Bairros são-joanenses: o trabalho de educação de crianças no “novo Tijuco”

Escola Chave do Saber - da Turma da Mônica Derretida -, Nova Geração Brasil, Centro Infantil Celina Resende Viegas, Casa Assistencial Semente do Amanhã e OSFA (Obras Sociais Fé e Alegria) algumas entidades de destaque na região.


Cidades

José Venâncio de Resende1

A Turma da Mônica Derretida, na homenagem à Chave do Saber pelo Bloco Unidos da Cambalhota.

Instituições de inclusão social e educação de crianças e adolescentes atuam discretamente no Tijuco, mais precisamente na região “nova” do bairro, a partir da matriz de São José Operário. Atuavam, porque uma delas – a Escola Chave do Saber – de repente se tornou conhecida nacional e mundialmente.

Nos últimos 30 a 40 anos, no grande Tijuco, foram criadas vilas e núcleos habitacionais como Vila São Bento e os residenciais Lenheiro, Maria Alves Barbosa,  São José, Parque das Cachoeiras, Dom Lucas e Risoleta Neves I e II (os três últimos, do tipo condomínio residencial Minha Casa, Minha Vida).

O “novo Tijuco” faz parte da Paróquia de São José Operário, explica a professora Vilma das Mercês Lopes da Silva, aposentada do Estado, que está coletando material, junto com historiadores como Antônio Gaio Sobrinho e Evandro Coelho, para um livro sobre o bairro. Já o Tijuco antigo é formando pelas ruas São Caetano (onde já havia capela em 1717), Santo Antônio, General Osório, São José, São João e Águas Férreas.

Turma da Mônica

Em 2018, a Escola Chave do Saber – na divisa entre a Vila São Bento e o Residencial Lenheiro - criou um projeto pedagógico denominado “O candidato amigo da escola”, conta o seu diretor Jonathan Nathan Alves. “Nesse projeto, trabalhamos a eleição, adequando o assunto à idade das crianças. Cada sala tinha o seu candidato, sendo cada candidato um personagem da Turma da Mônica.”

Assim, foram criados três “partidos”. Cebolinha – auxiliado pelo seu amigo Cascão - era o candidato do Maternal 2 (crianças de 2 anos), abordando amizade e beleza. Magali, apaixonada por melancia, era candidata do Maternal 3 cujo partido era o da saúde (alimentação saudável). E Mônica era candidata do 1º período, que representava o partido dos animais.

No final, houve uma eleição com a participação da comunidade, na qual as crianças e seus candidatos fizeram campanha. O Cebolinha distribuía gel; a Magali, melancia; e a Mônica, chaveirinhos. Quem venceu foi a Mônica. “Este é um exemplo de projeto educacional”, enfatiza Jonathan, para mostrar inclusive que não se deve “comprar votos”.

Início das aulas

Então, ocorreu que, no início de 2019, Jonathan estava à procura de roupa de algum personagem infantil para receber as crianças no primeiro dia de aula. Seu amigo Rômulo, professor e dançarino, tinha roupas da Turma da Mônica usadas num circo onde ele trabalhou. “Ele me emprestou as roupas que eram para adultos.”

Assim, foi organizado o primeiro dia de aula, numa segunda-feira (4 de fevereiro), no qual Anita (48 anos) representou Mônica; sua irmã Ana (46 anos), Chico Bento; o marido de Anita, Vicente (58 anos), figurou como Cebolinha; e Leanderson (14 anos), irmão de Jonathan, representou Cascão. “Foi um dia tranquilo e divertido, apesar do choro normal da primeira vez na escola.”

Foram feitas muitas fotos e, no mesmo dia, muitos pais postaram fotos nas redes sociais, lembra Jonathan. “Uma das fotos viralizou porque estava muito divertida. Na foto, o Cebolinha estava com o dedo machucado e a Mônica estava com a roupa da Magali.”

Repercussão

A repercussão foi imediata e em grandes proporções, relata Jonathan, “bombando principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo. ´Que Turma da Mônica era esta?´, era o que todo mundo queria saber”.

No dia seguinte, a notícia circulou em São João del-Rei, mas o povo não sabia qual era a escola. Jonathan convocou uma reunião dos pais para a quarta-feira (dia 6) e, na ocasião, explicou o que estava acontecendo. “Eu disse que o nosso objetivo, de receber as crianças de forma divertida, alegre, tinha sido alcançado.” Informou que faria uma postagem no facebook da escola e que os pais poderiam compartilhar e reforçar a ideia de que os objetivos foram alcançados.

