existe um consenso entre os educadores sobre como esses eletrônicos podem tirar a concentração dos alunos. Um outro ponto a considerar é que, usados em solitária navegação, estando cada um(a) no seu canto do próprio ambiente da escola nos momentos de relaxamento, eles podem dificultar e até impedir a necessária interação social entre os que estão próximos. E o que é ainda pior. Há comprovações de que o uso dos smartphones nesse mesmo cenário favorece o surgimento dos casos de bullying, nesse caso, o cyberbullying, logicamente um problema que extrapola os limites dos prédios escolares. Se nos inocentes anos de outrora somente a rua com tudo o que ela tem de perigoso causava grande temor aos pais, dentro de casa hoje pode morar também o perigo com a internet e seu uso indiscriminado pelos filhos ainda imaturos.

A respeito disso, um acerto: os ataques virtuais são práticas agora configuradas como crime previsto no Código Penal por lei aprovada em dezembro último no Congresso e sancionada pelo presidente Lula.

Internet? Sim, mas só para o bem. E não mais uma terra de ninguém.

O uso de citações

28 de Fevereiro de 2024, por Regina Coelho 0

em excelente entrevista publicada na edição de 31 de maio de 2023 de Veja, nas suas tradicionais Páginas Amarelas, espaço nobre do semanário, o consagrado escritor moçambicano Mia Couto foi lembrado pela repórter da revista, no transcorrer da conversa, que certa vez o escritor Umberto Eco (1932-2016) disse que as redes sociais deram voz aos imbecis. Instado pela entrevistadora a responder se concordava com o colega italiano, Couto foi mais comedido. Nem por isso deixou de se posicionar. Entre outras considerações, afirmou que na era da internet percebe que muitas pessoas só leem frases soltas dos livros nas redes. E lhe dizem ter adorado aquela sua frase, que é apenas o fragmento de uma obra muito maior, e ela é ignorada. “Os escritores viraram frasistas”, lamenta ele.

Imagino que Mia Couto nada tenha contra os frasistas, aquelas pessoas que se destacam por expressar com propriedade única ideias sobre política, pessoas, costumes, relacionamentos, enfim, ideias sobre a vida por meio de frases lapidares. Isso acontece em situações diversas. Ser letrado(a) não é necessariamente condição para que alguém produza uma frase marcante. Trata-se de um talento natural e verbal, mas daí a ver alguém desconhecer ou desconsiderar uma obra literária em si e reduzi-la a meras frases descontextualizadas, exaustivamente exploradas principalmente pelos internautas de plantão, é pra lamentar mesmo.

   Sobre essa questão, no entanto, a gente vai e volta porque, para além da larga utilização (pelos usuários assíduos das tais redes sociais) desses fragmentos de textos extraídos não se sabe de onde exatamente e transformados em mensagens, existe a possibilidade interessante do uso de uma citação. Na verdade, citar o que foi dito/escrito por alguém, famoso ou não, para ratificar como ponto de apoio a exposição de nossas opiniões não é demérito para ninguém. Muito pelo contrário. Ao mencionar e usar como argumento de sustentação um pensamento alheio vindo principalmente de gente cuja fala tem peso, como a de especialistas no assunto tratado, estamos legitimando também nossa própria opinião. Vale dizer também que esse recurso linguístico costuma ser empregado para refutar, questionar a argumentação do que foi afirmado.

De um jeito ou de outro, seja para reafirmar ou rebater um ponto de vista, não devemos é pecar pelo excesso de citações nos textos que produzimos, pois com isso podemos revelar insegurança pessoal ou afetação na tentativa de demonstrar erudição.

Um outro problema é o crédito equivocado dado a elas. No ano passado, ganhou repercussão nacional esta “pérola”: “Como diz O Pequeno Príncipe, os fins justificam os meios”. Quem disse isso foi Hery Kattwinkel, advogado de um dos réus condenados pelos deprimentes episódios de 8 de janeiro (2023) em Brasília, confundindo a obra do francês Antoine de Saint-Exupéry com O Príncipe, de Nicolau Maquiavel. Detalhe: nem mesmo Maquiavel escreveu a tal frase. Ela é atribuída ao poeta romano Ovídio. Aliás, usar o verbo atribuir quando não se sabe com certeza a autoria do que foi escrito (em sentido mais amplo, o que foi feito) por outro(a) é uma boa saída. Sobre essa questão toda, nessa e em outras áreas, esse assunto renderia um outro artigo.

