Entrevista com o Juiz de Direito da Comarca de Resende Costa, Donizetti Nogueira Ramos

“O presídio suportou a demanda da região, mas é evidente a superlotação carcerária. Tanto assim, que existe um procedimento da Defensoria Pública de Minas Gerais, com apoio do Ministério Público, visando a obrigar o Estado a buscar outras alternativas, de modo a adequar o número de presos à realidade da unidade prisional”


Entrevistas

André Eustáquio / Vanuza Resende0

Dr. Donizetti Nogueira Ramos, juiz de direito da Comarca de Resende Costa (foto André Eustáquio - arquivo Jornal das Lajes)

A pandemia da Covid-19, que a cada dia vem ceifando vidas em todos os cantos do planeta, mudou também a rotina do sistema prisional. Para mitigar a possibilidade de contágio do novo coronavírus entre os detentos privados de liberdade, medidas de segurança sanitária vêm sendo tomadas desde que foi decretada a pandemia, em 2020. Desde o ano passado, o presídio de Resende Costa tornou-se referência como centro de triagem para presos provenientes de 10 comarcas da região.

O JL conversou com o juiz de direito da Comarca de Resende Costa, Donizetti Nogueira Ramos, sobre a atual situação do presídio, inaugurado em 2008. Natural de Barbacena, dr. Donizetti chegou a Resende Costa em 1998 e desde então é o juiz responsável pela Comarca.

 

No dia 23 de março de 2020, foi divulgado que o presídio de Resende Costa se tornaria um entre os 30 centros de triagem das unidades prisionais no estado de Minas Gerais, durante o período da pandemia. Desde então, como está funcionando a logística das prisões em Resende Costa? Desde o reconhecimento da Covid-19 como uma pandemia pela Organização Mundial de Saúde, em março de 2020, o presídio de Resende Costa passou a ser um centro de triagem para os presos provisórios das comarcas de Andrelândia, Barroso, Barbacena, Carandaí, Congonhas, Conselheiro Lafaiete, Entre Rios de Minas, Ouro Branco, Prados e São João del-Rei. Portanto, todo indivíduo preso em uma dessas comarcas é trazido para Resende Costa, onde passa o período da quarentena (geralmente quinze dias), e depois é recambiado para sua comarca de origem. A logística das prisões no presídio local tem funcionado da seguinte forma: todos os presos das comarcas acima referidas e também os de Resende Costa ficam na cidade por 15 dias, em média, durante o período da quarentena, e depois são recambiados para usas origens. No caso de presos de Resende Costa, eles são levados para o presídio de São João del-Rei. Existe uma cela totalmente separada no cárcere, onde estão cerca de dez presos já condenados em Resende Costa e que são os responsáveis pela manutenção dos serviços desenvolvidos na Unidade Prisional. Esses detentos não têm nenhum, absolutamente nenhum, contato com os presos que aqui cumprem o período da quarentena.

 

A orientação é que, após cumprido o período da quarentena e atestada a saúde dos presos, eles são levados para outras penitenciárias ou presídios, seguindo o fluxo normal de gestão de vagas do Estado. Esse prazo vendo sendo cumprido? Sim, os detentos são levados para outros presídios após o lapso da quarentena. Os prazos têm sido cumpridos, na medida do possível, pois, como são várias cidades e diversos presos, isso demanda uma logística imensa, o que às vezes dificulta o cumprimento fiel dos prazos.

 

Os detentos passam por exames antes de serem levados para outras unidades prisionais? Os presos passam por exames antes de serem encaminhados para seus presídios de origem.

 

O presídio de Resende Costa vem comportando a demanda regional? A média de presos nos últimos tempos varia de 70 a 100 presos. O presídio suportou a demanda da região, mas é evidente a superlotação carcerária. Tanto assim, que existe um procedimento da Defensoria Pública de Minas Gerais, com apoio do Ministério Público, visando obrigar o Estado a buscar outras alternativas, de modo a adequar o número de presos à realidade da unidade prisional.

 

Houve transferência de detentos que cumpriam pena em Resende Costa para outra unidade prisional? Os presos de Resende Costa que não estavam trabalhando anteriormente à pandemia foram todos recambiados para o presídio de São João del Rei.

 

Foram diagnosticados casos de Covid-19 entre os detentos do presídio de Resende Costa? Sim, já houve casos de contaminação pelo coronavírus no presídio de Resende Costa. Além dos presos, vários agentes penitenciários também foram contaminados. O procedimento adotado foi o tratamento e o isolamento. No total, foram 13 presos e 22 agentes infectados, conforme constatado por exame médico.

 

Os detentos que cumprem pena passam periodicamente por exames, a fim de detectar possível contaminação? Geralmente os exames são feitos naqueles presos que apresentam algum sintoma característico da Covid-19. É como na população, em geral: ninguém fica toda semana fazendo o PCR (exame laboratorial), mas, sim, quando tem algum sintoma.

 

Quais medidas estão sendo tomadas para evitar contaminações pelo coronavírus no presídio? As medidas tomadas são aquelas preconizadas pelas autoridades de saúde, ou seja, limpeza com álcool em gel ou álcool 70º e uso de máscaras.

 

As visitas aos presos foram suspensas durante o período da pandemia? E a entrega de kits com suplementos de alimentação e materiais de higiene, levados pelos familiares? Os presos que estão na quarentena não recebem visitas nem alimentos de parentes, o chamado “sacolão”. Somente têm acesso ao seu advogado. Já os presos que colaboram no presídio continuam com o direito às visitas e também ao “sacolão”. Todavia, isso também está suspenso para eles nesse período da Onda Roxa.

 

E em relação às saídas temporárias? Durante o período da pandemia da Covid-19, nenhum preso foi autorizado a usufruir da saída temporária. Isto se deu não só para proteger os familiares e moradores da cidade, como também para proteger a eles próprios.

 

Mesmo durante a pandemia, os detentos continuam trabalhando nas oficinas no interior do presídio? Sim, os presos que tinham autorização para o trabalho interno continuam desenvolvendo suas atividades, tanto no tear, fabricando colchas, tapetes, cortinas etc., quanto na fabricação de bloquetes e manilhas, na parceria com a Prefeitura Municipal de Resende Costa. Existe também o trabalho na marcenaria, com bancos, mesas e outros objetos de madeira. Deixo consignado que o trabalho dos reclusos tem sido muito vantajoso para eles e para a nossa cidade. Os presos têm remido um dia de pena para cada três dias de trabalho. A cidade já ganhou várias ruas calçadas com bloquetes feitos no galpão do presídio. A média diária é de mil e duzentos bloquetes feitos pelos reeducandos do presídio de Resende Costa.

 

A pandemia impôs tristezas e enormes desafios para toda a sociedade. E não vem sendo diferente para quem está privado da sua liberdade... Nesta quadra perturbada pela qual passamos, todos devemos dar nossa cota de sacrifício. A sociedade, o mundo, nunca mais serão os mesmos depois que essa pandemia passar. Deveremos olhar para nós mesmos e entendermos que somos simples passageiros deste sopro que é a vida, que hoje existe e amanhã pode nos ser levada, num átimo. Daí a importância de saber reconhecer o erro do próximo. De puni-lo, porque ele deve ser realmente punido pelo erro que cometeu. Mas de perdoar-lhe, porque até Cristo perdoou a quem o crucificou no Calvário.

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