Eterno Jota Resende, o Ratinho dos anos 80


Homenagem Especial

André Eustáquio0

fotoJosé Alair, o Jota Resende, em fotografia tirada durante o VII Rezsendão, em Resende Costa, no dia 30 de julho de 2005. Foto Geraldo Aires.

O último capítulo da vida de José Alair de Resende, o Jota Resende, ocorreu na fila de um confessionário da igreja Matriz de Nossa Senhora da Penha, no dia 21 de março, segunda-feira da Semana Santa de 2016. Alair esperava para ser ouvido em confissão, quando sofreu um infarto e faleceu subitamente aos 69 anos de idade, surpreendendo seus amigos e familiares. “A morte dele foi bem chocante para nós. Primeiro porque ele tinha uma vida muito tranquila e gostava de se alimentar bem. Ele participava de muitos cultos religiosos e naquele dia ele saiu normal, avisou a minha avó (Laurinda Mendonça Resende) que voltaria para assistir a novela Carrossel com ela”, contou sua sobrinha Laysa Resende.

Enquanto a orquestra Mater Dei se preparava para entoar o primeiro moteto de Passos e as irmandades começavam a organizar a procissão do Depósito de Nosso Senhor dos Passos, os comentários dentro da igreja matriz não eram outros, senão a morte súbita do Alair. Estavam todos assustados no interior da igreja. Religioso praticante, Alair era presença assídua nas celebrações das missas, como também nas procissões e solenidades da Paróquia de Nossa Senhora da Penha, especialmente na Semana Santa. A música executada durante as solenidades religiosas sempre o atraiu. Como coroamento de uma vida de fiel católico, sua última participação na igreja foi a busca pelo sacramento da confissão, preparando-se para a Páscoa.


Incansável defensor e divulgador da cultura de Resende Costa

Alair dedicou grande parte de sua vida à cultura de Resende Costa, especialmente à música, sua grande paixão. O Jornal das Lajes, que em abril último completou 13 anos de fundação, contou em seu início com o incansável trabalho do Jota Resende. Entusiasmado, desprendido e comprometido com a divulgação do jornal de sua cidade querida, Alair foi o responsável pela distribuição do JL em Resende Costa e São João del-Rei durante os três primeiros anos de existência do jornal.

Os primeiros anos do JL foram marcados pelo resgate da memória, fatos e personagens que marcaram a cultura de Resende Costa. Alair atuou com entusiasmo e muita dedicação neste período fértil do JL, que inclusive resultou na publicação em 2011 da coletânea “Um Olhar Sobre Resende Costa”, pela amiRCo/Coleção Lageana. A grande série sobre a Família Reszende – elaborada e desenvolvida por Jota Resende – foi destaque nesta fase do JL. “Ele defendia com entusiasmo os Resendes, tanto que reuniu em Resende Costa, no “Reszendão”, Resendes de diversos lugares do Brasil. Aquele encontro foi feito por ele”, lembra o amigo Tião Lima, apresentador do Programa “Bons Tempos”, na Rádio Inconfidentes FM.

Alair foi um dos maiores entusiastas dos encontros da família Resende e incansável divulgador de genealogias da família. Ele liderou, em 2005, a organização do “VII Rezsendão”, ocorrido em Resende Costa. Nos encontros dos quais participou, Jota Resende conheceu muita gente e ficou muito conhecido. Pessoas que passavam por Resende Costa frequentemente o procuravam para falar do assunto “Reszende”.

Sua admiração pelo JL contagiou e motivou o trabalho de toda a equipe, que no início encontrou inúmeros obstáculos a serem transpostos, a fim de que o jornal pudesse prosperar. Jota Resende, com entusiasmo e humor peculiares, escrevendo e nos ajudando a finalizar e distribuir o jornal aos leitores, foi sem dúvida alguma fator de muita motivação e exemplo para todos nós. Em seu clássico Chevette marrom, capítulos importantes da história do JL ganharam formas e alcançaram a história. “Ele tinha todos os exemplares do Jornal das Lajes”, informa Laysa Resende.

Jota Resende dedicou-se à cultura em suas amplas manifestações. Nos idos das décadas de 70 e 80, o Salão Paroquial, hoje CPP, e a rua Gonçalves Pinto, foram palco para os eternos shows de calouros, promovidos e dirigidos por ele. Tião Lima participou dos shows de calouros, integrando o grupo de jurados, composto por: Né do Chico Daniel e sua esposa Lurdes, Maria Aleluia, Geraldo Chaves, Maria da Penha Pinto, Maria Luiza Cesconi, Antônio Mariafra (de Lagoa Dourada), entre outros. “Era realmente um show de calouros, pois não tinha nenhum cantor profissional. O Jota Resende comandava o programa, tal como o apresentador Flávio Cavalcanti”, relata Tião Lima, que se lembra, saudosamente, de episódios marcantes protagonizados por Jota Resende durante as apresentações: “às vezes, os jurados elegiam um cantor, mas o Jota nem sempre seguia a decisão do juri. Ele não olhava muito a decisão do júri”.

