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Os “turcos” em Resende Costa – VII

11 de Outubro de 2010, por João Magalhães

O casal Nagib Miguel Roman e Emília Cezarina, com os filhos Miguel Alderico, Sebastião Nagib, José Nagib e Ana Teodora

A família Roman

Começo pelo agradecimento por todas as informações recebidas. Faço-o, encarecidamente, a Maria Lúcia Pinto Roman (Lucinha do Góes), nora de Sebastião Nagib Roman, filho de Nagib Miguel, fundador da família Roman, em Resende Costa.

Não se conseguiu saber o nome árabe de família de Nagib Miguel, pois seu sobrenome original foi trocado por “Romain”, quando de sua passagem pela França e por “Roman” ao aportar no Brasil. Por que trocou-se? A resposta até hoje não chegou. Talvez por ser ele de Fé católica romana?

Nagib Miguel vem para o Brasil com o irmão Jorge e um primo, Antônio. Como a imigração “turca” (O leitor já sabe que não são turcos e sim sírio-libaneses que foram apelidados de turcos por virem para cá, com documentação do império turco que dominava suas regiões, na época), em Resende Costa, acontece entre a 1ª e 2ª décadas do séc. XX, por Nagib ter nascido em 1869 e por ter casado, no Brasil, em 1903, a possibilidade maior é de ter desembarcado em nosso país nos inícios de 1900. Quem sabe, até um pouco antes. Vieram de Trípoli, Líbano, que na época pertencia à Síria, dominada por sua vez pelo Império Otomano (Turco). Razões da emigração? As mesmas dos demais: busca de melhores condições de sobrevivência, fuga da opressão turca, escape de recrutamento militar.

O primo Antônio foi morar em São Paulo. O irmão Jorge separou-se dos negócios com Nagib e foi para os Estados Unidos, não se apurou quando.

Da família de Nagib, sabe-se de seus pais: Miguel e Ana Fidélis; de seus irmãos, Jorge (que veio com ele para o Brasil) e Habib que morreu numa “guerra” no Líbano; de três irmãs: uma que ficou no Líbano, outra que foi para a França e uma terceira que emigrou para a África do sul.

Trajetória? Também a mesma. No caso de Nagib, mascateagem por sete Estados brasileiros, até optar por Minas gerais. Nestas andanças, conhece Emília Cesarina de Miranda, nascida no Curralinho, Resende Costa, mas residente em Congonhas do Campo. Aí se casam, em 1903, e vão morar em Juiz de Fora, onde nasce o primogênito Miguel Alderico Roman. Associa-se, então, ao estabelecimento comercial de Jorge, seu irmão e muda-se para o Rio de Janeiro, onde nasce José Nagib e Ana Teodora.

Escreve Lucinha: “Ao separar-se do irmão, Nagib reuniu todo o dinheiro que possuía e voltou ao Líbano para vender uma propriedade que recebera como herança. Investiu todo o dinheiro apurado em couro e retornou ao Brasil. Seu precioso carregamento de couro perdeu-se na viagem por causa de infiltração de água no porão do navio. Viu-se, então, com mulher e filhos, que na época já eram quatro, sem capital e sem parentes. Veio então para Resende Costa e começou a trabalhar no seu ofício de carpinteiro. Aforou um lote na rua Nova (Dr. Gervásio), construiu uma casa espaçosa, continuou criando sua família. Em Resende Costa, nasceram: Uriel, Bernadete, Nagibinho e Jorge. Nunca quis lhes ensinar o árabe e repetia sempre: “Sua pátria é o Brasil sua língua, o Português”.

 

Faço aqui uma breve digressão para anotar um documento que, penso, interessa à História de Resende costa. “Atheneu Rezendino. Curso primário e secundario. Internato e semi-internato para meninos e externato mixto. Director; Joaquim da Silva Mourão. Rezende Costa. Estado de minas. O Snr Nagib Miguel Romã deve, Rezende Costa 26 de Fbro de 1918, junho30, import despesas de 15,00. Um quadro de 10.000. Saldo a meu favor 5.000. Peço-vos dar a impor supra ao snr Francisco Marcos dos Reis. Cumprimento.JSMourão.”

 

A doença veio mais cedo do que se esperava; não obstante o amparo de seus patrícios aqui, como o do Miguel Salomão (“Miguel Turco”), a morte o buscou, em 1926, aos 57 anos

Novamente, Lucinha: “Dona Emília, apoiada pelos filhos mais velhos, tocou a vida com dificuldade. Não pode educar os filhos como desejou. Todos eles, como era comum na época, aprenderam um ofício, tornando-se assim alfaiates (Sebastião e Uriel), carpinteiros (José Nagib e Nagib Geraldo), sapateiro (Alderico). Este, mais tarde, tornou-se cambista de loteria. Jorge ganhou a vida como motorista, em São Paulo. As mulheres casaram-se e morreram relativamente cedo”.

Como vimos, aqui em Resende Costa, a família Roman influiu mais no campo das profissões importantes e indispensáveis, na época, mas aquele sangue comercial, tão característico dos libaneses, não secou nas veias Roman. José Nagib tornou-se comerciante como o pai, no bairro do Horto, em belo Horizonte, onde manteve fielmente por longos anos a “Miscelânea” do Nagib. Ricardo, bisneto do velho patriarca, está hoje à frente de um antigo e famoso restaurante de Belo horizonte: o “Maria das Tranças”.

A semente Roman reproduziu-se num leque amplo: advogado, engenheiro, médico, professor, psicólogo, comerciante... até piloto de aviação. “Nada mal, como diz Lucinha, para um imigrante que perdeu tudo nas idas e vindas pelo país e pelo mundo...”.

E dada a importância de sua atuação, este final vai para um neto do velho Nagib Miguel Roman e nas palavras de Lucinha: “No dia 8 de setembro próximo passado faleceu em Congonhas do Campo seu neto José Hélio de Miranda, político (eleito vereador por duas vezes) e radialista. Por 18 anos, manteve na Rádio Congonhas, seu programa “Participovo”, no qual, com recorde de audiência, dava voz ao povo em seus anseios e dificuldades. Seu velório mobilizou a cidade, mesmo em dia de jubileu e seu corpo, acompanhado por uma grande multidão, subiu a ladeira de acesso à igreja Matriz, onde talvez, seu avô, o imigrante Nagib, tenha subido carregando sua mala de mascate, buscando, ansioso, na saída de alguma missa, os olhos claros da moça Emília, com quem viria a se casar e passar seus dias de alegria e sofrimentos na nova Pátria. No carro de som e na voz do povo, as palavras da canção do Gonzaguinha, música de seu programa: ‘Viver e não ter vergonha de ser feliz, cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz...é a vida!É a vida! È a vida!’”.

Comentários

  • Author

    Parabéns Lucinha, pela forma poética que descreveu a imigração de Nagib Miguel Roman para o Brasil. Detalhes que eu desconhecia! Ótimo texto!


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