Aproximar a ciência do cotidiano das pessoas

O professor e presidente do IC-RC, Rodrigo Silva, ministra aulas gratuitas de astronomia a alunos dos Ensinos Fundamental e Médio de Resende Costa


Entrevistas

André Eustáquio0

fotoRodrigo e seus alunos do IC-RC (Foto arquivo particular)

A busca pela compreensão do intricado teorema da existência humana e do universo instiga o homem desde tempos mais remotos. Os filósofos gregos pré-socráticos fizeram perguntas sobre a gênese da natureza e do cosmos. Séculos depois, a filosofia grega sistematiza-se como um saber que surge a partir da inquirição e do espanto do homem ante a magnitude e o mistério da existência. De onde viemos? Para onde vamos? O que é a vida? Perguntas fundamentais sobre as quais a filosofia, a ciência e a religião, com fundamentos distintos e às vezes complementares, se debruçam ao longo de séculos através da investigação de mentes geniais, como Aristóteles, Tomás de Aquino, Galileu Galilei, Isaac Newton, Albert Einstein, entre outros.

O físico, astrônomo e filósofo brasileiro Marcelo Gleiser, autor de diversos best-sellers sobre astronomia e outros temas científicos, afirma em “O fim da Terra e do Céu: O apocalipse na ciência e na religião”, lançado em 2001 pela editora Companhia das Letras, que “a busca por uma teoria capaz de abraçar ‘todas’ as questões, ainda que racional e técnica, é também uma busca apaixonada por algo muito maior do que nós, algo além do tempo, algo universal, algo que nos aproxima de uma noção abstrata de pura sabedoria (...)”. A busca pela sabedoria, que revelou grandes gênios da história da humanidade, da qual fala Gleiser, ainda desperta a curiosidade de muitos jovens que sentem a mesma inquietação pela ciência de Galileu e de Einstein.

Como motivar esses jovens? Como orientá-los no discernimento frente à escolha da carreira acadêmica e ao mesmo tempo prepará-los para a universidade? O JL conversou com o jovem professor Rodrigo José da Silva, presidente do Instituto Científico de Resende Costa (IC-RC). Rodrigo leciona Astronomia e Astronáutica no IC-RC e é representante da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica. Graduado em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), Rodrigo Silva é mestrando em Física e Química dos Materiais e está se especializando em Ensino de Astronomia pela mesma universidade.

Rodrigo Silva falou ao JL sobre os objetivos do IC-RC, as aulas que ele ministra gratuitamente em Resende Costa e também acerca dos projetos que pretende desenvolver na cidade, visando à popularização da ciência e ao auxílio a jovens que pretendem desenvolver carreira acadêmica. O professor estreará neste mês como articulista do site do JL, assinando a coluna “Explorando o Universo”.

 

O que é o Instituto Científico de Resende Costa e como ele vem trabalhando com os alunos no sentido de incentivá-los no estudo da ciência? O IC-RC é uma associação sem fins lucrativos que teve início através do consenso, por parte de um grupo de amigos, de que uma instituição que abrangesse a educação e a ciência de forma mais avançada poderia elevar o sistema de ensino do município de Resende Costa. Nossa equipe é constituída por acadêmicos de alto desempenho, que se destacam no meio universitário no ramo da pesquisa e docência. Nosso maior objetivo, já em andamento através de nossas mais diversas atividades, é o preparo de alunos dos níveis fundamental e médio para olimpíadas acadêmicas tanto estaduais quanto nacionais (nas quais nós, membros do IC-RC, possuímos extrema experiência, inclusive como medalhistas no tempo em que cursávamos o Ensino Médio). Além disso, para despertar o interesse pela ciência, apresentamos aos jovens do Ensino Médio o campo da pesquisa, através do nosso próprio programa de iniciação científica, possibilitando que eles sejam orientados por membros do IC-RC e produzam, inclusive, artigos para publicação em revistas e congressos. Promovemos, também, eventos acadêmicos em nível municipal, como olimpíadas nas áreas de ciências exatas e humanas, premiando com medalhas e certificados os alunos de maior desempenho.

O estudo da astronomia vem ganhando destaque nas atividades do IC-RC. Por quê? Buscamos focar nossas atividades em algo mais dinâmico possível. A astronomia é uma opção perfeita para tanto. Além de se tratar de algo completamente novo para os alunos (trata-se de um conteúdo que não faz parte do currículo escolar), é um ramo que explora as mais diversas ferramentas da ciência: matemática, física, geografia e até mesmo a engenharia. É um conteúdo que também possibilita abordagens tanto teóricas quanto práticas.

