Antes de qualquer coisa e para que não fiquem especulando de onde eu tiro minhas conclusões sobre as coisas da vida e da existência, esclareço que jamais fui uma pessoa estudiosa de assunto nenhum. Jamais me dediquei a me aprofundar em assunto algum, não sou especialista em nada. Tudo que sei, se sei, é fruto de um empirismo só meu e das maquinações de minha mente. Portanto, nada do que disser deve ser tomado como verdadeiro ou imutável. E vamos em frente. (Porém, novamente, desculpem-me, as pessoas próximas a mim dizem que eu sou muito cordato, desde que concordem comigo e ... cest fini).
Natal tem um quê de céu e de inferno. O céu é a reunião de família, a comilança na ceia, os presentes. O inferno é ter de ir ao comércio. Ninguém merece caminhar numa rua comercial, num shopping em época de Natal, ninguém! Bendito sejam os que moram em Resende Costa! (Aqueles que se contentam com o que ela oferece, é óbvio, pois tem gente que vai pagar seus pecados por aí, seja na Tancredo Neves, seja no BH Shopping, seja na 25 de março.)
Comprar presentes é tarefa inglória e enfadonha para os homens. Conheço homens aos montes, daqueles que levam a mulher às compras com a maior boa vontade, desde que os deixem tomando um chopinho geladinho.
Mas tem horas que não há como escapar. Tem tarefas que são indelegáveis, ou melhor, e no mínimo, indelicado você passar para frente. Já que não gosto de ir às compras eu sozinho (para não ter de ficar ouvindo um vendedor insistente querendo me obrigar a comprar o que ele acha que eu devo comprar), chamei minha irmã para me ajudar na empreitada de comprar o presente do meu amigo oculto de Natal.
O presente já estava definido: uma bermuda. Entramos na primeira loja e não havia nenhuma que agradasse. Entramos na outra e não tinha o tamanho. Entramos na terceira e encontramos uma que até serviria, mas minha irmã decidiu que haveríamos de olhar em outras lojas. Então seguimos até a quarta loja. Na quarta loja não havia bermuda, mas ela se entusiasmou por uma sandália que bem que poderia ser um bom presente para o meu amigo oculto, que ela conhecia bem.
- É, disse ela, essa sandália está boa.
Eu já ia pedir à vendedora para embrulhar de presente quando minha irmã, do nada e sem qualquer explicação, disse à vendedora:
- Olha, por favor, reserva essa sandália que nós vamos dar mais uma andada e voltamos aqui.
Eu estranhei, mas vocês sabem que pinto que acompanha pata morre afogado. Então lá fui eu acompanhando a pata até a quinta loja. Foi nessa loja que minha irmã viu um tênis na vitrine e emendou:
- Esse tênis também é um bom presente, ele vai precisar para a viagem!
- Então vamos comprar esse tênis, disse eu.
- Não, vamos dar uma olhada mais na frente.
- Mas...
- Não, depois a gente volta se não achar outra coisa.
Outra coisa? Que coisa? Uma bermuda, uma sandália ou um tênis? Nessa hora eu comecei a me desesperar, digo, me afogar.
A sexta loja era de sapatos. A vitrine abarrotada de sandálias para todos os gostos. Ela selecionou umas quatro e pediu a vendedora para buscar. Examinou uma por uma esticando os braços e colocando as sandálias em suas mãos. Escolheu uma, finalmente.
- Essa eu acho bonita, o que você acha?
- É, é bonita sim.
- Põe no seu pé para eu ver.
Então eu descalcei meus sapatos e pus a sandália no pé. Ela me fez dar umas voltas pela loja enquanto ponderava e a vendedora esperava.
- Não, não ficou boa no pé!
Quando ela disse isso eu subi à tona para sorver um pouco de ar naquele mar de incertezas.
Então saímos mais uma vez à rua, sem o presente. Fomos a uma outra loja, mas nesta eu nem me lembro mais o que aconteceu, acho que é porque eu não conseguia enxergar debaixo da água em que eu me afogava. Então, antes que eu precisasse de um escafandro, decidi:
- Olha, Paulina, obrigado pela sua ajuda, mas eu já estou sabendo o que comprar e depois eu saio no comércio e compro.
Despedimo-nos ali, no meio da rua.
Sinceramente, mulher é um ser humano meio complicado. Tudo me leva a crer nisso. Sou eu que digo, mas a minha experiência e minhas maquinações concluem isso, como dois e dois são quatro.
Em tempo, antes que o comércio feche me deixem ir ali comprar o presente do meu amigo oculto, que hoje é o último dia. Ah..., bermuda, sandália ou tênis?
A compra de Natal
14 de Janeiro de 2010, por Rafael Chaves