Air Resende, o incansável lutador pelas causas do cidadão


José Venâncio de Resende


Air Resende: preocupação nas áreas de saúde e de transporte.

Aos 76 anos de idade e 1,60 m de altura, Air de Souza Resende é um gigante na defesa dos interesses do cidadão. Incansável, visionário e corajoso, este homem de muitas lutas nem bem terminou uma e já entra em outra frente de batalha, principalmente no setor da saúde. Uma de suas mais recentes pelejas é contra o obscuro sistema de abates de gado no matadouro municipal de São João del-Rei.

Air nasceu 22 de setembro de 1941 na Fazenda Ponte Alta, em Coronel Xavier Chaves, cujo dono era Godofredo de Souza Oliveira irmão de sua avó. Filho de José de Souza Resende – o Zé do Jota – e de Maria da Conceição Resende, Air tem raízes em Resende Costa por parte de pai – seu avô João Batista de Resende, na Fazenda da Galga; sua avó Alzira Almira de Resende, na Fazenda da Taquara.

Air morou em Resende Costa, na Fazenda do Monjolo, quando criança, e na Fazenda do Pinhão, quando adolescente - em ambas, seu pai era arrendatário. “Depois, mudamos para Ritápolis, na fazenda de propriedade do meu avô materno, José Batista de Souza Santos, onde meu pai também foi arrendatário.”

Air chegou a São João del-Rei para morar na Colônia do Marçal, onde seu pai comprou um sítio no local onde é hoje a Vila Jardim Montese.

Em 1960, foi convocado para o serviço militar, vindo a servir no 11º RI de São João del-Rei, inclusive com curso de cabo em Juiz de Fora.

Em 1963, foi morar em São Paulo onde iniciou sua vida profissional no setor de pessoal da empresa Atma Paulista, que fabricava material plástico. Passou por vários empregos até que em 1968 voltou a São João del-Rei para trabalhar no escritório da Cooperativa Agropecuária Sanjoanense que mantinha uma usina de beneficiamento de leite.

Em 1970, resolveu voltar às origens ao alugar a Fazenda Ouro Fino, em Coronel Xavier Chaves. Mas, devido a dificuldades financeiras, entregou a fazenda e foi trabalhar no sítio do pai na Colônia do Marçal.

Ferrovia do Aço

Em 1975, com as obras de implantação da Ferrovia do Aço, Air empregou-se na empreiteira Veloso Camargo onde foi apontador, feitor de carga e descarga, encarregado de acampamento, auxiliar de almoxarifado e controlador de patrimônio. Só faltava ser comprador, atividade que veio a exercer, a partir de 1978, na ECISA, empresa que estava construindo um viaduto da Ferrovia do Aço, em Jaceaba. Com a paralisação das obras da ferrovia, Air foi transferido para as obras da ECISA na Açominas de Ouro Branco.

Com o fim das obras na Açominas, voltou a São João del-Rei em 1981, enquanto aguardava ser chamado para trabalho em outra obra. “Então fui ajudar o ex-deputado e ex-ministro Celso de Resende Passos e o ex-prefeito Milton de Resende Viegas a organizar o PMDB na região, inclusive em Resende Costa.”

Na África

No final de 1981, Milton Viegas recebeu um telefonema do Rio de Janeiro. Era um recado para Air comparecer ao escritório da ECISA. No Rio, recebeu uma proposta para trabalhar na construção de uma rodovia na Tanzânia, país da África Oriental.

Air teve de preparar os documentos às pressas para viajar. Assim, em 1.º de janeiro de 1982, embarcou para a Tanzânia para cumprir uma jornada de dois anos e três meses.

Um fato marcou o dia do embarque: Air conheceu o ex-jogador Zico que se encontrava no aeroporto. “Quem me levou ao aeroporto foram meus tios Lourenço, que era português, e Benedita, irmã da minha mãe. Eles foram vizinhos e amigos de Zico, que tinha pouco mais de 30 anos. Eles me apresentaram ao Zico que ia viajar para os Estados Unidos.”

A viagem de Air teve conecção na Suíça, com parada no Senegal para abastecimento. “Fiquei em Genebra quatro dias no inverno suíço (abaixo de zero), aguardando um engenheiro que vinha de Nova York, e cheguei em Dar es Salaam, antiga capital da Tanzânia, com um calor de 38 a 40 graus.”

