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O carrinho de mão e o Brasil

18 de Maio de 2017, por Rafael Chaves

Há quarenta anos ou mais, quando minha primeira irmã fora se casar, minha mãe a chamou à cozinha:

- Minha filha, vem aprender a matar um frango!

- Que isso, mãe. Lá onde vou morar tem abatedouro de frango. A gente escolhe um e eles matam, limpam e entregam prontinho pra gente...

- Vem aprender a fazer massa de pastel, minha filha!

- Que isso, mãe. Lá onde vou morar tem uma casa de massas que vende a massa pronta...

- Filha, vem aprender a fazer sopa. Pensa quando você tiver um filho!

- Que isso, mãe. Lá onde vou morar eles vendem sopa pronta.

E assim minha irmã se esquivava de aprender prendas domésticas, seja por conveniência ou total falta de vocação.

Algum tempo depois de ela se casar, eu me lembro de, estando em sua casa, ir ao abatedouro comprar frango, à casa de massas comprar massa pronta, ao supermercado comprar sopinha Nestlé, coisas que eu entregava à secretária da minha irmã para que ela lhes desse destino culinário.

Das maravilhas do mundo de hoje, a latinha de cerveja, que abrimos com um clique, ou a tampinha de garrafa de long neck, que abrimos com uma simples torção, têm sido uma das invenções de maior utilidade para a humanidade, digo, para os que bebem. As comodidades só servem àqueles que as usam ou se beneficiam dela.

Todavia, em pleno século XXI, muita coisa ainda deixa a desejar. Toda vez que eu abro a tampinha do fio dental eu praguejo contra o infeliz que inventou o sistema. Sempre que eu puxo a ponta do fio dental o rolo todo salta para fora. Além disso, aquela pecinha metálica destinada a cortar o fio quase sempre se solta e se perde. Um transtorno!

Outra tragédia são aquelas folhas de alumínio que tampam embalagens de iogurte e outros produtos lácteos. Nunca acho a ponta pela qual devo começar a destacar a tampa. E ainda que eu a encontre, a folha nunca se desprende inteira, esfacelando-se.

E carrinho de mão, desses que usam em obras, construções. Eu não entendo porque a roda está numa extremidade e a empunhadura em outra. É uma comodidade pela metade, quando poderia ser por inteiro. Ou seja, o peso é dividido entre a roda, em uma ponta, e você, do outro lado. Aí eu me pergunto o porquê de não colocarem a roda no meio do carrinho, sustentando todo o peso da carga, de modo que o esforço fosse somente o de empurrar?

Aparentemente, hoje em dia nenhuma mãe chama suas filhas para aprenderem a cozinhar. Congelados, micro-ondas e restaurantes fazem a festa das mulheres. Mas eu, pai, desejo ensinar meu filho alguma coisa, que lhe seja útil. Foi então que tive a ideia de orientar meu filho:

- Filho, vem aprender como cortar o fio dental!

Tomei uma bisnaga de adesivo instantâneo super bonder e pinguei umas gotas na tampa e no dispositivo de metal:

- Tá vendo, filho, agora você não corre mais o risco de o rolo se soltar. Faça isso toda vez que comprar uma embalagem nova.

Algum tempo depois:

- Filho, vem cá que vou te ensinar a retirar a tampa do iogurte!

Localizei cuidadosa e pacientemente a ponta por onde puxar a tampa e consegui, pela primeira e única vez em minha vida, destacar toda a tampa do iogurte. Nunca mais me arrisquei a abrir um iogurte na frente dele.

O carrinho de mão e o Brasil ainda estou estudando um meio de como facilitar as coisas para ele, se é que tenham solução.

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