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A Nova República já era!

16 de Julho de 2017, por José Venâncio de Resende

Votação no plenário da Câmara dos Deputados.

A condenação em primeira instância do ex-presidente Lula pelo juiz Sérgio Moro - no processo do triplex do Guarujá envolvendo a empreiteira OAS - e a rejeição da denúncia do procurador Rodrigo Janot contra o presidente Michel Temer - a partir da delação do mega-açougueiro da JBS - pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados são dois lados da mesma moeda. Representam nua e cruamente o retrato da crise política vivida pela Nova República, também chamada por alguns analistas de “Terceira República”. Mais além: representam, pura e simplesmente, a falência da República presidencialista brasileira, de raiz autoritária.

Tudo indica que a Nova República caminha para o seu ocaso. Resta saber o que virá em seu lugar, resta saber o que será diferente em relação ao fim da República Velha e ao enterro da “segunda República”. Esperemos que não seja outro golpe militar, o que em geral resulta em ditaduras que impõem mudanças, a ferro e fogo, em geral eivadas de equívocos que deixam rastros ao longo do tempo.

O Brasil tem sido pródigo em golpes militares, a começar pelo marechal Deodoro da Fonseca que mesmo doente foi instado a montar um cavalo e proclamar a República presidencialista. Depois, veio o golpe político-militar que levou Getúlio Vargas ao poder e implantou a ditadura do Estado Novo. Finalmente, os tanques foram para a rua em 1964 e os resultados nós conhecemos muito bem, ainda que muitos não tenham aprendido a lição.

O fato é que, entre um golpe e outro, os governos civis tiveram de conviver com crises políticas da mesma natureza, embora mais impactantes nas últimas décadas pela rápida evolução das tecnologias informativas. Na Nova República, o repertório de crises parece não ter fim, e pode desembocar num caminho sem volta.

Em tempos recentes, o PT de Lula só não implantou a “ditadura”, na versão bolivariana da Venezuela, porque não conseguiu maioria no Congresso que avalizasse o “golpe”, embora tenha criado o tal “governo de coalização” para se manter no poder à base de muito “combustível” de mensalões e petrolões.

Em termos políticos, o país desandou de vez com a crise mais recente, mas os seus personagens se encontram em plena atividade, até por uma questão de sobrevivência. Com um agravante: lambuzados por somas monstruosas de dinheiro do petróleo e com a polícia e a justiça no seu encalço, tentam salvar a própria pele a qualquer custo.

No desespero, começam a encenar o dito popular de que “em casa onde não tem pão, todo mundo grita e ninguém tem razão”. À escassez de pão dos cofres públicos arrasados, junta-se o medo de ver o sol nascer quadrado. Quem tem foro privilegiado, luta com todas as armas de que dispõe, inclusive o surrado tráfico de influência na instância máxima do Judiciário, para se livrar de denúncias e condenações por corrupção. Aos que não tem ou perderam este privilégio, a luta é para não cair nas mãos de juízes como Sérgio Moro. E, se este for o destino, gastam-se milhões de reais com advogados na esperança de um resultado mais favorável.

O crescente acirramento de posições políticas, com a “fulanização” ou personalização nas disputas pelo poder, mantém um dos defeitos das fases anteriores da República brasileira.  Não se prioriza o debate de ideias e de um projeto de nação. Partidos são meros instrumentos de promoção e enriquecimento de pessoas e grupos. Prevalece a política de acusações pessoais e partidarizações inconsequentes, que acabam por incendiar o país, insuflar o divisionismo e empurrar a pátria para a beira do precipício, preparando assim o terreno para os ávidos de um novo golpe, seja de que natureza for.

Alguns dirão que esta é uma visão pessimista, até mesmo catastrófica. Os incrédulos são muitas vezes os mesmos que acreditam nas soluções fáceis – basta, por exemplo, convocar eleições diretas - mesmo que elas tenham como palco uma estrutura de representação política totalmente carcomida.

Os mais pragmáticos dirão que, na impossibilidade de fazer uma profunda reforma política, o melhor é fazer mudanças pontuais etc. etc. Infelizmente, tais mudanças pontuais são insuficientes, aquém das necessidades mínimas capazes de restabelecer a confiança do cidadão nos políticos, nos partidos, na democracia.

