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O Real, o câmbio flutuante e o futuro

19 de Julho de 2019, por José Venâncio de Resende

Quem testemunhou o fracasso do Plano Cruzado (Governo José Sarney) teria sérias dúvidas em acreditar no sucesso do Plano Real (Governo Itamar/FHC). Afinal, o que inviabilizou o primeiro plano de estabilização econômico-financeira da Nova República, para além de sua novidade, foram medidas demagógicas como prolongamento do congelamento de preços e adoção de juros artificialmente negativos, visão protecionista da economia e, sobretudo, exploração eleitoral do Plano Cruzado por parte do antigo MDB. Dessa forma, não apenas não contribuiu para debelar a inflação herdada dos militares como também gerou a maior inflação (hiperinflação) da história do Brasil.

Parece que a lição foi aprendida, tanto que, recentemente, muito se falou e se escreveu sobre os 25 anos do Plano Real. O economista Gustavo Franco*, presidente do Banco Central à época, em artigo recente citou três lições proporcionadas pelo Real: introdução da URV para trabalhar com públicos “irritados tanto com a inflação quanto com o combate à inflação”; “tratar da infecção e não tanto dos sintomas” (diferença em relação aos “choques heterodoxos”); e “não ceder à complacência” (“levar o trabalho até o fim, pois não existe meia estabilização”).

É neste contexto que é oportuno citar o livro “O Colapso do Real em 1999 – Lições de uma crise cambial”, publicado, recentemente, pelo economista Aluizio Barros**, professor aposentado da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). Trata-se de narrativa inédita de uma viragem, corajosa e decisiva, na forma de gerir o Plano Real, como resume o próprio autor: “Vinte anos atrás o Brasil mudou o regime cambial, abandonando a paridade fixa do valor da moeda em relação ao dólar. A pilotagem desta transição – sempre traumática para qualquer país – teve um final feliz. O real foi salvo e o regime de câmbio flutuante assimilado pelos agentes econômicos.”

Embora publicado agora, o livro foi escrito em 1999, “quando não havia completado um ano do novo regime cambial e de suas repercussões na economia brasileira”, como destaca Aluizio Barros no Posfácio. Qual é a avaliação que se pode fazer dos acontecimentos da época vinte anos depois? O próprio autor responde: “Após muitos anos de inflação elevada e instabilidade monetária, que ocasionaram cinco trocas de moeda de 1986 a 1994, o Brasil vem tendo uma invejável estabilidade de preços (especialmente se comparado com a vizinha Argentina) há mais de duas décadas. O câmbio flexível foi incorporado ao arcabouço da política macroeconômica e não é rejeitado pelas eventuais autoridades do Banco Central ou da presidência da República.”

O professor enfatiza os benefícios da flutuação cambial brasileira de 1999, que “foi benigna, com custos sociais bastante reduzidos na comparação com outros países emergentes como México, Tailândia, Rússia e Argentina. A economia brasileira fechou o ano não com recessão, mas com crescimento de 0,47%, superior ao registrado em 1998 (0,34%). No ano seguinte (2000), o PIB exibiu crescimento robusto de 4,39%. A inflação foi controlada ao sair de 1,65% em 1998 para 8,9% em 1999, e 5,97% no seguinte. A taxa média mensal de desemprego aberto das seis áreas metropolitanas pesquisadas pelo IBGE registrou 7,6% em 1998, 7,5% em 1999 e 7,1% no ano 2000. Ou seja, a previsão de agravamento do desemprego devido à mudança do regime cambial não se concretizou.”

Entretanto, Aluizio Barros lamenta a “ longa e penosa batalha judicial” travada pelo economista Francisco Lopes e dois diretores do Banco Central, que felizmente foi vencida com a absolvição nos processos civis em 2018 pelo Tribunal Regional Federal de Brasília.

O futuro em suspense

Não fosse a instabilidade gerada por um sistema político caótico - de muitos partidos e pouca representatividade – a situação econômica do Brasil poderia ser bem melhor. De um lado, temos inflação sob controle, reservas cambiais elevadas e uma balança comercial favorável. De outro, a economia não cresce e o desemprego/subemprego/desalento atinge 25 milhões de pessoas.

Assim, em termos econômicos, o país vive numa encruzilhada entre dar o salto à frente ou se sucumbir às forças do atraso. Além das grandes reformas tão enfatizadas (da Previdência, Tributária, etc.) – que abririam espaço para investimentos em infraestrutura -, faltam medidas microeconômicas e legais (para baixar juros de mercado, diminuir custos e reduzir o cipoal burocrático das empresas, etc.) que facilitem e estimulem a produção e os negócios.

E oxalá o acordo entre União Europeia e Mercosul traga um arejamento para o ambiente nacional, em termos de aumentar a eficiência e a competitividade da nossa economia em benefício do consumidor final.

*25 anos do Real: três lições - https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,25-anos-do-real-tres-licoes,70002896174

**O Colapso do Real em 1999 - https://www.amazon.com/Colapso-Real-1999-cambial-Portuguese-ebook/dp/B07VBZ8HN7/ref=sr_1_1?keywords=aluizio%20barros&qid=1563487717&s=books&sr=1-1&fbclid=IwAR2mYHDDmZfs3hpV9Xpir6uLJc4KPqpbQgenYbdInHtxComl42lYeJn10iY

 

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