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A Fada

12 de Dezembro de 2018, por José Antônio

“Sete anos de pastor Jacó servia Labão...” E quem era o Labão? Pai de Raquel, uma bela serrana. Mas o Jacó servia patavina ao Labão. Ele estava de olho era na bonita Raquel. Como é que essa história termina? Vai lá na bíblia e lê. Tem também uma versão mais curta: a do Camões. Só quatorze linhas.

Comigo, a coisa não deu soneto nem sonata. O meu Labão era um funcionário do... bem, digamos... trabalhava fora de Resende Costa. Tinha um sítio nas cercanias da cidade. Rico, enorme sítio, imenso patrimônio, uma linda filha e um inusitado sonho:

– Quero passar num concurso público. Sempre a mesma história: a prova vence e eu nunca ganho.

Ah, sim. O homem era chegadinho num cacófato.

– Nem precisa assumir nada. Só quero passar. É necessidade da alma minha.

Amigos seus já tinham passado em concursos e ele era o único que não. Queria só sentir o gostinho. Tanto insistiu que aceitei dar umas aulas pra ele... mas, na verdade, não servia a ele e sim a ela, e a ela só por prêmio pretendia: sua linda filha, que, por sinal, já andava arrastando asa pro meu lado.

Toda quarta-feira eu ia ao sítio dar aula de gramática pro homem. A filha sempre me trazia um café, deixando seu braço roçar o meu ombro. Eu não reagia, claro. O pai jamais viu isso, pois aquilo era um objeto indireto alcançado por uma regência oblíqua sem complemento. Coisa raríssima.

Cobrava barato dele. E ele topou pagar:

– Topei dar vinte pratas!

Era finzinho dos anos oitenta. O Edílson Daher iria inaugurar um scotch bar em cima da padaria Sobrado, com Paulinho Pedra Azul e tudo. Porém, o Labão das Lajes me convidou para almoçar naquele fim de semana. Aceitei o convite e convidei a garota para o show.

Depois do almoço, o homem me contou a história dele.

– ... e aí, o sítio ficou pra mim. Eu fiquei como herdeiro. Eu havia dado o contra, mas acabei aceitando.

Parou de falar e olhou ao redor, como que procurando alguém. E gritou:

– Fada! Vem cá! Traz os cavalos!

Chegou a linda filha com dois cavalos arreados. Arrepiei, pois eu nunca tinha subido num cavalo. Nem de carrossel. O pai, num pulo só, já estava em cima do bicho. Tentei o imitar o giro do Labão e subi. De repente, a cabeça do cavalo sumiu.

– Você montou ao contrário. – disse o irmãozinho.

O cavalo já me olhava de lado, como que cismado. No que tentei descer, escorreguei e caí deslizando e agarrando as ancas do cavalo. O equino, desconfiado das minhas intenções, despachou um coice que raspou a minha orelha.

– Tenta de novo – era o irmãozinho outra vez. – Esse cavalo nunca foi montado e você também nunca montou. É bom que vocês dois aprendem juntos.

À noite, fui com a garota ao show do Paulinho Pedra Azul. A fada me beijava e flertava com outros. A fada abraçava outros e me flertava. Quer saber? Resolvi colocar uma pedra azul em cima do assunto. Fui embora sozinho, porém em paz.

De vez em quando, eu meu lembro de tudo isso. Será que o Labão conseguiu passar em algum concurso? E a garota? Linda! Essa fada...!

Comentários

  • Author

    Quero compartilhar no Facebook i texto do meu amigo José Antonio ,autor do texto.Obrigada.Maria da Glória Carvalho.


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