Qualquer que seja o desfecho do governo Temer, dificilmente teremos eleições diretas antes do calendário previsto para 2018. Se a maior parte da população se recusar a dar legitimidade ao eventual substituto de Temer por não confiar nele, as divisões na política brasileira tendem a se aprofundar como reflexo da própria divisão no país como um todo. Divisões estas que podem tornar-se perigosamente inflamantes.

O maior risco é surgir algum aventureiro, do tipo Collor de Melo no final do governo Sarney, sem maioria no Congresso, o que tornaria o país ingovernável. Uma alternativa não muito animadora seria a reedição do famigerado “governo de coalizão”, mantido a peso de ouro. Uma terceira possibilidade seria um candidato populista ganhar tudo, obter a maioria absoluta no Congresso Nacional, ficando com a faca e o queijo nas mãos para implanter uma ditadura disfarçada de democracia.

De qualquer forma, o provável é que a agonia da Nova República se estenda para além das próximas eleições. O Brasil fez a opção pela República presidencialista que não deu certo. Muito pelo contrário, é fonte permanente de políticos populistas e irresponsáveis ao tratar da coisa pública. Além disso, ao mesmo tempo em que é um sistema permanentemente gerador de crises políticas, não traz em seu seio um amortecedor de crises.

Assim, o desafio está em ingressar na quarta fase da República sem cair vítima de mais um golpe, seja ele militar, político-militar ou bolivariano (ainda que este último esteja em completo descrédito). Daí porque me alinho entre aqueles que defendem a convocação em caráter urgente de uma Assembleia Constituinte autônoma, formada por cidadãos qualificados e não-candidatos a qualquer cargo eletivo.

Uma Constituinte que possa formular uma proposta de reforma política que contemple a restauração da representação dos estados mais mais populosos (abolida pelo “Pacote de Abril” do governo do general Ernesto Geisel), a redução das representações estaduais para no máximo dois senadores, o fim dos horários partidários e eleitorais “gratuitos” e a implantação do parlamentarismo, com voto distrital, eleições de presidente e de primeiro-ministro, entre outras medidas que aproximem o eleito do seu eleitor.

Até porque, sem esta virada para a “quarta República”, a economia brasileira continuará com seu desempenho medíocre no longo prazo – o chamado “voo de galinha”, nem tão alto assim -, incapaz de gerar riqueza em volume necessário para criar novas oportunidades de trabalho e viabilizar a tão sonhada distribuição de renda. Neste caso, de pouco adianta o discurso de que a economia está descolada da política.

Alargar o comércio

Um vez mais, Brasil e seus aliados do Mercosul ficaram para trás quando se trata de assinar acordos internacionais bilaterais de livre comércio.

Em 5 de julho, Japão e União Europeia anunciaram o Acordo de Parceria Econômica (JEEPA, na sigla em inglês), que vinha sendo negociado desde 2013. O decisão é considerada importante pois ocorre no momento em que os Estados Unidos, por meio de seu presidente, Donald Trump, abdicam do papel de líder do comércio mundial e a Grã-Bretanha inicia as negociações para a saída da UE, enfraquecida pelos resultados das últimas eleições.

O acordo contempla redução de tarifas para produtos agrícolas e industriais (carnes, vinho, têxteis, roupas, sapatos, carros etc.). Mas ainda é um acordo ao velho estilo tanto que Japão e UE tem maior ambição. Querem avançar para além do corte de tarifas, buscando acordos em procedimentos para resolver disputas entre investidores e governos, bem como em proteção de dados.

Enquanto isso, o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia vai se arrastando por vários anos. Embora as negociações entre os dois blocos tenham sido retomadas este ano, ainda não se chegou a um entendimento sobre as prioridades da Europa (propriedade intelectual e livre acesso das suas empresas a licitações públicas) e as reivindicações de Brasil e aliados, principalmente em questões agrícolas.

Vejo-me perguntando com frequência se não seria melhor o Brasil caminhar sozinho em busca de um acordo comercial com a União Europeia. Estou convencido de que existem muitas complementaridades entre Brasil e Portugal que precisam ser exploradas  e um acordo bilateral com a UE facilitaria muito este processo.  

 

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