A postagem foi feita logo depois da reunião (por volta de 20h), relata o diretor. “Dois minutos depois, o Fantástico (TV Globo) ligou e disse que o Maurício de Souza já estava sabendo etc.” Foi assim que a Turma da Mônica visitou a escola e participou da gravação do Fantástico. Depois, Jonathan e a “Turma da Mônica Derretida” foram conhecer a Maurício de Souza Produções e o resultado de tudo - a reportagem do Fantástico - foi ao ar em 17 de fevereiro.

A repercussão continuou, com outras emissoras de televisão, jornais e rádios do Brasil procurando a escola. A Rádio Gaúcha, por exemplo, promoveu um bate-papo ao vivo com Jonathan e Maurício de Souza.

A Turma da Mônica Derretida, já com a presença da Magali, apareceu no carnaval são-joanense quando o Bloco Carnavalesco Unidos da Cambalhota resolveu homenagear a Escola Chave do Saber. “Foi um dia fantástico e de grande reconhecimento pra nós”, resume Jonathan.

Isto mudou a visão do povo, que passou a admirar a “Turma da Mônica Derretida” e a valorizar mais o profissional e a escola, comemora Jonathan. “A Chave do Saber passou a ser conhecida como escola do Tijuco em São João del-Rei. Estamos mais revigorados. E o contato com a Turma da Mônica continua.”

Outros projetos

A escola desenvolve vários projetos de cunho educacional, além de projetos de datas comemorativas (dias das mães e dos pais, festa junina, semana das crianças, Páscoa etc.), conta Jonathan. Também tem projetos específicos como os de contação de histórias (pelas famílias dos alunos) e da semana da alimentação (as crianças “colocam a mão na massa”). “Assim, as crianças são envolvidas de forma lúdica no processo de conhecimento.”

A Escola cresceu muito e as instalações ficaram pequenas, graças ao envolvimento dos pais. Por isso, o plano de Jonathan é construir uma nova sede, maior e mais adequada. “Mas queremos continuar no Tijuco, afinal a escola sempre foi no Tijuco.” Com um detalhe: a escola está aberta a novas parcerias que envolvam os atuais e novos projetos educacionais.

Outras instituições

Outros trabalhos de destaque no apoio a crianças e adolescentes são organizações não-governamentais (ONGs) como a Nova Geração Brasil, o Centro Infantil Celina Resende Viegas, a Casa Assistencial Semente do Amanhã e a OSFA (Obras Sociais Fé e Alegria).

A Nova Geração Brasil, desde 2015 no Bairro Dom Lucas, é dirigida por Samuel Van De Raa de Souza, neto do pastor holandês Klaas Van De Raa, que criou nos anos 70, na região (atual Vila São Bento), o projeto Obras Sociais Fé e Alegria (OSFA). “Desde os nove anos, antes de ir para a Holanda, eu dizia que ia fazer o mesmo trabalho do meu avô.”

Samuel viveu na Holanda entre 1993 e 2017, tempo suficiente para estudar Tecnologia da Informação e Economia, assim como fundar, em 2013, a ONG Nova Geração Brasil, junto com a esposa Laura. “O objetivo era arrecadar recursos e doações (roupas) e trazer pessoas para conhecer o trabalho com crianças de 5 a 18 anos no Brasil.”

A ONG atende 106 crianças fora do período escolar dos bairros Dom Lucas, Risoleta Neves I e II, Barro Preto, Vila São Bento e Residencial Lenheiro. À noite, oferece atividades como jiu-jitsu, karatê, zumba, dança e futebol, conta Samuel. “A nossa missão é ter um lugar seguro para as crianças (carinho, amor e segurança física); com educação (apoio à escola e à família) e cursos profissionalizantes (padeiro, cozinheiro, ceramista, mêcanico, garçom etc.). E tudo isso para crescer fisica, cultural e profissionalmente. O nosso foco é social, tendo a Bíblia como referência.”

A ONG tem parcerias com várias entidades. A Polícia Militar, por meio do Programa Educacional de Resistência às Drogas, ministra palestras mensais. Alunos dos cursos de Medicina e Enfermagem do UNIPTAN oferecem palestras na área de saúde, enquanto os alunos da Administração apoiam na captação de recursos (dinheiro e alimentos). Alunos da UFSJ ministram aulas semanais de cerâmica e aulas de reforço de Matemática.

