Entrelinhas

Racismo no futebol e os reflexos da omissão de autoridades na Itália

17 de Marco de 2020, por Samira Silva 0

Estádio de futebol é lugar de comemoração e de diversão. Um lugar onde se busca diversidade e união, em que muitos vão para se esquecer dos problemas e da luta diária, dispostos a acompanhar o clube amado e torcer por ele. Um momento de alegria para uns e de trabalho para outros, incluindo os próprios jogadores dentro de campo. O futebol possui a virtude de unir culturas e povos, sem distinção de raça ou origem.

O esporte é universal, mas não é bem assim que vem acontecendo dentro do mundo da bola. Infelizmente, os episódios de discriminação racial estão ficando cada vez mais frequentes nas partidas de futebol no âmbito nacional e internacional.

Dentre vários casos de discriminação dentro das quatro linhas, eu queria falar especificamente do caso do Balotelli e o preconceito na Itália. Recentemente, o que se observa é que esse país europeu vem normalizando esse ato criminoso de maneira revoltante.

A primeira medida para resolver um problema é saber que ele existe. E quando o assunto é racismo, o futebol italiano está fazendo exatamente o oposto. Diretores, jogadores, treinadores e torcedores estão frente a casos sérios de preconceitos e tentam normalizar um comportamento que já deveria ter sido erradicado na sociedade.

No dia 3 de novembro de 2019, durante uma partida entre Verona e Brescia, válida pelo Campeonato Italiano, aconteceu mais um caso de racismo no futebol. Como descrito acima, o alvo da vez foi o jogador do Brescia, Mario Balotelli, que recebeu gritos preconceituosos da torcida adversária, causando revolta no jogador, que tentou deixar o campo. Todavia, o que merece destaque nesse momento é o quanto esses atos saem impunes.

O time que representa a torcida responsável pelos gestos preconceituosos contra Balotelli fez uma publicação na qual seu presidente diz poder “confirmar” que nada aconteceu e afirmou que seus torcedores são “irônicos e não racistas”, ressaltando que, quando ocorre algum episódio de racismo, sempre há generalização, uma vez que são apenas dois ou três que fazem isso e não todos. Entretanto, os vídeos deixam bem claro que não são “dois ou três” que xingam o jogador do time rival.

Houve também a vez quando o Milan foi a campo e venceu o Hellas Verona e diversas testemunhas, bem como jornais do país, relataram vaias e sons de macaco por parte da torcida do Verona toda vez que Kessié, volante negro do Milan, tocava na bola. Caso parecido ao que aconteceu, por exemplo, com Lukaku e Moise Kean.

Infelizmente, atos como esses são muito frequentes na Itália e sempre passam sem punição alguma, fazendo com que muitos torcedores deem continuidade a essa infame prática e persistam no pensamento antigo e ridículo de inferioridade pela questão de raça, diminuindo cada vez mais a beleza do esporte e fazendo com que muitos sofram constrangimentos e preconceitos que não deveriam acontecer NUNCA. É algo que precisa mudar imediatamente.

O racismo que se expressa nos estádios não acaba quando se sai deles. A naturalidade com que as opiniões racistas são manifestadas no ambiente esportivo só expressa a realidade preconceituosa da sociedade.

Do céu ao inferno

19 de Fevereiro de 2020, por Samira Silva 0

Cruzeiro e Flamengo são exemplos de clubes em realidades totalmente diferentes dentro do esporte. O que esperar nesta temporada de um time vencedor do Campeonato Brasileiro e da Libertadores e de outro com dívidas milionárias e recém-rebaixado? O time rubro-negro não vencia o Brasileirão desde 2009 e não conquistava a América desde 1981. O título de expressão mais recente na sala de troféus da Gávea era o da Copa do Brasil de 2013, conquistado com muita raça sobre o Athletico Paranaense de Paulo Baier. Após seis anos de jejum, já estava na hora de voltar ao triunfo. Mesmo com bastante dinheiro, planejamento e qualidade no elenco, a equipe continuou batendo na trave nas temporadas posteriores. O clube precisava de um mentor que fizesse a junção de todos esses fatores para voltar a levantar alguma taça.

A chegada de Jorge Jesus fez com que isso mudasse e a equipe, que já contava com jogadores consagrados, se desenvolveu e alcançou um outro patamar no futebol brasileiro. Jorge é conhecido por um esquema de jogo moderno e ousado, com muita posse de bola e pressão no adversário, mesmo quando não a tem. Um técnico estrangeiro fez com que o time apresentasse um futebol que não era visto nos campos brasileiros havia muito tempo. Era um futebol vistoso, em que todas as partidas davam gosto de assistir. Era uma equipe que sabia trabalhar a bola, tinha muita troca de passes e jogadas ensaiadas que quase sempre chegavam ao fundo da rede. O Flamengo realmente praticava futebol, não era um time que jogava recuado, mas sim uma equipe que ia pra cima mesmo quando a partida já estava decidida a seu favor. Demorou mais do que gostariam, mas os títulos vieram e nem o flamenguista mais otimista imaginaria que o seu time conquistaria dois títulos importantíssimos em apenas um fim de semana.

 Ao contrário do Flamengo, a equipe mineira conquistou bastantes títulos recentes, sendo eles o Brasileirão de 2013 e o de 2014, bem como as Copas do Brasil de 2017 e de 2018. Quatro títulos em 7 anos, uma média espetacular. Contudo, nada disso impediu o fiasco da temporada 2019, que resultou na queda inédita para a série B.

No início do ano passado, o Cruzeiro era um dos times mais citados para levar a maioria dos títulos devido ao elenco que tinha e ao retrospecto vitorioso dos anos anteriores. O futebol, entretanto, não é uma ciência exata e nada do que foi especulado aconteceu. A equipe até começou bem a temporada com o título do Campeonato Mineiro e com uma boa campanha na fase de grupos da Copa Libertadores, mas não conseguiu manter o momento. As polêmicas nos bastidores vinham em maior número que os gols e as vitórias em campo, o que afetou muito o clima de trabalho na Toca da Raposa. Como se não bastasse, o time estava sendo investigado pela Polícia Civil devido a transações irregulares e uso de empresas de fachada para encobrir crimes cometidos dentro do clube.

Depois da pausa para a Copa América, os times retornaram e o Cruzeiro já havia começado a desandar: foi eliminado da Copa do Brasil e da Libertadores. No Brasileirão, nunca saiu da segunda parte da tabela e lutou contra o rebaixamento até a última rodada do campeonato. O clube celeste foi finalmente rebaixado depois de perder em casa para o Palmeiras, com o placar de 0x2. Essa também foi a partida em que aconteceram cenas lamentáveis devido à revolta da torcida após a queda do time.

Podemos ver dois extremos analisando a temporada de 2019 de Flamengo e Cruzeiro. Enquanto o primeiro viveu uma de suas melhores fases desde os tempos de Zico, o outro tenta sobreviver frente a um tremendo pesadelo, passando por algo que jamais imaginaríamos para um dos gigantes do futebol brasileiro. Entretanto, ainda há algo que os une: em ambos os casos, a organização extracampo foi a peça-chave que ditou os rumos de glória ou de derrota. Em uma realidade em que o futebol se mostra cada vez mais como um negócio, a responsabilidade financeira dos clubes é quase tão importante quanto o peso da camisa e a paixão da torcida para escrever novas páginas em suas histórias.