É hora de se unir para combater a crise

O gerente do Banco do Brasil, Robert Santos, acredita no associativismo enquanto alternativa para empresários e produtores rurais valorizarem seus produtos e se fortalecerem diante da crise econômica


Entrevistas

Por André Eustáquio0

Robert Garcia dos Santos, gerente do Banco do Brasil em Resende Costa Foto André Eustáquio.

Quando e como a crise econômica começou a atingir o comércio de Resende Costa? O gerente do Banco do Brasil, Robert Garcia dos Santos, 35 anos, fala nesta entrevista sobre o impacto da crise no setor do artesanato, carro-chefe da economia do município, e também no que ele denomina “comércio formal”, isto é, supermercados, lojas e farmácias. Filho de pai mineiro e mãe maranhense, Robert nasceu em São Luís, no Maranhão, mas mudou-se ainda criança, com a família, para Minas Gerais. Formou-se em Administração de Empresas, com MBA em Finanças. Em 2000, Robert ingressou no Banco do Brasil, via concurso público. Casado há seis anos, divide residência entre Resende Costa e a comunidade de Castro, município de Entre Rios de Minas. Desde julho de 2012 é o gerente da agência do Banco do Brasil de Resende Costa.

 

Quando começou a se falar que havia uma crise econômica no Brasil, opiniões se dividiram entre aqueles que diziam tratar-se de um momento delicado e outros que afirmavam que não havia crise, era tudo fruto do pessimismo e do medo instalados. Para o senhor, quando a crise econômica de fato iniciou? Na verdade, a questão é muito política. Para mim, a crise começou em 2014. A gente está numa cidade pequena e eu passava em outras cidades do mesmo porte, no comércio, e sempre via o comércio meio parado. Senti o comércio um pouco frio. Então, eu vinha observando isso em 2014, principalmente na atividade comercial.

 

Então, não se tratou somente do pessimismo ou do medo das pessoas em investir... Não. Infelizmente tem essa questão do medo, sobretudo do pequeno aplicador, do pequeno investidor, do pequeno empresário. Esses têm medo. O grande já usa mais a esperteza. Ele acaba retendo o dinheiro, espera o momento de maior aflição e compra mais barato. Na verdade, o cara que tem mais recurso cresce ainda mais na crise. Ele espera o outro quebrar mais ainda, para comprar mais barato. Ele não tem pressa, espera o barco afundar mais um pouco.

 

Quem em Resende Costa sentiu primeiro os efeitos da crise? A meu ver, foi o setor do artesanato, por causa das vendas. Não tendo pessoas circulando, diminuem as vendas. Segundo, pelo fato de o artesanato ser uma atividade pouco formal na geração de renda e emprego aqui na cidade, uma vez que a maioria trabalha por produção, isto é, você entrega a matéria-prima, a pessoa produz e você paga. Depois, quem sentiu foi o comércio formal, o comércio de consumo, como: supermercados, farmácias, padarias, açougues etc. Esse comércio depende, aqui, das receitas vindas do artesanato.

 

Hoje se vê nos supermercados pessoas optando por comprar somente gêneros básicos, sinal de que o poder de compra vem caindo. Como isso afeta o comércio de forma geral? No início do ano passado, conversei com o pessoal dos supermercados daqui, com um de cada vez, uma conversa bem informal. Eu estava percebendo que o artesanato estava deixando de produzir e, por tabela, o dinheiro aqui na cidade ia diminuir, consequentemente iria afetá-los. Quem faz o fomento do crédito aqui na cidade são os comerciantes, porque eles financiam a compra de todo mundo. O cara vai lá, compra na notinha e paga com trinta ou sessenta dias. Fica difícil você negar. Você não vai negar a um cara que precisa comprar alimento porque ele está atrasado contigo. Numa cidade grande, você diz: ‘olha, se você não tem dinheiro, não compra’. Na cidade pequena, compra-se fiado sem maiores problemas. Aí eu falei pra eles: ‘A receita do município está diminuindo. Quem produzia para ganhar dois mil reais, está produzindo para ganhar mil. E isso vai acabar afetando vocês’.