Na Tanzânia, foi trabalhar como auxiliar no almoxarifado da ECISA, que continha cerca de 30 mil itens de material. A tarefa da empresa era construir a rodovia Morogoro a Dodoma (atual capital do país) de cerca de 262 km. “Foram mais de dois anos trabalhando de seis da manhã à meia noite. Depois de um ano, a cada seis meses, vinha ao Brasil de férias por15 dias.”

Produtor rural

Em julho de 1984, mais uma vez Air resolve voltar às origens, ao comprar uma parte da Fazenda do Riacho em Coronel Xavier Chaves. “Dei à propriedade o nome de Fazenda Bela Vista porque o local tinha uma vista muito bonita.” A fazenda fica na entrada da Trilha do Carteiro na Serra de São José, mais conhecida como Serra de Tiradentes.

Assim, Air virou fazendeiro, inicialmente tirando leite. “Depois, eu parti para a compra e recria de bezerros machos para abate. Recentemente, iniciei a exploração apícola.”

Com o falecimento da mãe, Air e o irmão fizeram um loteamento na Colônia onde é hoje o Jardim Montese I. “E na parte doada pelo meu pai, nós fizemos o loteamento de nome Jardim Montese II. O nome é uma homenagem à tomada de Montese, na Segunda Guerra Mundial, pelo antigo 11º RI.”

Saúde

Em 1986, Air filiou-se ao Partido Democrático Trabalhista (PDT), que abrigava um movimento de associações de moradores em São João Del-Rei. “Através desse movimento, me entrosei na área de associações de moradores. Esse movimento do partido apoiava o Conselho Municipal das Associações de Moradores de São João del-Rei (CAM DEL REI).”

Air, então, foi indicado pelo CAM DEL REI para fazer parte do Conselho Municipal de Saúde, “onde fui reeleito várias vezes”.

Em 1987, o CAM DEL REI foi substituído pelo Projeto Acontece, que apoiaria Air, em 2001, para a presidência do Conselho Municipal de Saúde, concorrendo com o próprio secretário de Saúde da época. “Nós entendíamos que era a sociedade civil que tinha de dirigir o Conselho, que era formado na maioria por representantes dos usuários ou sociedade civil (50%).” Os outros componentes eram trabalhadores da saúde (25%) e do governo/prestadores de serviços (25%).”

Nos dois anos de gestão de Air, o Conselho acompanhou a movimentação do Fundo Municipal de Saúde, bem como as atividades dos prestadores de serviços e da Secretaria Municipal de Saúde. “Nessa época, fizemos uma espécie de auditoria, através de visita a todas as unidades de saúde da rede municipal. Serviu para a gente conhecer o funcionamento do sistema.”

Um dos resultados da auditoria foi a constatação de que a prefeitura não tinha repassado os 15% da receita para o Fundo Municipal. Air, então, comunicou o fato ao prefeito, ao secretário de Saúde, ao presidente da Câmara Municipal, ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público. “O presidente do Tribunal de Contas me telefonou pessoalmente, dizendo que, a partir daquele momento, iria abrir espaço para que os conselhos municipais também pudessem manifestar-se junto àquele órgão.”

Em 2009, Air tornou-se membro do Conselho Municipal de Saúde, representando inicialmente a APADEC (Associação dos Parentes e Amigos dos Dependentes Químicos) e, depois, a ASAP (Associação dos Aposentados e Pensionistas). “Deixei o Conselho mas continuei acompanhando a situação da saúde em São João del-Rei.”

Associações

Ao mudar em 1993 para a Vila Nossa Senhora de Fátima, Air passou a fazer parte da associação de moradores daquele bairro, tendo inclusive assumido a presidência da entidade. “Também fiz parte da Associação dos Moradores do Grande Matosinhos, onde fui secretário e colaborador do jornal ´O Grande Matosinhos´ criado pelo então fundador da entidade José Cláudio Henriques.”

Em 2007, Air e mais 15 pessoas fundaram a Associação dos Movimentos Sociais, Moradores e Amigos de São João del-Rei (AMMAS DEL REI), inspirados na Associação de Moradores de Ribeirão Bonito, em São Paulo, que chegou a cassar um prefeito por corrupção.

