Coleções incorporam arte e técnicas de séculos da azulejaria portuguesa

O azulejo existe há mais de 500 anos, sem interrupção, em Portugal


Cultura

José Venâncio de Resende0

Azulejos produzidos em Lisboa incorporam arte e técnicas centenárias (Fotos José Venâncio).

Coleções de azulejos que incorporam arte e técnicas de séculos podem ser encontradas na loja da “Fábrica de Loiça Viúva Lamego”, em Lisboa, Portugal. Fundada em 1849 por Antônio da Costa Lamego, a  fábrica - que inicialmente funcionava neste local - produzia artigos utilitários (talhas etc.) em barro vermelho e faiança (forma de cerâmica branca) e azulejos em barro branco. Com o crescente interesse pelo azulejo, nos anos 1930 a Viúva Lamego iniciou estreita colaboração entre seus pintores e artistas plásticos.

Assim, os mestres  da Viúva Lamego fabricam vasta gama de azulejos sempre em pintura manual como no passado, elaboram trabalhos especiais a partir de criações de autores e desenvolvem novos produtos que perpetuam a integração do azulejo na arquitetura. Em resumo, unem o fator artístico à vertente técnica, em evolução permanente.

Segundo Maria Eugênia Trindade, da Viúva Lamego, o resultado deste trabalho é a oferta de cinco coleções. A coleção do século XVII caracteriza-se por padrão repetitivo (mínimo de quatro azulejos) cujo desenho maior é a soma dos desenhos de cada peça. Além do azul em fundo branco, é utilizado também o manganês (sépia) e o amarelo, estes últimos da segunda metade do século.

Já na coleção do fim do século XVII predominam os azulejos de tapeçaria. Outra característica desta época, retratada na coleção, é a figura avulsa (bichos e flores) apresentada sempre na cor azul.

A coleção pombalina reflete a época posterior ao terremoto de 1755. Numa referência ao primeiro ministro do Reino, Marquês de Pombal, responsável pela recuperação de Lisboa, os azulejos destacam-se pela simplicidade, por questão de economia, em sintonia com muita criatividade. Cada peça em si forma um desenho completo e a cor predominante é o azul em fundo branco, acrescido de policromia. Atualmente, a coleção pombalina tem sido bastante procurada porque vários prédios da Baixa Lisboa estão sendo reformados. 

Ainda do século XVIII é a coleção da época de D. Maria (rainha consorte de Portugal durante o reinado de D. Luís I), que utiliza azulejos e paineis com padrões florais (ramagens, grinaldas etc.).

Por fim, a coleção de contemporâneos utiliza cópias de azulejos dos séculos anteriores e também de artistas mais recentes como Jorge Barradas. São azulejos que variam entre os mais elaborados (padrão) e as peças simples (“pintas”).

História. O azulejo existe há mais de 500 anos, sem interrupção, em Portugal onde ganhou uma dimensão artística para além do elemento decorativo. O Museu Nacional do Azulejo é estratégico, faz a diferença em relação ao resto do mundo, “porque o azulejo é uma arte identitária da cultura portuguesa”, resume Maria Antônia Pinto de Matos, diretora do museu.

É possível conhecer a história do azulejo, entre o final do século XVI até hoje, em dois percursos: o da azulejaria propriamente dita e o “conventual” (está instalado no antigo Convento da Madre de Deus, fundado  em 1509 pela rainha D. Leonor, mulher   do rei D. João II e irmã do rei D. Manuel I).

No início do século XVI, começou a difundir-se em Portugal o azulejo para decoração e revestimento de paredes, com “padronagens” nas técnicas hispano-mouriscas ou islâmicas (corda-seca e aresta). Os primeiros azulejos foram importados de Sevilha, por encomenda do rei D. Manuel, do duque de Bragança e do arcebispo de Coimbra, os dois primeiros para os seus palácios e o religioso, para o paço do bispo na Sé Velha. “A cultura islâmica é deste modo o primeiro grande referente do uso do azulejo em Portugal...”.

Em 1558, o duque de Bragança introduziu em Portugal o azulejo de Antuérpia, marcando assim a chegada do gosto maneirista ítalo-flamengo, concebido na nova técnica de faiança (que permitia alargar as possibilidades decorativas). O uso de técnicas hispano-mouriscas permaneceu, se bem que, ao longo do século, “os motivos islâmicos de laçarias e encadeados geométricos foram sendo substítuídos por motivos europeus, com elementos vegetais e animalistas de cariz gótico e renascentista”.

Mas os portugueses desenvolveram o gosto por grandes revestimentos cerâmicos, não se adequando ao tipo de produção (pequenos paineis e grande preciosismo técnico) do azulejo importado de Antuérpia. Tanto que, na segunda metade do século XVI, iniciaram a produção própria em Lisboa. “A exemplo da importação de Sevilha, também as primeiras encomendas saídas das olarias portuguesas foram efetuadas pela nobreza e pela igreja, com uma natural continuidade temática”.

O século XVII foi caracterizado pela padronagem (padrões que se repetem até o infinito). Por exemplo, o padrão 12 x 12 precisa de 144 azulejos para se formar um módulo. “Nesta época, os azulejos eram policromos, nas cores azul, verde e amarelo, mas também se produziram de pintura azul sobre fundo branco. A multiplicidade de soluções e propostas de azulejaria portuguesa de padrão no século XVII não tem paralelo noutras produções europeias.”

A Igreja foi a principal responsável por encomendas de azulejos de repetição (opção de grande eficácia para a decoração das paredes dos templos). Exemplos são os painéis com representação de santos, cenas religiosas e simbólicas (inspiradas em gravuras europeias).

Também começaram a produzir-se em Lisboa frontais de altar (aves e ramagens), inspirados em têxteis asiáticos (sentido simbólico associado à Ressurreição). Este foi um período de encontro de culturas, assinala Maria Matos. Os frontais de altar foram influenciados por motivos assimilados pelos portugueses, em contato com China e Goa (Índia). 

Link: íntegra da reportagem "Mais de 500 anos de azulejaria em Portugal" - http://www.jornaldaslajes.com.br/integra/mais-de-500-anos-de-azulejaria-em-portugal/1908/

 

 

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