 

Uma coisa que chama a atenção é que, apesar da crise, o movimento nos bares não diminuiu tanto. Mesmo o preço da cerveja tendo aumentado consideravelmente, as pessoas ainda estão frequentando os bares. A crise não atingiu esse setor? Graças a Deus, a crise não atinge todo mundo. Ainda bem, porque senão seria um deus nos acuda. O cara mais simples sofre primeiro, porque a receita dele é pequena, ou seja, ele não tem muito o que fazer com aquela receita. E nessas horas, aquele que tem um pouco mais de recurso consegue valorizar o dinheiro dele, ou seja, se tem um produto mais caro, ele acaba comprando o produto mais caro. Agora, a questão do lazer, e a cerveja é um lazer, tem muito disso. O cara vai para o bar, abre uma cerveja e fica, ou seja, ele alugou a mesa. O consumo mesmo é baixo. Mas o comerciante não gosta de falar isso, pois afeta a imagem do bar. É melhor as pessoas verem que o bar está cheio, mesmo o consumo sendo baixo.

 

O artesanato é realmente o carro-chefe da economia de Resende Costa? A agropecuária não representa muito na economia do município? A área rural deveria ser maior. A meu ver, é uma coisa até cômoda. O trabalhador que está na zona rural quase não vê o lucro do seu trabalho. Ele trabalha de domingo a domingo e não vê muitas vezes o ganho do seu trabalho, pois o que ele ganha, ele investe. É um processo contínuo. O produtor rural se mantém, mas, na prática, ele não sabe se está tendo lucro ou prejuízo. Ele pode até estar tendo lucro, mas tem que investir na propriedade. Então, ele sempre reinveste. E isso é de segunda a segunda e faz com que os mais jovens não queiram mais esse tipo de trabalho. Surge então o artesanato como um trabalho “mais fácil”. A pessoa trabalha em casa, protegida, não tem o sol a sol, pode fazer o tempo dela e vai apurar um ganho. Diferentemente da zona rural, ele não tem que reinvestir. Ele vê o dinheiro no bolso dele. O artesanato é, sim, o carro-chefe da economia da cidade, mas a zona rural não pode ser deixada. Mesmo com o trabalho excessivo, é uma atividade, para as cidades pequenas, que têm que ser a primeira.

 

Se o pequeno produtor não se organizar e investir na propriedade, corre o risco de ficar para trás... Nessa mesma conversa de trabalho excessivo na zona rural, falo que felizmente o produtor tem que investir na mecanização de sua propriedade, a fim de diminuir o trabalho braçal, que é cansativo. Essas melhorias, via maquinário e outras técnicas de produção, realmente vão dar esse gás para a atividade rural. Hoje o ganho é por produção. O produtor precisa ter uma produção maior, e para isso ele tem que mecanizar sua propriedade. Essa mecanização vai fazer, inclusive, com que o jovem permaneça na zona rural, pois ele vai perceber que o trabalho dele vai diminuir.

 

Qual o perfil do produtor rural de Resende Costa? Temos um produtor rural bem conservador. O governo oferece recursos subsidiados, mas, mesmo assim, o produtor não pega com medo de ficar devendo. Muitas vezes, ele prefere permanecer com a pequena produção a vir ao banco, pegar um crédito fácil para alimentar a sua produção, com receio de ficar devendo.

 

O senhor concorda que o associativismo é uma boa alternativa para o produtor rural? Se o associativismo tiver apoio, pois o povo fala do cooperativismo e do associativismo, mas poucos se engajam verdadeiramente nisso. Ele quer ter as benesses de vender com preço melhor, mas não quer ir a uma reunião. Já que somos uma cidade pequena, de pequenos produtores em sua maioria, o ideal mesmo é partir para o associativismo, a fim de agregar valor aos produtos.