“A primeira coisa que fizemos foi trazer a São João del-Rei uma representação da Ong IFC (Instituto de Fiscalização e Controle), com sede em Brasília, para nos dar orientação sobre o combate à corrupção.”

Outra ação de Air, patrocinada pela AMMAS DEL REI, foi a contestação judicial do Termo de Ajustamento de Compromisso (TAC), proposto pelo Ministério Público e assinado entre Prefeitura, Sindicato dos Médicos, Associação Médica e Conselho Municipal de Saúde, que reduziu a jornada de trabalho dos médicos de 6 horas para 2 horas. “Em seguida, surgiu uma lei municipal que reduzia o atendimento de 14 para 8 consultas por médico, com o argumento de melhor qualidade da consulta.”

Air quis saber que benefício a população teria com esta medida. “Quem levou vantagem foram os planos de saúde. O prejuízo para a população pode ter chegado a mais de 200 mil procedimentos por ano”. O processo tramita na Justiça há quase dez anos e atualmente encontra-se no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em 2013, um grupo de 20 pessoas ligadas à AMMAS DEL REI participou de um treinamento realizado pelo IFC, com o objetivo de habilitar estes cidadãos a acompanhar o funcionameno do sistema de saúde. Uma atividade prática do treinamento foi a realização de auditoria em sete unidades de saúde.

Segundo Air, foram levantadas, aproximadamente, 140 irregularidades de diferentes gravidades (das mais simples às mais complexas). “Entregamos o relatório ao Conselho Municipal de Saúde, ao prefeito e à secretária de Saúde, em evento na Câmara Municipal. Não aconteceu nada, continua tudo como dantes.”

A AMMAS DEL REI também patrocina outra luta de Air pela implantação em São João del-Rei do programa “Melhor em Casa”, do Ministério da Saúde. O programa leva o hospital para casa, substituindo a internação; ou seja, atende em casa pacientes em estado de imobilidade (com AVC, idosos, acidentados etc.), com uma equipe multidisciplinar (médico, enfermeiro, fisioterapeuta, psicólogo, fonoaudiólogo etc.). “Diante do descaso dos órgãos municipais, recorremos ao Ministério Público que, num primeiro instante, negou. Mas nós recorremos e está em vias de recursos.”

Microrregião

Em 2005/2006, Air fez parte da Comissão de Implantação do Plano Diretor da cidade, como representante das associações de moradores. Em 2006, foi eleito presidente do Conselho da Cidade, com mandato até 2012. “Foi quando tomei conhecimento da Emenda Constitucional número 65 (de 21/11/2004), que alterou os artigos 42 a 50 da Constituição do Estado de Minas Gerais.”

O novo artigo 42 passou a ter a seguinte redação: “O Estado poderá instituir, mediante lei complementar, região metropolitana, aglomeração urbana e microrregião constituídas por agrupamento de Municípios limítrofes, para integrar o planejamento, a organização e a execução de funções públicas de interesse comum”.

A partir daí, Air começou um intenso trabalho de divulgação dessa emenda, por meio da elaboração e distribuição de kit informativo. “Comecei um movimento pela instituição da microrregião de São João del-Rei, Tiradentes, Santa Cruz de Minas e outros municípios limítrofes, denominados “colar”. Entreguei kits à imprensa e a políticos, como prefeitos, vereadores, deputados e senador. A Assembleia Legislativa não só aceitou como até divulgou no jornal O Estado de Minas, com o título ´Quando as propostas vem das ruas´.”

Entre as medidas esperadas, está a aplicação de políticas públicas comuns, em áreas como transporte coletivo entre estas cidades e implantação de um hospital público regional. “A instituição da microrregião vai fortalecer São João del-Rei como polo regional, com a instalação de diversos órgãos públicos que estão sendo levados para Barbacena”, diz Air.

Esse trabalho continua a todo vapor, garante Air. “Enquanto eu for vivo, estarei lutando. Já tenho apoio de vereadores de municípios como São João del-Rei e Santa Cruz de Minas e de deputados. Também entreguei o kit à AMVER (Associação dos Municípios da Microrregião dos Campos das Vertentes), mas ainda não tenho resposta.”

