A greve dos caminhoneiros e o grito perigoso dos radicais que desprezam a democracia


Editorial

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No final do mês de maio, a greve dos caminhoneiros, também chamada de Crise do Diesel, fez os brasileiros reféns. Faltaram combustíveis nos postos, alimentos básicos nas prateleiras dos supermercados, suprimentos nos hospitais, remédios nas farmácias. Muitas escolas e universidades tiveram que cancelar as aulas devido à falta de transporte e alimentos. Algumas prefeituras de grandes cidades decretaram ponto facultativo e serviços básicos, como coleta de lixo, foram afetados. O Brasil viu o caos e o agonizante governo do presidente Michel Temer foi obrigado a se curvar diante das exigências dos caminhoneiros.

As reivindicações dos caminhoneiros são legítimas e justas. A situação em que são obrigados a trabalhar tornara-se insustentável. Fretes baratos, óleo diesel caro, pedágios abusivos, estradas precárias e perigosas. Os caminhoneiros estão a todo momento vulneráveis a assaltos e sequestros; muitos, inclusive, transitam sob escolta armada.

De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT), 60% do transporte de cargas no Brasil concentra-se no rodoviário. Bastou, portanto, os caminhoneiros estacionarem seus caminhões nas margens das rodovias e cruzarem os braços para o governo se dar conta da precariedade em que se encontra a infraestrutura de transporte no país.

Apesar dos enormes transtornos gerados, a maioria dos brasileiros aprovou a greve dos caminhoneiros e concordou com a pauta de reivindicação da categoria. Segundo pesquisa do Datafolha, 87% dos brasileiros apoiaram a greve. No entanto, infelizmente surgiram, em meio aos grevistas, reivindicações que transcenderam a pauta e o limite da razoabilidade. Foram vistas nas manifestações faixas e pichações pedindo intervenção militar no Brasil.

Essa reivindicação absurda poderia ter sido ignorada se não fosse a considerável adesão de manifestantes radicais que se infiltraram no movimento dos caminhoneiros. Eles conseguiram atrair os holofotes da imprensa e a opinião de pessoas que desejam ressuscitar um fantasma que está adormecido desde 1985, quando o Brasil enfim conseguiu se livrar da ditadura militar.

É compreensível que, diante de um governo fraco e de crises em praticamente todos os segmentos da sociedade, os brasileiros percam as esperanças na classe política. Mas daí a pedir intervenção militar já é demais. Os que defendem esse absurdo deveriam ler os livros de história ou conversar com pessoas que sofreram torturas nos porões da ditadura, tiveram seus direitos políticos cerceados e cassados; deveriam conversar com professores que perderam suas cátedras nas universidades ou foram intimidados por espiões infiltrados nas salas de aula. Quem sabe assim se convençam de que, apesar das imperfeições, a democracia ainda é o melhor modelo de governo.

Teremos eleições em outubro deste ano. É momento oportuno para que todos os brasileiros – os que saíram nas ruas batendo panelas, os que vêm pedindo intervenção militar, ou aqueles que acompanham em suas casas, porém não menos indignados, a situação caótica rumo à qual o país caminha aceleradamente – cobrem dos candidatos propostas claras e factíveis para os problemas que assolam o Brasil.

 Não será pela força que conseguiremos colocar o Brasil nos trilhos. É através da democracia, da liberdade de opinar, de protestar e do direito que temos de escolher nossos governantes que construiremos um país verdadeiramente livre e democrático, onde haja igualdade e justiça social.

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