Outra parceiro relevante, o “posto de saúde” do Tijuco (ESF fruto de convênio entre Secretaria Municipal de Saúde, UFSJ e UNIPTAN), oferece atendimento médico uma vez a cada duas semanas para as crianças e a comunidade, exame preventivo para mulheres e vacinação para crianças e adultos.

As atividades são desenvolvidas numa área construída de 950 m², além de espaço para curso de cerâmica e parque para as crianças brincarem, e mais 700 m² de quadra poliesportiva (previsão de ser coberta até o fim do ano).

Em abril último, Samuel inaugurou o Café Encontro, em frente à matriz N. S. do Pilar, com o objetivo de oferecer produtos artesanais da padaria e da culinária da ONG, além de produtos internacionais (Europa e EUA). Em colaboração com a Nova Geração Brasil, o Café oferece estágios e trabalho para os jovens de ambientes carentes. “O nosso sonho é promover o encontro dessas crianças e jovens com a população em geral, e vice-versa.” A receita do café é doada para a ONG.

Centro Infantil

O Centro Infantil Celina Resende Viegas (creche) funciona ao lado da matriz, desde 28 de outubro de 1989, sendo vinculado à Associação dos Moradores e Amigos do Bairro São José Operário. Começou com 50 crianças e, atualmente, atende 65 crianças, entre 5 meses e 4 anos, desde que as mães estejam trabalhando, conta Tarcício Maurício Almeida, vice-presidente da Associação e responsável pela creche.

A creche surgiu como obra social da associação. Desde a sua criação, a associação tinha dois braços: o educacional e o assistencial, lembra Tarcísio. Inicialmente, a parte assistencial (sopa, cesta básica, roupas etc.) prevalecia por causa da carência da região. Com a criação da creche, a área educacional ganhou maior relevância.

A creche funciona em período integral (7:30 às 16:30), com quatro refeições diárias e orientação pedagógica coordenada por Camila Rodrigues. A Associação tem convênio com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), mas os recursos estão atrasados desde janeiro de 2018, de acordo com Tarcício.

Assim, a creche acaba por viver de captação de recursos junto à população, por meio de telemarketing coordenado por Samira Rodrigues. O ano de 2018 foi “muito difícil porque houve uma queda das doaçoes, e ainda continua sendo difícil neste início de ano”, assinala Tarcício.

Na creche, funciona uma biblioteca (virtual e com livros impressos), construída com o apoio do Sesi/Fiemg que é aberta à comunidade.

Semente do Amanhã

O projeto social Casa Assistencial Semente do Amanhã, ao lado da matriz de São José Operário, atende 60 crianças entre 4 e 14 anos, em horário extra-turno escolar, de acordo com sua presidente Sônia Regina de Paula. A ONG sobrevive unicamente com recursos da comunidade são-joanense, captados por meio de um serviço de telemarketing.

A Semente do Amanhã foi fundada em 2003, por iniciativa de cidadãos de várias formações profissionais, com o intuito de atender as crianças que não tem mais idade de frequentar creches, explica Sônia. Evita-se, assim, que estas crianças estejam nas ruas enquanto seus pais trabalham.

As crianças são divididas em quatro turmas, por faixa etária, cada uma com sua respectiva educadora, informa Sônia. São oferecidos alimentação, lazer e acompanhamento psicológico e pedagógico, “com o objetivo de contribuir com as famílias na formação do caráter e da ética e na inserção dessas crianças na sociedade. O trabalho pedagógico complementa o trabalho feito nas escolas onde estão matriculadas.”

As crianças tem aulas de informática, capoeira e futebol, esta última atividade no campo do São Caetano.

OSFA

Desde 2008, o pastor Luís Alves Cabral, da Igreja Filadélfia de Santa Cruz de Minas, está à frente do trabalho da OSFA, na Vila São Bento. São 40 crianças atendidas, entre 4 meses e 4 anos.

As crianças tem atividades pedagógicas, três alimentações diárias, banho, suporte a família. A OSFA vive de doações da Holanda, por meio do apadrinhamento das crianças, e doações de pessoas diversas no Brasil, na forma de mantimentos, roupas e brinquedos.

Campo abandonado

O Alvorada Esporte Clube, na Vila São Bento, está sem atividades, por falta de condições de uso, tanto do campo quanto dos vestiários, diz seu presidente Fábio dos Santos Ribeiro. “Nós estamos recuperando o campo aos poucos, mas é um processo demorado por falta de ajuda do poder público.”