Considerando os autores de língua portuguesa, Guimarães Rosa, Fernando Pessoa, Cora Coralina, Clarice Lispector, Drummond e o educador Paulo Freire são, entre outros, alguns dos mais citados pelos falantes. Às vezes, equivocadamente, em relação ao que, de fato, teriam (ou não) escrito. Por vezes, citados textualmente, ao pé da letra. Ou por meio de paráfrases, em que são mantidas no novo texto as ideias do texto original, um tipo de intertextualidade entre os dois.

Voltando às citações propriamente ditas, confesso a vocês que sou chegada a usá-las. Com moderação e pertinência, é claro. Gosto de me cercar das boas companhias, também nos meus escritos. Aprendo muito com elas sem deixar de ter minhas convicções pessoais.

Inspiração

25 de Janeiro de 2024, por Regina Coelho 0

“Quem tem fome tem pressa”. de mãos dadas com o bispo paulista Dom Mauro Morelli, o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho (1935 - 1997), criou a frase que serviria de slogan da seminal Ação da Cidadania contra a Fome e a Miséria pela Vida, criada nos anos 1980. O movimento, bonito e fundamental, ajudou, se não a resolver, ao menos a iluminar um problema trágico do Brasil, o da insegurança alimentar, que ainda hoje é uma sombra incômoda. Morelli desde a juventude, logo depois de se formar em filosofia e teologia, se dedicou ao tema, tão próximo dos fiéis que o buscavam na diocese de São Paulo, no início dos anos 1970, como bispo auxiliar de Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016).

   A partir de suas experiências, Morelli ajudou a criar o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional durante o governo Itamar Franco (1993-1994) e o Fome Zero do primeiro mandato de Lula. Em maio de 1981, foi nomeado como o primeiro bispo da então criada Diocese de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Ele morreu em 9 de outubro (2023), aos 88 anos, em Belo Horizonte.

(Seção “Datas”, Veja, 13 de outubro de 2023)

 

Ativista dos direitos humanos, Betinho morreu antes. Mineiro de Bocaiúva, desde a infância teve a saúde frágil. Hemofílico como seus irmãos Henfil (cartunista) e Chico Mário (músico), ele tinha de se submeter frequentemente a transfusões de sangue em razão da hemofilia, uma condição hereditária que se caracteriza por hemorragias precoces, abundantes e prolongadas. Formado em Sociologia e Política de Administração Pública pela UFMG, ergueu a bandeira da transformação social voltada para o sentido do coletivo e da congregação. Após o golpe militar de 1964, atuou em organizações de combate ao regime político recém-implantado na época por aqui, motivo pelo qual foi exilado, indo morar primeiramente no Chile e depois, no Canadá e no México. Foram sete anos na clandestinidade e oito no exílio. Em 1979, com a anistia política, Betinho retornou ao Brasil.

Mencionar esse momento é lembrar a belíssima música O bêbado e o equilibrista, de João Bosco e Aldir Blanc, composta um ano antes e eternizada na voz de Elis Regina. A respeito dessa composição, João Bosco conta que, inicialmente, a ideia era fazer uma homenagem a Charles Chaplin, que havia morrido pouco tempo antes, no Natal de 1977. Mas seu parceiro musical lhe sugeriu, por conta do período sombrio de repressão que ainda se vivia no país, que fosse criado na letra um personagem chapliniano falando, através de metáforas, da condição dos mortos, torturados e exilados pela ditadura. A menção ao Brasil “que sonha com a volta do irmão do Henfil,/ com tanta gente que partiu/ num rabo de foguete” representou o anseio pela abertura política, mais tarde referendada pela lei que concedeu anistia aos perseguidos políticos e abriu caminho para o retorno da democracia brasileira.

Sonho de tantos concretizado com o retorno de Betinho e muitos outros anistiados à “nossa pátria, mãe gentil”, o cidadão Herbert de Souza voltou à luta, dessa vez engajado em várias e diferentes frentes de trabalho voltadas para a sociedade e promovendo uma verdadeira mobilização nacional em favor do seu projeto contra a fome e a miséria. O que ainda hoje é uma situação dramática vivida por milhões de brasileiros, é verdade, mas com a atenção já despertada lá atrás por gente como Betinho e Dom Mauro, para o seu enfrentamento.