A astronomia pode despertar o interesse dos jovens pela ciência e, consequentemente, auxiliá-los no momento da escolha do curso superior? Justamente por abordar diversas áreas da ciência (de forma mais complexa, porém didática), ao ensinar astronomia acabo por apresentar ao aluno conceitos que só seriam vistos no início do curso superior. Dessa forma, muitos deles já se identificam com certas áreas da ciência. Observo que, após certo período assistindo às minhas aulas, muitos dos meus alunos já fizeram suas escolhas e possuem um curso de graduação específico em mente.

Fale sobre as aulas que você ministra no IC-RC. Ministro aulas gratuitas de astronomia para alunos dos Ensinos Fundamental e Médio, semanalmente, na Escola Municipal Conjurados Resende Costa. O espaço nos foi cedido pelo prefeito Aurélio Suenes. As aulas são específicas para que os alunos participem da Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (competição teórica) e da Mostra Brasileira de Foguetes (competição prática). Portanto, nosso cronograma vai de acordo com a data dessas competições. Começamos com uma única aula por semana e vamos aumentando a frequência das mesmas à medida que as competições se aproximam. Minhas aulas se dividem em teóricas (sala de aula) e práticas (a céu aberto). Minha principal metodologia é um método próprio que chamo de ‘se colocar na posição de aluno’. Quando o professor prepara uma aula e seleciona exercícios para trabalhar em sala, geralmente faz a ‘solução’ desses exercícios anteriormente. Mesmo que um professor apresente a solução passo a passo desses exercícios que estudou previamente, ele não conseguirá replicar a verdadeira realidade do aluno. Durante uma avaliação, o aluno se depara com exercícios que, muitas vezes, não faz ideia de como iniciar. Ele encontra obstáculos e muitas vezes não consegue contorná-los. Logo, escolho exercícios relacionados ao tema de estudo para trabalhar com os alunos, mas somente os resolvo, pela primeira vez, juntamente com eles. Dessa forma, passo pela mesma situação que eles passariam durante uma avaliação, ou seja, ‘enfrentar’ um exercício ‘inédito’. Colocando-me ‘na posição de aluno’ diante dos próprios alunos, torno possível que eles presenciem, de forma real, as ferramentas que utilizo para contornar obstáculos. Consequentemente, durante as avaliações, eles replicam o que presenciaram e acabam obtendo resultados melhores.

Como vem se dando a parceria do IC-RC com a Agência Espacial Brasileira? Através da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) e da Agência Espacial Brasileira (AEB), estamos cadastrados como instituição de ensino na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica e na Mostra Brasileira de Foguetes do ano de 2019, competições nas quais atuo como Professor Representante. Portanto, nossos alunos poderão participar, representando o IC-RC, nessas competições e concorrer a medalhas e certificados em nível nacional.

Você tem um projeto de instalar telescópios no Mirante das Lajes de Cima. Como se daria isso? Um dos projetos futuros de iniciação científica a serem trabalhados com os alunos do Ensino Médio, para a produção de mais um artigo científico, trata-se do estudo e construção de telescópios refratores. Temos como objetivo construir algumas unidades de telescópios refratores e fixá-los nas Lajes de Cima para uso público.

A ciência ainda é vista por muitos como um saber destinado a uma ‘elite pensante’, devido à sua complexidade. O interesse crescente das pessoas por temas científicos como a astronomia pode ajudar a desmitificar essa ideia? Na obra “A Vida Intelectual”, do padre A-D. Sertillanges, são estabelecidas quatro modalidades de leitura de texto: para formação, para informação, para inspiração e para entretenimento. Vejo a ciência da mesma forma: há vários níveis de leitura. Assim como há a exploração complexa, que engloba cálculo diferencial e integral e teorias avançadas, há também as abordagens dinâmicas e simples, de fácil compreensão, fontes de grande entretenimento. Para desmitificar a ideia de que a ciência é um saber destinado a uma ‘elite pensante’, precisamos deixar isso bem nítido. A astronomia, trabalhada com os jovens das mais diversas formas, em conjunto com projetos de extensão (como a implementação dos telescópios nas Lajes de Cima), há de colaborar muito para tal fim.

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