Complementação salarial de servidores municipais corre risco de ser extinta


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André Eustáquio/Emanuelle Ribeiro0

Administração municipal enfrenta problemas ligados aos benefícios dos servidores aposentados (Foto JL)

 

Administração municipal procura soluções para atender ao Ministério Público sem, no entanto, prejudicar os servidores aposentados

O fim de 2014 não foi tranquilo para os aposentados que recebem a chamada complementação salarial pela Prefeitura Municipal de Resende Costa. Isto porque o Ministério Público Estadual, através do promotor de Justiça em cooperação na Comarca de Resende Costa, Bruno Lucena Barbosa, recomendou ao Executivo Municipal que revogue o artigo 133 e parágrafos da Lei Municipal 2.092, de 30 de dezembro de 1993, que cria o Estatuto do Servidor Público do Município de Resende Costa, ou que se altere a redação da mesma, prevendo, a partir de então, a fonte de custeio para pagamento do benefício.

Atualmente, 74 servidores recebem aposentadoria pelo Tesouro Municipal, porém nem todos os beneficiários recebem a chamada complementação, uma vez que parte desses servidores aposentou-se antes da transferência do município para o regime geral de Previdência Social (INSS). Quem, portanto, aposentou antes, recebe integralmente suas aposentadorias e pensões pelo Tesouro Municipal.

A chamada complementação salarial trata-se de um benefício instituído pelo artigo 133 da Lei Municipal 2.092, de 30 de dezembro de 1993, que criou o Estatuto do Servidor Público do Município de Resende Costa. O artigo 133 prevê “que os proventos do servidor municipal aposentado serão permanentemente equiparados e igualados aos dos servidores em atividades, no cargo ou função correspondente, bem como os mesmos rendimentos serão revistos sempre que, por motivo de alteração do poder aquisitivo da moeda ou qualquer outro fator, se modificar a remuneração da atividade, revisão que observará as mesmas bases e os mesmos percentuais”.

O atual vereador e então prefeito municipal em 1993, ano em que a lei que criou o Estatuto do Servidor Público do Município de Resende Costa e prevê a complementação salarial foi sancionada, Luiz Antônio Pinto, diz que a complementação foi criada anteriormente e durante seu mandato foi mantida na reforma do estatuto: “É preciso corrigir a informação. A complementação foi criada em gestões anteriores, não sei precisar qual. Na reforma do estatuto em nossa época, ela somente foi mantida. Na ocasião, fizemos uma assembleia no antigo Teatro Municipal com a assessoria do doutor Ivan Barbosa e do doutor Paulo Pinto, em que, com a participação de quase todos os funcionários, foi decidido o regime estatutário com a manutenção da complementação. Tal se dava, inclusive, com a participação do Ipsemg, que posteriormente cessou este benefício, passando todos para o INSS”.

De acordo com o prefeito municipal Aurélio Suenes, a nomenclatura “complementação” surgiu após a filiação do município de Resende Costa, por obrigação legal, ao Regime Geral de Previdência Social (INSS). “A partir desta filiação, todo servidor público municipal, tendo por base a legislação do município, quando se aposenta pelo regime geral, tem o direito de ter a sua aposentadoria recebida do INSS complementada, como se estivesse em exercício. Por exemplo: um servidor público que em exercício recebe R$ 2.000,00 a título de remuneração e se aposenta com R$ 1.200,00 levando-se em consideração o fator previdenciário calculado pelo INSS, a Prefeitura de Resende Costa, de acordo com o Estatuto do Servidor Público Municipal, deve pagar o valor de R$ 800,00 a título de complementação”, explicou o prefeito.

O Estatuto do Servidor prevê ainda que toda vez que houver um reajuste salarial para os servidores municipais em exercício, este valor deve também ser equiparado aos servidores municipais aposentados, independentemente se houver reajustes por parte do INSS. “É por essas razões que se denominou complementação o benefício pago pelo Tesouro Municipal ao servidor aposentado, como se o mesmo estivesse em exercício. Os servidores podem somar os períodos de contribuição anteriores para se aposentarem como servidores municipais. Por exemplo: apesar de ter trabalhado por apenas dois anos no serviço público municipal, o servidor que cumprir todos os requisitos junto ao INSS pode se aposentar. Ele receberá integralmente como se estivesse em atividade”, informou o prefeito Aurélio.

O benefício é garantido também aos pensionistas da prefeitura, seguindo as mesmas determinações previstas no artigo 133 da lei 2.092.

 

 

Inconstitucionalidade

O Ministério Público recomendou que o artigo 133 da lei 2.092 fosse revogado, ou que lhe fosse conferida nova redação. Em sua análise do caso, o MP considerou o que diz a Constituição Federal em seu artigo 195, parágrafo 5º: “Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”. Portanto, é necessário, segundo a recomendação do MP, que a legislação municipal seja adequada à Constituição Federal.

O promotor da Comarca, Bruno Barbosa, recomenda ao prefeito municipal que encaminhe ao Legislativo um projeto de lei, de sua autoria, visando “à imediata revogação do artigo 133 e parágrafos da lei municipal 2.092, de 30/12/1993, por ofensas às disposições do artigo 195, do parágrafo 5º, da Constituição Federal de 1988, ou que seja alterada a sua redação, para previsão da respectiva fonte de custeio para pagamento dos benefícios sociais previstos na indigitada norma municipal”.