Em 2013, Air entregou ao então prefeito Helvécio Reis uma moção da 4ª Conferência das Cidades de São João del-Rei, assinada por representantes de várias entidades. O documento solicitava ao prefeito que buscasse apoio dos prefeitos vizinhos para levar à Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia Legislativa a reivindicação pela criação da microrregião “que lhes facilitará integrar o planejamento, organização e execução de funções públicas de interesse comum conforme previsto no art. 49 da Constituição do Estado de Minas Gerais”.

A proposta também foi encaminhada ao governador Fernando Pimentel por ocasião do Fórum Regional das Vertentes, realizado em Barbacena. Segundo Air, até agora não houve resposta.

Matadouro

Em dezembro de 2016, Air vendeu oito bois para o açougueiro Pedro Paulo Carvalho. Parte dos animais foi encaminhada para abate no matadouro municipal e parte foi levada para o sítio do comprador. Em seguida, Air foi comunicado que dois animais foram condenados no matadouro como portadores de cisticercose, mas até hoje não recebeu a notificação formal.

Inconformado, Air encaminhou requerimento ao escritório local do IMA (Instituto Mineiro de Agropecuária), com base na Lei de Acesso à Informação, no qual solicitava informações sobre condenações no matadouro, o tipo de doença e o local de origem dos animais, por um período de cinco anos. “Como não obtive resposta, dirigi-me ao IMA estadual solicitando os mesmos dados estatísticos.”

A resposta foi burocrática, conta Air. “O IMA negou as informações, dizendo que demandariam muito trabalho, que não dispunha de sistema informatizado para consolidar os dados e que, portanto, não possuía esse levantamento específico.” Air acionou a controladoria geral do Estado e, posteriormente, a Comissão Mista de Recursos da Secretária de Governo. Sem sucesso.

Em São João del-Rei, Air procurou o secretário municipal de Agricultura, José Egídio de Carvalho, que marcou reunião com o IMA. “Nesta reunião, estavam presentes os veterinários do IMA e da Secretaria de Agricultura. Na oportunidade, entreguei uma carta endereçada ao José Egídio com as minhas reivindicações. Os veterinários garantiram que animais condenados não são destinados ao consumo e que o açougueiro é notificado formalmente. A única promessa deles foi conseguir uma cópia da notificação dos meus animais condenados. Mas eu sei de outros produtores que também tiveram prejuízos com animais condenados, e que não receberam notificação.”

O que está em jogo é evitar a ocorrência de doenças que trazem prejuízos aos produtores, considera Air. “Resta-me agora recorrer ao Ministério Público para obrigar o IMA a fazer o controle estatístico não apenas em São João del-Rei, mas de todos os matadouros fiscalizados no Estado; trocar a balança mecânica de pesar gado por uma digital e estudar a possibilidade de convênio de concessão entre a prefeitura sanjoanense e a associação que administra o matadouro.”

Air utilizou a sua demanda específica para pedir mais transparência num setor muito sensível, que o da alimentação humana. “O que eu estou querendo é sugerir duas coisas: campanhas de prevenção contra doenças (zoonoses) dos animais e elaboração de bancos de dados estatísticos sobre abates e doenças encontradas, com ampla divulgação e acesso público, em obediência ao artigo 37 da Constituição que se refere à transparência das repartições públicas.”

Hospitais

A mais recente ação de Air refere-se aos hospitais de São João del-Rei. “No dia 14 de fevereiro, encaminhei um ofício ao presidente do Conselho Municipal de Saúde, para que solicitasse ao Ministério da Saúde auditoria no Hospital de Nossa Senhora das Mercês e na Santa Casa da Misericórdia. Eu estou pedindo esclarecimentos sobre constantes ausências de vagas para internações de pacientes da UPA. Há suspeitas de que pacientes conseguem internações pelo SUS depois de pagamento de consultas médicas particulares e, assim, furam filas de exames e outros procedimentos. Outra preocupação é com as dificuldades financeiras do Hospital.”

No dia 21 de fevereiro, a plenária do Conselho de Saúde aprovou, por unanimidade, o pedido de Air, além de outra proposta semelhante.

Air é casado há mais de 30 anos com Maria Terezinha Camarano Resende, funcionária aposentada da Universidade Federal de São João del-Rei.

Além de produtor rural e ativista comunitário, desde 1972 Air é colaborador do jornal Tribuna Sanjoanense, com a coluna “Umas & Outras Francamente”.

 

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