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Manoel Dias de Oliveira e sua música celebrados em concertos alusivos ao Bicentenário da Independência do Brasil (1822-2022)

21 de Setembro de 2022, por Edésio Lara

No final do último mês de agosto, foram realizados em Resende Costa, Tiradentes, Prados e São João del-Rei concertos destinados à celebração do Bicentenário da Independência do Brasil. Com verbas do governo federal e projeto encaminhado pelo Núcleo de Pesquisa Ciências da Performance do Curso de Música da Universidade de São Paulo (USP) – campus de Ribeirão Preto/SP –, instrumentistas e cantores apresentaram repertório variado de gêneros da música brasileira.

Quem assistiu aos espetáculos realizados em quatro igrejas das cidades citadas não apreciou somente repertório sacro; pôde ouvir também músicas populares, com destaque especial para dois lunduns, duas modinhas, três canções populares utilizadas por Heitor Villa-Lobos em obras corais de sua autoria, além de “Carinhoso”, de Pixinguinha, e um “Pensamento Sentimental”, obra composta em 1886 pelo Padre José Maria Xavier na cidade de Ouro Preto. Uma surpresa essa obra, visto que poucos sabem que o padre e compositor são-joanense é mais conhecido pela volumosa obra que nos deixou de música sacra, a qual estamos acostumados a apreciar durante cerimônias litúrgicas, especialmente na Semana Santa.

Além do repertório escolhido para o programa, o público presente recebeu do maestro Rubens Russomanno Ricciardi informações importantes sobre história da música brasileira, principalmente dos séculos XVIII e XIX. Além das modinhas pradenses, cujos autores ainda são desconhecidos, foram incluídos o Salve Regina e o Tercio, de José Joaquim Emerico Lobo de Mesquita (1746-1850), compositor natural da Vila do Príncipe, agora Serro/MG, além do Miserere, de Manoel Dias de Oliveira (1734/5-1813), este natural da vila de São José, atual cidade de Tiradentes. Essas três composições são muito apreciadas tanto no Brasil quanto no exterior. Em Resende Costa, o Miserere é peça fundamental para nós que a interpretamos ano após ano durante a Semana Santa. E seu compositor tem muito a ver conosco, com a nossa cidade.

Até 1911, todos sabemos disso, Resende Costa pertencia a Tiradentes. Até então, o Arraial da Lage mantinha relação estreita com a Vila de São José, recebia de sua sede sacerdotes para celebrações litúrgicas, certamente artistas para abrilhantar suas festas e militares. Em pleno século XVIII, por exemplo, aqui esteve o padre Toledo (Carlos Correia de Toledo e Melo), natural de Taubaté/SP, nascido em 1713 e com participação direta na Inconfidência Mineira. Fazendeiro, padre Toledo foi proprietário da casa – toda de pedra a vista – de número 12, localizada na Praça Cônego Cardoso, a poucos metros da Matriz de Nossa Senhora da Penha de França. Além dele, Manoel Dias de Oliveira, o organista, calígrafo e compositor, aqui prestou seus serviços como militar. Em 1771 foi promovido de alferes a Capitão da Ordenança de Pé dos Homens Pardos Libertos no Arraial da Lage, tendo permanecido com essa patente pelo resto de sua vida. Utilizou em suas composições textos em português do padre paulistano Ângelo de Siqueira (1708-1776), momento em que manteve contato com figuras de destaque da Conjuração Mineira, tais como: Padre Toledo, Alvarenga Peixoto e, certamente, os Resende Costa, pai e filho.  

Filho de um organista e uma escrava, Manoel Dias se destacou como artista, tendo sido bem remunerado pelas composições que lhe eram encomendadas, principalmente pela Irmandade do Santíssimo Sacramento. Teria ele composto uma das suas obras aqui no Arraial da Lage? Ainda não sabemos, mas é possível que alguns dos seus trabalhos artísticos tenham sido realizados aqui.

Durante os concertos promovidos para celebrar os duzentos anos da Independência do Brasil, tivemos o prazer de interpretar o seu Miserere na igreja de São João Evangelista, em Tiradentes, ao lado da tumba nº 2, diante do altar, onde o músico foi sepultado e estão seus restos mortais. Foi emocionante.

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