“Não foi previsto na legislação municipal qual seria a fonte de custeio que garantiria aos servidores municipais os pagamentos da chamada complementação que equipara os servidores aposentados aos servidores em atividade”, esclarece o prefeito Aurélio, que diz ainda: “Não gostaria de aqui dizer que é legal ou ilegal, uma vez que se trata de uma abordagem totalmente jurídica da questão. Destaco, porém, que a administração municipal está totalmente focada na questão, estudando profundamente o mérito jurídico da matéria em debate, procurando uma solução que possa atender não só ao Ministério Público, que deve efetivamente fiscalizar a legalidade das ações dos gestores municipais, bem como aos servidores que procuram por uma segurança jurídica definitiva para a questão”.

O vereador Luiz Pinto fala sobre a atual situação: “A Prefeitura não recebeu ordem para terminar nada. O promotor não entrou com ação de inconstitucionalidade para o artigo da lei. Apenas citou a Prefeitura para rever o artigo, indicando a fonte de custeio de tal benefício. Sugeriu o reestudo da questão. Não há nada transitado e julgado para a questão. Tanto que deu prazo ao Executivo para rever a questão. Isto é muito polêmico pelo país afora. Há diversas ações em tribunais estaduais e inclusive no STF. Para se ter uma ideia, o Tribunal de Contas de Minas Gerais nunca questionou tal complementação. E olha que o TCE é muito rigoroso com a fiscalização das prefeituras”.



Preocupações e buscas por uma solução

O primeiro contato entre o prefeito Aurélio Suenes e o promotor Bruno Barbosa aconteceu em novembro do ano passado. Foi neste período que o assunto se espalhou pela cidade deixando preocupados aqueles que recebem atualmente o benefício. “Em meados de novembro, eu e o então presidente da Câmara Municipal, José Gouvêa Filho (Zinho Gouvêa) fomos convocados pelo doutor Bruno, Promotor de Justiça em exercício na Comarca, para uma reunião na promotoria do Município. E no dia 5 de dezembro último recebemos a manifestação oficial de recomendação para a busca de uma solução legal para a questão”, informou Aurélio.

Quando o assunto ganhou as ruas, houve, inclusive, quem atribuísse ao prefeito uma suposta “denúncia” ao MP da inconstitucionalidade da lei 2.092. “Após vir à tona toda esta situação, tomamos conhecimento de que todos os gestores municipais, desde a instituição do benefício, tinham conhecimento de que tal vantagem poderia trazer prejuízos ao equilíbrio financeiro da Prefeitura Municipal, uma vez que a receita do município não suporta essa garantia, sem sofrer algum desequilíbrio. No que se refere a esses “boatos” tenho para mim, infelizmente, de que se trata de ações políticas partidárias as quais prefiro desconsiderar, uma vez que desde que assumimos a administração municipal estamos agindo na maior seriedade e compromisso com o bem dos servidores municipais e, principalmente, para garantir o equilíbrio financeiro da prefeitura e assim melhorar ainda mais a prestação de serviços para a população”, afirmou o prefeito Aurélio Suenes.

Após a notificação do MP, a administração municipal criou uma Comissão Especial de Estudos, formada por servidores de carreira do município e presidida pelo assessor jurídico do município, o advogado Geraldo Aires da Silva. A comissão, logo que foi criada, entrou em contato com a AMVER (Associação dos Municípios da Região do Campo das Vertentes), com o IBAM (Instituto Brasileiro de Administração Municipal) e filiou o Município à CNM (Confederação Nacional dos Municípios), para assessoria na análise deste caso. “Lembro, porém, que a referida comissão não tem autonomia para decidir a posição do Poder Executivo Municipal. Ela estuda apenas alternativas para uma solução da questão, que antes de qualquer ação serão levadas ao conhecimento de todos os servidores municipais ativos e inativos”, ressalta o prefeito municipal.

A preocupação maior dos servidores aposentados é com relação ao futuro. Ou seja, dependendo da conclusão do caso, o que vai acontecer com o benefício? Quem recebe a complementação deixará de recebê-la com a revogação da lei? A prefeitura terá condições de criar um fundo previdenciário? “Conforme destacamos na Câmara de Vereadores, estamos tratando a questão com muito compromisso e responsabilidade. Se houve a manifestação do Ministério Público temos que ter prudência e estudar a questão com a maior cautela possível. O compromisso que assumo não só com os aposentados, mas com todos os servidores públicos do município de Resende Costa, é que estamos tratando a questão com a responsabilidade e com a seriedade com as quais ela precisa ser tratada e que certamente iremos encontrar uma solução viável para as partes”, esclarece o prefeito Aurélio Suenes.

A manutenção do benefício é defendida pelo vereador Luiz Pinto: “Como vereador e funcionário concursado, defendo até o fim, com "unhas e dentes" tal complementação. Não é justo penalizar o funcionalismo com uma perda salarial que geraria, inclusive, transtornos no âmbito da economia da cidade, além do direito individual de cada um. Trata-se do chamado direito subjetivo. Você trabalha uma vida e na hora de usufruir da aposentadoria vê seu ganho reduzido. É inconcebível. Há que se estudar a questão, quem sabe criando o Instituto Municipal, no qual um fundo sustentaria tal complementação. O Executivo e a Câmara Municipal jamais deverão penalizar o funcionário. Estarei sempre do lado do trabalhador. Se o município tem receitas escassas, há que se buscar forma de aumentá-las. Caso contrário, corremos o risco de ninguém querer mais ser funcionário público”.

Resende Costa é o único município da região do Campo das Vertentes que possui o benefício da complementação previsto no Estatuto do Servidor Público. “Após a notificação do Ministério Público essa foi uma das primeiras ações que a administração municipal tomou: entramos em contato com os municípios da região do Campo das Vertentes e tomamos conhecimento de que só Resende Costa possui o benefício no Estatuto do Servidor Público”, conclui o prefeito.

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