Os clássicos programas do Chacrinha e do Flávio Cavalcanti eram o modelo seguido por Jota Resende para o seu show de calouros, assim como o figurino e estilos adotados pelos famosos apresentadores. Jota Resende não raro aparecia com a buzina do Chacrinha ou vestido como o jurado Pedro de Lara. “Certa vez, fomos convidados pelo Jota para participar de um show de calouros no Salão Paroquial. Só que estava acontecendo lá a Escolinha do Barulho, promovida pela Selma do Cici (Selma Andrade, filha do ex-prefeito Ocacyr Alves de Andrade, ambos já falecidos). A escolinha não terminava nunca e o Alair foi ficando furioso. Nós também ficamos aflitos, pois já era quase meia-noite e a escolinha não acabava. O Raimundo do Simão estava lá, vestido de Chacrinha, com a buzina pendurada no pescoço. Foi aí que chamamos o Alair e perguntamos a ele: ‘Alair, essa escolinha não vai acabar mais?’ Ele então subiu no palco, pegou a buzina do pescoço do Raimundo e buzinou forte no ouvido da Selma, cancelando a escolinha e fechando a cortina”, conta Tião Lima.

Admirador de vários estilos musicais e possuidor de grande coleção de fitas cassete e vinis, Jota era roqueiro por preferência. “Ele gostava mesmo era de rock, das bandas da década de 80, como: RPM, Barão Vermelho, Roupa Nova etc. E, claro, do Rei Roberto Carlos. Alair só se referia ao Roberto Carlos, sua grande admiração, chamando-o pelo apelido consagrado de “rei”, recorda-se Tião Lima.

A paixão incondicional pela música levou Alair a se dedicar à promoção de bandas amadoras em Resende Costa, na década de 80. Ele organizava os grupos e gerenciava as apresentações. Nos últimos anos, Jota Resende esteve sempre presente nas apresentações das bandas de Resende Costa, no Luau das Lajes, em shows nos bares da cidade e no Teatro Municipal. A música era a sua companheira de todo momento. Enquanto atuou como taxista, era comum vê-lo à noite, sentado no interior do Chevette estacionado no seu tradicional ponto na Avenida Prefeito Ocacyr Alves, ouvindo no toca fitas seus cantores e bandas preferidos: 14 Bis, Roberto Carlos, Roupa Nova, Beatles, entre outros tantos.

 

Saudade

Laysa Resende lembra-se de passagens marcantes da vida de Jota Resende e fala sobre o tio a quem tanto admirava: “Eu gostaria de dizer que ele era um exemplo de homem no quesito inteligência e sabedoria. Eu me lembro muito de vários fatos marcantes. Ele era uma pessoa com um coração muito bom. Ajudou muito meu pai na morte da minha mãe, Lucinete Araujo Resende. Ele foi a minha primeira inspiração para o estudo, eu sempre ganhava dele livros e dicionários. Ainda, ele pagou vários cursos de informática. Ele era um companheiro da minha avó, um ótimo filho. Ele tinha suas pequenas loucuras, como manias, devido à vida que não foi fácil durante a sua juventude. Eu sempre o olhei como um desperdício de homem, pois era muita inteligência pouca valorizada. Mas, ao mesmo tempo, eu percebia o quanto ele era feliz lendo aqueles inúmeros livros em diversas línguas. Ele fez uma pesquisa enorme sobre a nossa família Resende/Rezende, o que gerou três livros. E, por fim, o que eu mais aprendi com ele é que não precisa de um título de doutor para ser sábio e mostrar sua capacidade, porque a nossa vocação é algo que a gente pode exercer em qualquer lugar. Ele deixou muitas saudades”, conclui Laysa.

Alair foi um grande e inesquecível personagem da cultura de Resende Costa. Durante o velório de seu corpo, os inúmeros amigos se encontravam e, numa mistura estranha de tristeza, alegria e saudosismo, lembravam-se dele e de suas passagens engraçadas. O riso era inevitável, mesmo naquele momento de tristeza. Deixou-nos o eterno contador de casos, o entusiasmado e engraçado “Ratinho dos Anos 80” - apelido que ele próprio criou para si, em referência aos shows de calouros que apresentou na década de 80 em Resende Costa e ao famoso apresentador Ratinho, de quem era fã.

 

“O Alair foi uma pessoa muito importante e de muito valor para Resende Costa. Numa época em que a televisão aqui era muito ruim, ele conseguiu criar um show de calouros que levava muita gente para a rua e para o Salão Paroquial. Ele chegou, inclusive, a representar Resende Costa em festivais em Belo Horizonte, levando o show de calouros. Foi, sem dúvida nenhuma, um resende-costense apaixonado, que trouxe muita cultura para a nossa terra”, conclui Tião Lima.

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