Colega de turma da dona Geralda, que abordei nessa coluna mês passado, foi o LUIZ DE REZENDE CHAVES, nascido em 21 de outubro de 1929, chamado por muitos de Luizinho, ou Luizinho Chaves. Filho de Alfredo Chaves de Mendonça (natural de Coronel Xavier Chaves) e Maria da Conceição Camargo (esta nascida em Resende Costa), ele está chegando aos 90 anos de idade.
Quando nos encontramos para conversar sobre sua infância, foi logo dizendo da sua família. Naquela época, década de 1930, as dificuldades enfrentadas pelos pais de Luizinho para criar a família numerosa não eram tão diferentes de outras. Os parcos recursos repercutiam nas maneiras, nos costumes impostos pelos chefes de família, impossibilitados que eram de oferecer aos filhos mais conforto e educação escolar adequada, por exemplo. Uma lembrança que ele tem dessa época de menino, ainda na escola, era a de ir a pé buscar leite na Fazenda do Pinhão, a 5 km do centro da cidade. O leite não era para ser bebido em casa, mas deixado na casa do dentista Zé Lara como forma de pagamento pelo tratamento dentário da sua irmã Zezé. “Eu fazia isso porque meu pai não tinha condições de pagar o tratamento dentário da minha irmã Zezé”, disse Luizinho. Essa era uma forma antiga de pagamento por todo tipo de serviço, visto que a circulação de dinheiro era limitada. Sem dinheiro, as pessoas faziam seus pagamentos com trocas de produtos ou mesmo com outros trabalhos.
Luizinho disse não saber como seus pais criaram a família, pois eram muito pobres. Um dos serviços que seu pai prestava na cidade era o de açougueiro. “A vaca que era morta no antigo matadouro, localizado na parte baixa do horto florestal, era desossada na dispensa da cozinha de nossa casa para ser distribuída na cidade”. Com o açougue que ele chamou de “açougue clandestino” – em época em que os controles sanitários não eram tão rigorosos como agora –, seus pais conseguiam parte dos recursos financeiros para o sustento da família. E cabia ao pequeno Luizinho fazer as entregas de carne de porta em porta na cidade. Para fazer esses mandados, seu pai encaminhava um pedido expresso à diretora do educandário para que ela liberasse o filho das aulas. Dispensado das aulas para cumprir a tarefa, Luizinho disse que a fazia cheio de orgulho, pois “sentia-se importante, batendo de porta em porta para entregar as carnes embrulhadas em papel para os clientes”. Por ser visto vendendo carne na rua, apesar da pobreza, era considerado rico, o que não lhe dava o direito de receber merenda da escola, tinha que levar a sua de casa. E a merenda era geralmente um pedaço de broa ou cuscuz.
Outra incumbência era a de vender almôndegas na escola. Sua mãe as preparava e ele as vendia, principalmente para as professoras. E a sua maior cliente era a professora Dulce Mendes. Certo dia, ele ficou desesperado. Ao levar um esbarrão de um colega, as almôndegas foram ao chão. Vender não podia e muito menos retornar com elas para casa. A bronca seria imensa. Ele as recolheu do chão, sem perceber que era observado pela sua melhor cliente, para no dia seguinte e escondido da mãe, misturá-las às que estavam sendo preparadas para venda. Chegando à escola, a sua melhor cliente, dona Dulce, perguntou: “Luizinho, essas são aquelas que caíram no chão?” “Não, professora.” – ele respondeu. Então ela fez a costumeira compra das almôndegas.
Luizinho guarda na memória outros dois acontecimentos ocorridos no Assis Resende. Certavez, preparando-se para evento cívico, participou de ensaio do canto do Hino Nacional. Desde pequeno, o futuro barítono já possuía voz forte, brilhante e nella maschera (na máscara), como dizem os italianos e que todos conhecemos. “Quando comecei a cantar, Ouviram do Ipiranga... eu mais gritava do que cantava. Foi quando a dona Nair (Nair Caiano), professora de canto e de catecismo, gritou: “Para! Para! Para! Você está atrapalhando tudo! ”Fiquei num aborrecimento, fiquei abatido, chateado e até contei isso pro Agenorzinho. E eu, com a minha voz grossa e forte, que tinha vontade de ser cantor, encerrei minha carreira ali.” (risos).
Por fim, Luizinho relatou a maneira como os alunos eram avaliados no último ano do grupo. Para serem aprovados, todos passavam por uma prova oral diante de uma banca formada por professores da escola. “A chefe da banca era a dona Nininha, casada com o Aurélio, filho do Tonico Chalé, que era a diretora do grupo. Então ela, a dona Vivi, minha professora, e outras nomeadas para o trabalho aplicavam a prova”. Como o grupo de alunos para a prova era grande, as perguntas eram sorteadas na hora. Quem não era aprovado nesta prova oral, tinha que repetir a 4ª série. “Naquele dia, eu dei sorte”, disse Luizinho. “A Dinorá, filha do Chico Luís, um oficial de justiça do Fórum, que em sorteio tirou o número sete, respondeu uma série de questões que correspondiam ao número sete. Eu assisti a tudo, a prova era pública. Quando chegou a minha vez, dei a maior sorte: também tirei o número sete, entre os trinta que tinha. Então eu respondi a tudo com mais facilidade e passei de ano.”
Assim terminaram seus quatro anos de estudo no Assis Resende, para, tempos depois, dar continuidade à sua formação até passar em concurso e tornar-se funcionário público federal.