 

“Sou fã do associativismo, mas, tem que efetivamente haver participação, divisão dos custos. Muitas vezes, dividir custos ninguém quer”

 

Percebe-se essa dificuldade também no ramo do artesanato. Sente-se falta, no meio empresarial da cidade, de uma associação forte. É, as pessoas se encaram como concorrentes e esquecem que, na verdade, se elas se juntarem irão apresentar o produto de Resende Costa para todo o Estado e o País. A concorrência tem que ser dentro da cidade, para fora do município tem que ser um grupo. Os empresários, principalmente do artesanato, precisam criar uma identidade do município. Sou fã do associativismo. Mas, tem que efetivamente haver participação, divisão dos custos, e, muitas vezes, dividir custos ninguém quer.

 

Como o comércio pode driblar esse momento de crise? Volta aquela ideia do associativismo. A solução é essa. A receita do município é praticamente duas: artesanato e atividade rural. O artesanato vem com uma renda líquida, ou seja, a maioria dos trabalhadores aqui da cidade vive dessa renda distribuída pelo comércio de artesanato. Já a atividade rural necessita de um incentivo maior, porque dela vem um volume de dinheiro bom. O ganho do produtor rural volta para o próprio município, ou seja, quando ele vende o que produz, ele volta à cidade para comprar o restante dos produtos de que necessita, voltando a produzir de novo. Assim, ele realimenta o comércio.

 

O município de Resende Costa está inserido num roteiro turístico privilegiado, incluindo São João del-Rei e Tiradentes. O senhor não acha que falta mais investimento no turismo, principalmente pelo poder público? Acredito primeiro no beneficiário direto, no empreendedor. Acredito que ele deve iniciar esse processo. Deixar que a iniciativa pública faça esse movimento, nem sempre ela vai querer fazer, por falta de recurso e entram também questões políticas. O empreendedor fazendo o trabalho de associativismo, aí sim, poderá levar as demandas ao poder público, que enxergará que não está defendendo um indivíduo, mas uma classe. Nós estamos inseridos num núcleo de cidades que possuem um fluxo de turistas constante, não é sazonal, é constante. Então é aproveitar esse fluxo e divulgar a cidade.

 

A crise econômica atingiu os bancos? Os bancos, por gestão profissional, criam outros meios de conseguir ganhos, mas que atingiu, atingiu. Antes da crise, os bancos tinham lucros entre 12 e 15 bilhões por ano e em 2015, mesmo com a crise, atingiram o patamar de 15 a 20 bilhões. Então você pergunta, que crise é essa que os bancos cresceram? Como eu disse, os bancos criam outros mecanismos. Eles, por exemplo, começaram a fazer contenção de gastos. Temos que economizar com energia elétrica, com o ar condicionado, os treinamentos diminuíram, as reuniões diminuíram a fim de economizar com deslocamento e hospedagem de funcionários em hotéis etc. A crise existe, a gente pode medi-la pelo volume, mas em termos de resultado os bancos criaram outros mecanismos para obtê-los.

 

Enquanto gerente de um grande banco, qual a orientação que o senhor dá àqueles que se desesperam quando recebem a fatura do cartão de crédito? Vou um pouco na contramão daqueles que têm medo do cartão de crédito. O cartão é um dos poucos produtos que os bancos oferecem que não têm custo para o cliente, e com facilidades enormes. O comércio, de maneira geral, se sujeitou ao cartão, ou seja, se você chega numa loja o cara te vende de cinco a dez vezes o produto sem juros no cartão. Você não tem custos para ter o cartão nas mãos e suas compras, muitas vezes, são parceladas sem juros. Então, quando eu falo que vou na contramão daqueles que têm medo do cartão, é porque para mim o cartão é um ótimo produto, desde que haja disciplina financeira. Não é porque eu tenho um cartão de 10 mil que vou gastar 5 mil, quando minha renda é só de 4 mil. Essa bola de neve no atraso do pagamento é que encarece, porque você tem uma taxa de juros que pode chegar de 10 a 15%, dependendo da bandeira emissora. Se você falar de 10 a 15 % ao mês é muito caro. A princípio, se vou fazer uma compra no cartão, tenho que saber se tenho receita.  

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