Resende Costa, conforme tantas outras cidades, possui grandes cruzeiros nas ruas das suas principais entradas. Chamamos de cruzeiro uma construção singela que abriga no seu interior uma grande cruz. A cruz, poderoso símbolo do Cristianismo, nós vamos encontrar, além das igrejas, em capelas, cemitérios, passinhos, nas portas de entrada e no interior de casas e edifícios. Vamos notá-la, também, estampada em livros, em muitos outros lugares, tais como à beira de estradas, indicando o lugar em que pessoas morreram acidentadas, por exemplo. Muitos vão carregá-la no peito ou em terços, senão, através do sinal da cruz feito antes e após orações e para benzer. Nas artes, principalmente no cinema, é o símbolo empregado para combater vampiros e afastar o demônio, o espírito mau. Tal como as cruzes que os católicos deixam afixadas nas portas de suas casas, muitas cidades têm construídos os cruzeiros nas suas principais entradas.
O cruzeiro acima está localizado naquela que já foi a principal entrada de Resende Costa. Todos os que chegam de São João del-Rei, pela estrada de terra, passando por Coronel Xavier Chaves, se deparam com ele. A grande cruz, erguida no ponto mais alto da rua está cercada por grossas paredes de pedras. Os outros cruzeiros estão no Tijuco, no Beira-muro e na Praça Cônego Cardoso, em frente a Matriz de Nossa Senhora da Penha de França. Esses são os principais e mais antigos. Um quinto cruzeiro foi erguido na saída para o povoado do Barracão, mas, deste, já não há mais vestígios.
Além de demarcar o lugar onde começava a cidade, de deixar clara a religiosidade do povo do lugar, os cruzeiros tinham a função de barrar a entrada de demônios. Assim, todos os cristãos se sentiam mais protegidos. O poder do grande símbolo da Igreja é o de blindar, dar segurança e tranquilidade aos que querem estar distantes do capeta. No seu entorno, os moradores têm por costume promover rezas, missas e festas em que não podem faltar a banda de música, o coral, o leilão de prendas e barraquinhas.
Manifestações de fé, como a que narro agora, dão o tom da importância dessas construções. Na primeira metade do século XX, década de 1940, Dona Bernadeta [pronuncia-se com ê], casada com o senhor Tomás, tinha por costume realizar rezas nos cruzeiros. Sempre que a cidade enfrentava dificuldades com a estiagem, lá ia esta senhora, com sua fé e preces, solicitar aos santos, a vinda da chuva. Moradora da Rua Dr. Gervásio, onde também residia minha tia Almira, ela reunia alguns meninos, todos de pés descalços, calção e dorso nu, para acompanhá-la aos três cruzeiros. Dona Bernadeta, usando um turbante branco e os meninos uma lata contendo água e flores que seguravam com a mão direita sobre o ombro esquerdo, conduzia a pequena procissão, entoando uma música lamentosa que era respondida pelos garotos. Segundo o relato que me chegou, o que cantava esta devota senhora negra, gorda e de vestidos longos e sobrepostos, ninguém entendia direito. Chegando ao cruzeiro, lá deixavam as flores ao pé da cruz com os pedidos para que a chuva não tardasse. Ao que parece, suas súplicas eram atendidas e este gesto de fé se repetia toda vez que a seca afligia e trazia desalento aos moradores do município.
Notamos que em Resende Costa, o cruzeiro do Pau de Canela e os outros dois construídos nos limites da cidade não foram bem cuidados nas últimas décadas. Tanto é que, mediante sua precariedade, o cruzeiro do Pau de Canela passa por reforma. A cruz estava podre e os paredões danificados, principalmente pelas grossas raízes de árvore que foi plantada ao seu lado. Diante da situação de abandono do mesmo, moradores e comerciantes próximos se reuniram e decidiram trabalhar pela sua recuperação. Madeira de lei para nova cruz e retirada do reboco para deixar à vista as enormes pedras utilizadas para a edificação dos paredões que circundam o cruzeiro estão entre as ações do grupo voluntário.
Mais do que isso, para além da recuperação, há o compromisso de dar ao espaço o cuidado e a manutenção permanentes. Esse grupo age bem e indica que não devemos esperar que a prefeitura municipal ou a paróquia se incumbam, sozinhos, desses serviços. Nossa esperança é a de que esta boa ação sirva de exemplo e sugestão para outras pessoas poderem, também, ajudar o município a manter limpo e conservado os demais cruzeiros que são patrimônio da nossa cidade.
Que possamos, com esses monumentos revitalizados, manter viva a tradição de muitas rezas, procissões, missas e festas de santos seguidas de leilões e barraquinhas nos cruzeiros de Resende Costa.