Por muitos anos, houve atividades constantes no campo, conta Fábio. “Mas com o passar do tempo foi deixado de lado.”
Nos últimos cinco ou seis anos, Fábio e seu braço direito Antônio dos Santos vêm tentando recuperar o campo “com ajuda da comunidade através de doações de material como tijolos, blocos, areia etc.”

O clube tem uma diretoria formada por moradores do bairro, explica Fábio. Tanto antes quando havia atividades, quanto agora com o processo de revitalização, o engajamento da comunidade ocorre através de doações, rifas e mutirões.

O clube tem vínculo com a Prefeitura através de um comodato, mas “a única ajuda que tivemos do setor público foi através de dois vereadores, que nos doaram alguns blocos. No mais, o setor público nem para o nosso lado olha”.

Jonathan Nathan Alves, da Escola Chave do Saber, vê potencial no campo do Alvorada para uma escola de futebol para crianças. Quem sabe uma parceria entre entidades que atuam na região não pudesse viabilizar este projeto?

Um pouco de história

O primeiro grande impulso ao bairro do Tijuco foi a construção da Capela Imaculada Conceição e da Igreja São José, na década de 1940, de acordo com a professora Vilma das Mercês Lopes da Silva. A paróquia de São José Operário foi instalada em 1952 e o primeiro pároco foi o padre Osvaldo da Fonseca Torga. “Na época, o padre já tinha uma visão social da igreja.”

Ao lado da igreja, o então pároco construiu um prédio para as Escolas Reunidas – que mais tarde se tornariam o Grupo Escolar Iago Pimentel – e o Ginásio Complementar (noturno) que se transformaria na Escola Municipal Dr. Kleber Vasques Filgueiras. Também criou um posto de saúde, que ele equipou e colocou para funcionar.

Vilma lembra que padre Osvaldo - prefeito duas vezes – levava profissionais do centro da cidade para atender no posto, como os doutores Euclides Garcia e Cid Valério, além do dentista dr. Dalmiro. Também mantinha uma chácara de onde saíam legumes e verduras, além de moinho d´água onde fazia fubá, destinados as famílias mais necessitadas, com base na orientação dos médicos do posto. Funcionava ainda um lactácio, com o apoio da LBA (Legião Brasileira de Assistência), que recebia leite em pó e preparava (por meio de voluntários) para distribuir a mães atendidas no posto. “Este trabalho contribuiu para diminuir a mortalidade infantil”, assinala Vilma.

Outra preocupação do pároco era com o futuro das crianças, observa Vilma. Tanto que mantinha na chácara uma escola técnica onde os meninos aprendiam a lidar com agricultura.”Ele tinha também um galpão com uma marcenaria-escola onde os meninos aprendiam a profissão.”
Além disso, padre Osvaldo construiu casas populares na rua São José, “quase chegando à Vila São Bento, que as pessoas pagavam de acordo com as suas possibilidades. A paróquia atendia toda essa região; ele passava por muita dificuldade”, conta Vilma.

Novo pároco

A partir de 1963, assumiu a paróquia de São José Operário o padre José Antônio de Assis Teixeira (que ficaria até 1969). Com o avanço da parte social, o novo pároco dedicou-se mais à parte espiritual, no espírito do Concílio Vaticano II, lembra Vilma. “Ele dividiu a paróquia em setores, e cada setor tinha um coordenador, o que existe até hoje. Nesses setores, ele promovia a aproximação entre famílias desestruturadas e famílias estruturadas, além da ênfase na catequese.”

O padre José Antônio foi o fundador do Ginásio Complementar (escola noturna), que receberia o nome de Dr. Kleber Vasques Filgueiras. “Ele via no bairro senhores e senhoras que não tiveram chance de estudar. O dr. Kleber foi outro baluarte. Ele era ginecologista e dava cursos para jovens e senhoras no próprio ginásio, a convite do padre José Antônio. Às parturientes do bairro ele dedicava parte do seu tempo após o expediente no hospital.”

Pastor holandês

Em 1970, chegou a São João del-Rei o pastor holandês da Igreja Filadélfia, Klaas Van De Raa, a esposa Jane e os três filhos do casal, depois de morar 10 anos em São Paulo onde fundaram 10 igrejas no interior do Estado e assumiram um orfanato em São José do Rio Pardo. Ele foi convidado por um dos pastores da igreja para conhecer São João del-Rei, gostou tanto que transferiu os trabalhos de São Paulo para outros pastores e dicidiu mudar para a cidade mineira, conta Raquel Van De Raa, a terceira filha do casal, então com seis anos.

