As repercussões da vitória de Lula da Silva em Portugal


Política

José Venâncio de Resende0

É cada vez maior o número de eleitores brasileiros em Portugal (foto: Brasil de Fato).

Com uma diferença de pouco mais de dois milhões de votos (de um total de quase 124 milhões de eleitores), Lula da Silva foi eleito presidente do Brasil em segundo turno, numa campanha que chocou muitos portugueses pelo ódio, violência e linguajar utilizado. “A campanha foi tudo, menos o Brasil alegre e feliz que conhecemos, apesar das dificuldades”, reagiu o analista internacional Paulo Portas, da emissora TVI. “Uma das campanhas mais violentas e divisivas de que há memória, que expõe o abismo que separa a sociedade”, completou o jornal Público. 

Algumas peculiaridades foram destacadas pela imprensa, para além da margem mais apertada desde a redemocratização. “Nunca um ex-presidente havia conseguido voltar ao cargo, tal como nunca um chefe de Estado em funções tinha falhado a reeleição”, escreveu o correspondente do Público, João Ruela Ribeiro. Além disso, aos 77 anos, será o o mais velho a ocupar a presidência. Outro destaque é que o estado de Minas Gerais, “barômetro das eleições presidenciais”, foi o único fora das regiões Norte e Nordeste onde Lula da Silva foi o mais votado. 

Um país dividido e mais pobre, com dois meses de transição pela frente, um Congresso Nacional mais conservador a partir de janeiro e uma crise internacional grave por conta da guerra na Ucrânia. Este é o cenário que o novo presidente vai ter pela frente, segundo a cobertura das eleições brasileiras feita pela mídia portuguesa (TVs, jornais etc.) com ampla presença dos correspondentes, de enviados especiais e de analistas em estúdio. Interesse que está em linha com a crescente presença de imigrantes brasileiros no país nos últimos anos. 

Divulgado o resultado final, a imprensa destacou o apelo à união nacional no discurso de Lula da Silva, que prometeu “trabalhar para a pacificação”; o silêncio prolongado de Jair Bolsonaro, o que foge das circunstâncias normais (o presidente derrotado teria ligado para mim reconhecendo a derrota”); e as manifestações de governantes de outros países, como Portugal, Estados Unidos, França, União Europeia e Rússia. 

A ausência da guerra na Ucrânia dos debates e a prioridade em relação à América Latina e aos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) mostram a prioridade de Lula no cenário internacional. É bom lembrar que a União Europeia e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN ou NATO) apoiam a Ucrânia contra a invasão russa. Por outro lado, a retomada da política de controle do desmatamento e dos projetos de desenvolvimento sustentável na Amazônia soa como música aos ouvidos europeus.  

O pós-eleição levanta muitas questões, segundo o jornal Expresso. O que vai acontecer se Bolsonaro não reconhecer a derrota; qual será a influência do trumpismo no período de transição até a posse; como será a relação com o Centrão, um Congresso mais conservador e os governadores dos três mais importantes estados. Além disso, existem pendências sobre a mesa como o acordo entre União Europeia e Mercosul à espera de solução. Muita água ainda vai rolar debaixo da ponte, resume o jornal.  

“Trump dos trópicos”    
   
Bolsonaro consolida-se como o “Trump dos trópicos”, na expressão usada pelo jornal Diário de Notícias. A polarização que aconteceu nos Estados Unidos é a mesma que está a acontecer no Brasil, reconheceu a ex-diplomata e política Ana Gomes, comentarista da emissora SIC Notícias

O fantasma do trumpismo foi enfatizado por analistas, com a possibilidade de um terceiro turno nos dois meses que precedem à posse. E há o pressentimento de que a oposição ao futuro governo promete ser dura, embora seja reconhecida a experiência e a capacidade negocial de Lula da Silva. O também experiente presidente da Câmara dos Deputados e membro do Centrão, Arthur Lira, declarou que o resultado deve ser respeitado. “A vontade da maioria manifestada nas urnas jamais deverá ser contestada e seguiremos em frente na construção de um País soberano, justo e com menos desigualdades.”        

De qualquer forma, Lula da Silva vai encontrar um país bem diferente daquele que governou, segundo o Público. “Para além da profunda divisão social e de uma tensão que parece impossível de superar, o Brasil atravessa uma grave crise econômica e ambiental.” Além disso, “a derrota não fez esmorecer o bolsonarismo, que consolida um domínio territorial nos estados mais ricos e até conseguiu chegar ao poder em São Paulo. No Congresso, foram eleitos aliados importantes do Presidente ainda em funções que vão funcionar como porta-vozes privilegiados do bolsonarismo”.   

Por fim, um analista lembrou num dos programas de televisão no dia da eleição que, mais uma vez, o Brasil vai depender da economia internacional, especialmente do desempenho da China, que se encontra em crise, com níveis elevados de inflação e risco de recessão nos principais países. 

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