Voltar a todos os posts

Jesus, o libertador

24 de Abril de 2024, por João Bosco Teixeira

Durante a Semana Santa, vi na TV uma entrevista sobre a Teologia da Libertação. Porque o tema me é muito caro, pus-me a apreciar a conversa. O entrevistado mostrava conhecimento da matéria. Os entrevistadores, entretanto, começaram a narrar fatos disparatados, quais padres a celebrar missa com variadas bebidas, a substituir o pão por carnes assadas e outras tolices. E atribuíam tais comportamentos à Teologia da Libertação. Não suportei e não suporto tal ilação.

Teologia da Libertação é assunto muito sério. E aqui não é o espaço oportuno para discorrer exaustivamente sobre a matéria. Quero apenas lembrar aos interessados alguns aspectos que demonstrem a tolice de algumas considerações feitas na entrevista.  

Antes de mais nada, se existe alguma teologia cujo objetivo não seja libertar os fiéis, com certeza não se trata de teologia cristã.

Em segundo lugar, a Teologia da Libertação se ocupa, notavelmente, com a figura de Jesus. Ora, o maior título bíblico de Jesus é aquele de libertador. Jesus esteve entre os humanos para libertá-los de tudo quanto os escravizava. E Ele não veio propor uma doutrina, mas uma prática restauradora da vida; prática libertadora da vida. Por isso é que Jesus não levava em consideração os méritos das pessoas, mas suas necessidades.

Não se pode negar que a teologia chamada de “Teologia da Libertação” traga, no seu bojo, novidade. Tanta novidade, quanta a novidade que Jesus mesmo o foi e é. O Deus de Jesus não é o Deus do Antigo Testamento. O Deus de Jesus é aquele que os Evangelhos nos fazem “experimentar”.

Se assim é, por que tanta divergência na avaliação dessa Teologia? É que as igrejas cristãs têm “marginalizado” o Evangelho. E ao marginalizá-lo, o colocam também à margem de nossas vidas e da sociedade.

“Para os homens da religião, o que vem em primeiro lugar é a observância da religião, enquanto que, para Jesus e o Evangelho, o que vem em primeiro lugar é a vida, dar a vida, remediar o sofrimento, curar a enfermidade”, segundo o teólogo espanhol Castillo. É pensamento que bate mal em muitos ouvidos cristãos.

Há mais. A Teologia da Liberdade leva o humano, radicalmente, em consideração, convencida de que não há manifestações divinas que não se expressem mediante a carne, pois é somente na humanidade que Deus se torna visível. E isso não é uma liberdade teológica, mas uma teologia libertária.  

A Teologia da Liberdade é condenada por tanta gente visto que ela, fundamentada nos Evangelhos, privilegia o olhar para os mais deserdados da sociedade. Não é que o Evangelho e Jesus condenem a riqueza e outras manifestações de privilégio; condenam, isso sim, a indiferença diante da pobreza, condenam as diferenças quando essas inferiorizam as pessoas. Para Jesus, a carência e a miséria nascem do egoísmo de todos os que retêm para si aquilo que, pelo contrário, é destinado a pertencer a todos. Tanta gente ainda hoje quer ver Jesus REI, soberano todo poderoso, ele que “nunca foi visto como representante da Lei, mas como profeta da compaixão de Deus”, no dizer de outro grande teólogo espanhol, Pagola. Jesus tinha plena consciência de que sua missão era a de comunicar e favorecer a vida.

Segundo a referida entrevista, a Teologia da Libertação, para muitos, virou saco de pancada, responsável pelo comportamento leviano e irresponsável de certas pessoas que cometem verdadeiras aberrações. Mas nessa ordem de raciocínio, iríamos nós também dizer que a teologia clássica foi quem deu sustentação aos numerosos erros da Igreja Católica: em primeiro lugar, a sua clericalização e hierarquização, a perseguição aos judeus, as guerras santas, a inquisição, a condenação de Jordano Bruno, Savonarola, Galileu, e de muitos teólogos católicos atuais.  

A Teologia da Libertação é tão fiel aos Evangelhos quanto estes são uma fiel apresentação do comportamento de Jesus, o Libertador.

Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário