Pai nosso, pão nosso


Editorial

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Desprendimento, sensibilidade, dedicação, doação, partilha e amor ao próximo: atitudes que caracterizam e norteiam a espiritualidade e a prática cristã. Numa sociedade que, cada vez mais, cultua o individualismo, o poder, a competição e a busca obstinada pelo dinheiro, as virtudes cristãs estão desaparecendo, sendo ignoradas ou tornando-se obsoletas. Mas Jesus pregou a esperança e a radicalidade em fazer o bem apesar das intempéries. As virtudes cristãs mencionadas estão presentes num trabalho que voluntários do projeto “Sopa Solidária Beija-Flor de Luz”, destaque desta edição do Jornal das Lajes, realizam em Resende Costa desde agosto de 2020.

O JL visitou, no último dia 3 de maio, uma segunda-feira, a casa-sede do projeto, na rua Pau Brasil, bairro Tijuco. O imóvel modesto cedido pela Prefeitura abriga um projeto monumental. O idealizador Guilherme Novais e sua esposa Ana realizam, há dez anos, o mesmo trabalho em Belo Horizonte, oferecendo sopa a moradores de rua. Conforme mostra a reportagem especial desta edição, o sonho do Guilherme contagiou Cláudia Magalhães e multiplicou-se para mais de 20 voluntários, entre cozinheiros e entregadores. Na segunda-feira, 3 de maio, aproximadamente 800 marmitex de sopa foram distribuídos em diversos lares de Resende Costa.

Além dos voluntários que doam tempo e trabalho, sempre às segundas-feiras, para o preparo e a entrega, em mãos, da sopa, o projeto já conta com a adesão de moradores e comerciantes da cidade que ofertam alimentos e outros objetos, como roupas e utensílios domésticos. “A gente vive totalmente de doação. Tudo que recebemos de doação a gente converte em doação”, diz Guilherme.

O projeto “Sopa Solidária Beija-Flor de Luz” nasceu da inspiração cristã. Trata-se daqueles lampejos de ideias para as quais dificilmente encontramos explicação essencialmente lógica. O que faz um grupo de pessoas voluntariamente deixar seus afazeres na tarde de segunda-feira, a fim de se dedicarem ao preparo de alimentos e distribuí-los a outras pessoas que, em sua maior parte, pouco têm para comer e alimentar seus filhos? Encontramos a resposta no espírito cristão de partilha e de amor ao próximo.

Os integrantes da “Sopa Solidária” dão exemplo de espiritualidade e ação cristã. Na oração do Pai Nosso, rezada pelos trabalhadores do projeto após o preparo da sopa, Jesus resumiu o que se deve pedir ao Pai, que já sabe do que necessitamos. O pão deve estar na mesa de todos, ser partilhado e tornar-se pão da vida. “Aqui nesta casa fraterna encontramos a simplicidade do bom cristão, a sabedoria daquele que sabe doar.  Doar o tempo, doar amor, servir sem esperar nada em troca. Servir pensando em servir mais.  Olhar a criança não como um enfeite. Olhar o jovem não como quem nada sabe do que representa a vida.  Olhar o velho não vendo nele apenas o restolho que deverá ser jogado fora, escrevendo em sua face a palavra ‘Fim’. O trabalho da sopa é a convivência direta com Jesus. É a caridade pura. Nele você consegue se colocar nas condições dos outros, consegue, por alguns minutos que sejam, sentir a pureza da vida. É a sensação de sermos muitos dentro de um”, resume Guilherme.

Em tempos de pandemia, o projeto “Sopa Solidária” ensina que devemos olhar além dos nossos horizontes para irmos ao encontro dos que sofrem, dos que perderam o sentido da vida e a força para alcançar a felicidade. O projeto nos mostra como é simples e prazeroso fazer o bem.

Na modesta casa da rua Pau Brasil, nº 526, onde um beija-flor construiu seu ninho simples de galhos secos e retorcidos, existe acolhida, alegria de viver e pão na mesa. Lá se constrói a esperança de que um dia as pessoas compreendam que habitamos a mesma casa-mãe e temos, todos, sem exceção, o direito ao mesmo pão. O projeto nos convida a sermos felizes na partilha do pão e na comunhão de vida.

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