O pastor estava há 10 anos no Brasil, e veio com o propósito de evangelização, recorda Raquel. Em 1961, formou uma ONG na Holanda e, a partir daí, uma ou duas vezes por ano visitava igrejas, escolas, empresas e ONGs para apresentar projetos e pedir doações. Regularmente, os doares vinham ao Brasil conhecer o trabalho desenvolvido com as doações.

Em São João del-Rei, o primeiro terreno foi adquirido na Rua Rossini Baccarini e, enquanto construía uma igreja, o pastor mantinha uma creche que funcionava como semi-internato. Quando a igreja foi concluída, em 1972, a creche tinha cerca de 50 crianças, a maioria da Vila São Bento, mantidas com doações da Holanda.

Mas o pastor Klaas decidiu que, em vez de as crianças irem para a creche na Rua Rossini Baccarini, ele iria até elas na Vila São Bento. “Ele queria estar no foco do problema”, lembra Raquel.

O pastor vendeu a casa de moradia e a igreja da Rua Rossini Baccarini e, em 1973, comprou um terreno e começou a construção na Vila São Bento. Enquanto construía, funcionavam no local igreja e creche, repetindo a experiência anterior.

Cursos profissionalizantes

Em 1976, o pastor Klaas inaugurou, com a presença do embaixador da Holanda, seu projeto na Vila São Bento com o nome de Obras Sociais Fé e Alegria (OSFA). A esta altura, já havia cerca de 150 crianças, entre 5 e 14 anos, e salas para ensino profissionalizante (marcenaria, sapataria, crochê, tricô, culinária etc.).

No início, foi difícil, lembra Raquel. “Nós, inclusive as crianças, buscávamos água na bica em frente ao bar do João Cabral. Na inauguração, meu pai ganhou fundos para fazer o poço artesiano. Com a falta de água, o poço da OSFA atendia o bairro inteiro.”

Entre 1970 e 1995, o que foi feito em matéria de construção e educação na Vila São Bento foi graças a doações da Holanda conseguidas através do trabalho do pastor Klaas Van De Raa, enfatiza Raquel. Foram doações em forma de dinheiro e de produtos (roupas, leite em pó, queijo, feijão, enlatados etc.). Menos os tijolos usados na construção do prédio da OSFA e da igreja, que foram feitos pela comunidade numa olaria da região.

Em 1995, foi inaugurada a nova sede da Igreja Filadélfia ao lado da OSFA, na Vila São Bento. A igreja principal funcionou, entre 1984 e 1994, na Rua São João, perto da E. E. Iago Pimentel, informa Raquel.

Com a morte do pastor em outubro de 1995, não houve prosseguimento da obra como ele a idealizou, diz Raquel. “Antes de morrer, meu pai fez a separação formal entre a OSFA (direção própria) e a Igreja (convenção própria).” A família Van De Raa esteve à frente da OSFA até 1996, quando então outra direção assumiu o trabalho.

Associação

Uma sopa no Residencial São Caetano, para enfrentar a desnutrição crônica das crianças na época, deu origem, 32 anos atrás, a uma associação, que foi a semente da atual Associação dos Moradores e Amigos do Bairro São José Operário. Com a decisão da paróquia de lotear uma área até o Cemitério São José, na Vila São Bento, o então bispo D. Antônio Mesquita determinou que uma parte da área fosse destinada à comunidade, conta Tarcísio Maurício Almeida, vice-presidente da associação.

No final dos anos 1970 e início dos 80, havia a febre de construir centros urbanos, mas o Estado não realizou a obra e, em meados dos 80, o terreno voltou para a comunidade que entregou sua gestão à associação, resume Tarcísio. Como havia duas propostas de utilização da área, houve um plebiscito e a maioria da comunidade optou pela criação de uma creche, ao invés de uma escola técnica. Assim, surgiu o Centro Infantil Celina Resende Viegas.

De Centro a Escola

No final dos anos 1990, surgiu na casa professora Nilza do Carmo Giarola, no Tijuco, o Centro Educacional A Chave do Saber. Por volta de 2002, o Centro Educacional transformou-se em Instituto e, em 2018, na Escola Chave do Saber, segundo relato de Jonathan Alves. O Instituto A Chave do Saber chegou a ter 112 alunos na época da professora Nilza.