Sobre os filhos de dona Maria (famosa pelas “Cartas da Mãe”, de Henfil) aqui nominados, as histórias são parecidas. Tendo driblado a morte por muito tempo e cada um obtido reconhecimento profissional e respeito também pela profunda preocupação social demonstrada em seus respectivos trabalhos, os irmãos hemofílicos acabaram contraindo o HIV em transfusões que não foram bem-sucedidas e sucumbiram. Fica a inspiração. Inspiração para as essenciais causas coletivas e para os nossos acalentados projetos pessoais.

E uma dica, a (re)visitação à vida e obra desses três irmãos de sangue na dor e no amor.

Papai Noel

20 de Dezembro de 2023, por Regina Coelho 0

é inevitável. Falar em Natal é recorrer automaticamente à imagem do Papai Noel, uma das representações mais emblemáticas da festa em que, de acordo com os preceitos do cristianismo, comemora-se o nascimento de Jesus. O aniversariante é o Deus-Menino, mas quem tem ruidosa e onipresente participação nos festejos de todo final de ano é ele, o Bom Velhinho.

Sabe-se, sob o ponto de vista cristão, que a origem desse personagem está intimamente ligada à figura de São Nicolau de Mira, um bispo nascido na Turquia em 280 d.C. que ajudava as pessoas carentes. O que se conta, entre outras coisas, é que esse santo deixava moedas perto das chaminés das casas dos menos favorecidos durante a noite. A descrição física que se tem dele é a de um homem idoso, com roupas vermelhas e uma grande barba branca, praticamente um protótipo do Papai Noel de hoje, também pela generosidade.

Quanto à ficcional criatura desenhada originalmente pelo cartunista Thomas Nast em 1862, ela nem sempre foi assim. Até 1931, o queridinho das crianças era descrito como um homem alto e magro, ou até mesmo como um duende de aparência assustadora, com uma batina de bispo e uma pele de animal de caça. Transformações visuais efetuadas ao longo dos anos à parte, inclusive com a substituição desse traje pelo agora tradicionalíssimo casaco vermelho, credita-se às campanhas publicitárias de Natal da Coca-Cola nas décadas de 1920 e 1930 e atreladas à figura de Papai Noel a consolidação desse “garoto propaganda”, literalmente também de peso, tal qual o vemos já há bastante tempo.

Para muito além da sua simples configuração humana, há um aspecto relevante envolvendo a relação das crianças com esse senhorzinho boa gente, risonho e bonachão. Na infância, até por incentivo dos pais e, sem dúvida, por influência direta da sociedade de consumo como um todo, os pequenos são levados a acreditar na existência real do Papai. Segundo especialistas do comportamento humano, a crença em mitos é saudável até perto da pré-adolescência, uma vez que o faz de conta é um artifício positivo para o desenvolvimento das crianças. E não se deve abreviar esse caminho desfazendo as fantasias naturais do mundo infantil. Por outro lado, advertem que fantasia tem limite, pois a criança não pode ficar fechada o tempo todo em seu mundinho imaginário. E aí? Eis a questão.

Li, faz uns poucos anos, uma matéria a respeito de uma pesquisa na qual se analisou o relato de cerca de quatro mil pessoas, em diversos países, sobre o momento em que descobriram que o morador do Polo Norte, seus trenós e suas renas não passam de uma lenda. De acordo com o autor do projeto, Chris Boyle (psicólogo britânico), 15% dos entrevistados admitiram ter sentido raiva diante da descoberta. E três em cada dez participantes do estudo disseram que à época da revelação passaram a confiar menos nos adultos.

“Recebi histórias muito interessantes sobre meninos que perceberam que Papai Noel não existia ao ver que sua caligrafia é a mesma de seu pai ou da mãe. Também há meninos que perguntam como um homem gordo pode descer pela chaminé ou por que um estranho pode entrar em casa. Além disso, os pais não são capazes de dizer por que as crianças ricas recebem presentes melhores do que as pobres”, comentou Boyle, cujo estudo revela ainda que, em média, crianças perdem a fé nesse senhor em forma de bondade aos oito anos.

De qualquer maneira, tão acostumados à aguardada chegada do Papai Noel com seu enorme saco de presentes para a criançada, em especial e a cada Natal, permitamos que ele se faça presente entre todos, vá lá, como uma brincadeira saudável e, de fato e acima de tudo, como um símbolo dos indispensáveis propósitos de alegria e solidariedade que devem nortear a nossa vida.