Jonathan trabalhou no Instituto como professor no período 2011-2013 quando deixou a escola para ser coordenador das escolas municipais. Ele retornou ao Instituto em 2017. “Neste ano, havia 15 anos. Em 2018, a escola fechou o ano com 24 alunos e em 2019, com 55 alunos.”

Juliana Zin, professora da rede estadual, trabalhou como professora do maternal no Centro Educacional, entre 1997 e 2003. “Eu entrei fazendo limpeza para pagar a escola dos meus filhos, e isto me incentivou a estudar.” Ela fez a sétima e a oitava séries, o ensino médio e a faculdade de Normal Superior, com pós em pedagogia.

“Eu conheço o trabalho do Jonathan e da equipe. Meus três filhos adultos (Giovanna, Matheus e Pedro) foram alunos do Centro Educacional A Chave do Saber”, diz Juliana. Hoje, sua filha Ysis, de 3 anos, e a sobrinha Beatriz (4 anos) fazem o primeiro período na Escola.

Andresa das Mercês Silva, atual secretária e vice-diretora, foi aluna do então Instituto, entre 1997 e 2000. No período de 2013-2014, foi professora de Educação Física, atividade que retomou a partir de 2017. Sua filha Gabrielle (3 anos) é aluna do maternal 3. “Para mim, é muito gratificante trabalhar na Escola desde os 14 anos.”

Escola infantil

Depois que a Escola Iago Pimentel mudou na década de 1980 para prédio próprio, o espaço ficou ocioso durante o dia, já que as aulas para adultos continuavam, conta Vilma. “Quando o Mobral decidiu dar assistência para crianças, eles nos ofereceram uma sala para crianças de 5 anos.”

O número de matrículas, inclusive de 4 anos, foi tão elevado que Vilma fez um desafio: “Eu propus ao Mobral que entrasse com merenda e material e eu entraria com a mão de obra voluntária para uma turma de 4 anos. Eles toparam e eu fui dando aulas até que, em outubro, fiz um cadastro das crianças de 4 e 5 anos, inclusive com levantamento sócio-econômico. Deram cinco turmas. Eu enviei para a direção do Mobral que aprovou as cinco turmas. Eu deixei as aulas e passei a ajudar na coordenação. De cinco, aumentou para 12 turmas e aí houve a municipalização que é a E. M. Dr. Kleber Vasques Filgueiras. E o curso para adultos acabou.”

“Nós levamos mais de 40 anos para a construção do atual prédio da E. M. Dr. Kleber Vasques Filgueiras”, revela Vilma. No prédio antigo, atualmente funciona a obra de assistência social Semente do Amanhã, conduzida por voluntários.” Já o antigo posto de saúde, cujo prédio pertence à Prefeitura, está desocupado. A administração municipal alugou junto à Paróquia dois prédios onde funcionam, atualmente, unidades da ESF (Estratégia de Saúde da Família) Tijuco (convênio entre Secretaria de Saúde, UNIPTAN e UFSJ), popularmente chamadas de “posto de saúde”).

Já a Igreja de São José Operário, de acordo com Vilma, teve o seu tamanho triplicado – e está sendo novamente reformada – fruto da ação de diferentes párocos, e foram criadas pastorais como as de saúde e da sobriedade.

Futebol e carnaval

Pouco se sabe do passado da região, quando se fala de futebol e carnaval. Maurício Silvino de Castro, o Maurinho, por exemplo, na década de 1970, jogou como cabeça de área (antigo beque central) no time do bairro de nome São Bento, dirigido por Inácio Sanches de Andrade. Depois o time mudou de nome, com a criação do Alvorada Esporte Clube em 1982.

Maurinho recorda, ainda, que, na mesma época, o carnaval são-joanense era abrilhantado com a presença do Rancho Carnavalesco Lua Nova, um “bloco familiar” liderado por Zé Prego que saia do bairro rumo à antiga Avenida Rui Barbosa (atual Tancredo Neves). Zé Prego aposentou-se como funcionário da antiga Casa Alves Neto que vendia ferragem; ele tinha uma carroça e fazia entregas da loja na cidade.

No bairro havia ainda um areal, próximo ao Córrego do Lenheiro, onde se explorava areia branca destinada a fabricar lâmpadas e louças, entre outros produtos, acrescenta Maurinho. A areia era extraída por meio de bomba, britada, queimada em forno e ensacada para ser enviada para centros como São Paulo e Rio de Janeiro.

 

 

Comentários

  • Author

    Nossa Gratidão :) Adoramos a reportagem!


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