Fabular é preciso, mas há beleza real no entorno das nossas fantasias. E, se viver é mesmo melhor do que sonhar, como diz o poeta, saibamos enxergá-la por aí.

Desejo aos leitores do Jornal das Lajes um Natal de paz.

Coragem extrema

22 de Novembro de 2023, por Regina Coelho 0

Guerras são cenários tão devastadores para os soldados, os que estão na linha de frente, quanto para os civis, as vítimas em potencial expostas forçadamente a toda forma de violência. Para os jornalistas presentes no local dos conflitos a situação é de medo, o que é compreensível. E de enfrentamento também.

No passado, entre os profissionais brasileiros que foram à luta, fazendo seu trabalho em circunstâncias de grave excepcionalidade, José Hamílton Ribeiro (1935) e Joel Silveira (1918-2007) são nomes de referência. Zé Hamílton, que mora hoje numa fazenda em Uberaba, perdeu a perna esquerda na explosão de uma mina terrestre quando fazia a cobertura da Guerra do Vietnã (1968) para a revista Realidade (1966-1976). Silveira, aos 26 anos, como enviado especial pelos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, cobriu a Segunda Guerra Mundial junto à F.E.B. (Força Expedicionária Brasileira) na Itália.

Hoje, mesmo quando se acompanha o noticiário sobre os confrontos armados pelo mundo praticamente em tempo real, não é possível calcular o grau de perigo a que estão expostos, no epicentro dos acontecimentos, os responsáveis pela produção das matérias que chegam até nós. Mas eles estão lá numa força-tarefa de profissionais que se arriscam no cumprimento do ofício,

A guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas deu visibilidade popular à jornalista Paola De Orte, correspondente brasileira no Oriente Médio do Grupo Globo. Já trabalhando sozinha para a Globo News e o jornal O Globo, a partir de Tel Aviv (capital israelense), com os ataques terroristas de 7 de outubro último e seus desdobramentos, Paola, jovem rosto novo da TV aberta global, alcança agora grande projeção pela competência e coragem no exercício de suas funções.

Outro profissional que vem se destacando há um bom tempo, especificamente em trabalhos envolvendo guerras, é Gabriel Chaim. Fotógrafo e cinegrafista independente, o paraense Chaim é especializado em registrar áreas de conflito. Faz trabalhos frequentes para a CNN, Spiegel TV (alemã) e Globo e já recebeu prêmios internacionais importantes, além de indicação ao Emmy. Numa entrevista à rede de notícias americana CNN, referindo-se à cobertura que fez das lutas no país do ditador sírio Bashar Al-Assad, disse achar importante que as pessoas conheçam a história da Síria: “Eu não desejo que ninguém veja o que eu vi, mas, por outro lado, as pessoas devem parar de pensar em si mesmas e de olhar a vida apenas através de sua própria experiência. O mundo não é tão bonito quanto queremos acreditar”. Para quem esteve ainda na Ucrânia e chegou antes do avanço dos militares russos sobre o território ucraniano, seu trabalho é uma missão, um significado importante que quis dar à própria vida.

Mais do que destacar a observância do dever profissional dos que se posicionam no front, consequentemente agindo em condições totalmente adversas e considerando aqui a atuação corajosa dos repórteres, é preciso destacar sobretudo a observância do dever humanitário dos que se posicionam em outras zonas conflituosas e/ou atingidas por tragédias naturais e agindo nas mesmas condições, considerando aqui e agora o grande contingente dos voluntários. É inevitável dizer que as causas que abraçam são absolutamente necessárias. Assim entendem eles e por isso podem ser capazes de ir aonde qualquer forma de ajuda é essencial.

Milton Steinman é alguém com esse perfil. Cirurgião-geral no paulistano Hospital Israelita Albert Einstein, o brasileiro é especialista no atendimento a vítimas de situações extremas. Steinman viajou para o Haiti em 2010 após o terremoto que destruiu o país. Na Ucrânia em guerra, passou quinze dias numa cidadezinha onde foi montado um hospital de companha. Entre atendimento e treinamento de outros médicos, ele, por várias vezes ao dia, e os demais desceram aos bunkers (abrigos subterrâneos) por causa dos riscos. “Ser médico de desastres é um chamado”, assim define Miltona motivação para propósito tão desafiador.

Para ele e outros tantos, o que fazem é de valer a pena o risco que correm nesses campos de batalha.