Medicina é o curso mais bem sucedido do Brasil, segundo Ipea


Emanuelle Ribeiro


fotoJuliana Silva

Após apresentarmos diversas profissões, que estão entre as mais escolhidas e bem pagas do Brasil, a série “Escolha sua profissão” se encera nesta edição. No topo dos cursos mais bem sucedidos do país está Medicina. Quem dá detalhes sobre a formação é a médica Juliana Silva Pinto, 29 anos, formada em janeiro de 2015 pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). A resende-costense iniciou sua carreira como plantonista no Hospital Nossa Senhora do Rosário e, atualmente, é residente de pediatria no IPSEMG, Hospital Governador Israel Pinheiro, em Belo Horizonte.

O que a levou a escolher medicina como profissão? A Medicina sempre foi um grande sonho. Sempre tive muito definido que eu gostaria de trabalhar diretamente com o próximo, de alguma forma que pudesse fazer a diferença na vida das pessoas. Isso somado ao exemplo do meu pai (o médico Luiz Antônio Pinto), que logicamente também pesou muito na escolha. Tanto por permitir um contato mais próximo com a profissão quanto pela admiração que eu sentia ao observar a forma como ele sempre guiou sua carreira com sabedoria, simplicidade e entrega.

Fale sobre o curso e a formação de um médico. O curso parece longo, são seis anos para a formação médica. No entanto, são tantos os temas a abordar que deixa a sensação de passar muito rápido. Me formei na UFMG, sendo que já houve mudanças no currículo e estruturação do curso. Primeiro, acontecia um ciclo básico com duração de dois anos, em que as disciplinas eram predominantemente teóricas e eram realizadas no campus Pampulha da Universidade. Nessa etapa, tínhamos matérias mais gerais e basais básicas, como bioquímica, fisiologia, biofísica, aulas em laboratório, citologia, parasitologia e outras. Nesse período não havia contato com pacientes e o mais próximo da medicina que chegávamos era nas aulas de anatomia humana. Essa fase, apesar de muito importante, costumava ser exaustiva e algo decepcionante devido à ansiedade pelo contato com o paciente. Então, no terceiro ano, o curso era direcionado para o campus Saúde, quando éramos introduzidos nas matérias práticas. A partir desse momento, podíamos finalmente atender. Frequentávamos ambulatórios de clínica médica, pediatria, algumas especialidades e praticávamos em estágios de sutura ou cirurgia ambulatorial. No final do curso, as disciplinas tornavam-se ainda mais práticas e hospitalares através dos internatos, que significavam três meses de imersão em áreas como cirurgia geral, clínica médica, pediatria. Temos contato ao longo do curso, mesmo que muitas vezes breve, com as diversas áreas da medicina.

Hoje, na UFMG, o currículo foi remodelado de modo que o aluno possa estar mais próximo da realidade da saúde e do paciente desde os primeiros períodos. Assim também acontece em diversas outras faculdades, onde o aluno tem contato direto com a população para conhecer melhor as pessoas dentro do contexto de saúde ou da doença, como também a sociedade na qual seus pacientes estarão inseridos. Acredito que isso refletirá em profissionais mais capacitados para exercer a medicina preventiva, tão importante para invertemos a lógica atual, na qual o médico atua apenas no tratamento de moléstias já estabelecidas.

O médico hoje se forma generalista e, a partir da sua graduação, já pode exercer a profissão após se cadastrar no Conselho Regional de Medicina (CRM) da sua região.

Quais foram os principais desafios que você encontrou durante o curso? Manter-me em dia com os estudos. São muitas as matérias e a carga horária é pesada, então organizar o tempo para estudar, frequentar projetos extracurriculares como iniciação científica, monitoria e estágios e ainda manter a vida social fica complicado. Isso gerava algum desconforto pela sensação de que sempre poderia ter estudado um pouco mais isso ou aquilo.

Outro desafio é a insegurança que surge quando o curso está prestes a terminar. Pensar que em pouco tempo estaremos “soltos” no mercado de trabalho, tomando nossas próprias condutas e assumindo as grandes responsabilidades que isso acarreta é um pouco difícil. Somos lembrados o tempo todo o quanto na nossa profissão é tudo uma questão de “vida ou morte”. Quem nunca ouviu que o “médico não pode errar”? Então a responsabilidade é bem grande e até compreendermos que não é bem assim, demora. Devemos buscar oferecer o nosso melhor sempre, mas também precisamos reconhecer nossos limites como seres-humanos e que dessa forma somos, sim, passíveis de erros.

Como é a profissão? Em quais setores o médico pode atuar? Hoje, pode-se atuar em especialidades clínicas gerais, como pediatria ou clínica médica e trabalhar em consultórios ou em plantões hospitalares. Existem áreas ambulatoriais, como dermatologia, oftalmologia, cardiologia, pneumologia, psiquiatria, sendo que dentro delas existem, também, caminhos para a realização de pequenos procedimentos. Existe espaço para o profissional que prefere atuar sem contato direto com o paciente, como na patologia ou radiologia. Existe um leque de opções bem abrangente para o médico atuar atualmente, por exemplo: serviços de gestão de saúde, gerências clínicas de hospitais, realização de perícias, na docência, em pesquisas, em serviços de resgate de urgência, servindo instituições, como o exército, marinha ou aeronáutica etc.

Como foi o início do seu trabalho como médica (desafios, cobranças, primeiro emprego...)? Decidi ir trabalhar na minha cidade natal, Resende Costa, então eu precisei me colocar diante de pacientes que eu conhecia, pessoas que em algum momento passaram pela minha vida. Assim, separar o emocional do prático foi um dos grandes desafios e acho que, pela mesma razão, a cobrança era muito maior, pois ela era direta, acontecia no dia a dia ao cruzar com a pessoa na rua e ficar pensando: nossa, será que ela melhorou? Será que minha conduta foi suficiente? Penso que trabalhar no Hospital Nossa Senhora do Rosário foi uma decisão muito acertada. A equipe é muito competente e me recebeu de braços abertos, sem medir esforços para que realizássemos juntos um bom trabalho. Respeitando minhas inseguranças e, muitas vezes, até mesmo me encorajando. Além disso, ainda pude contar com dois profissionais incríveis - doutor Paulo e meu pai, doutor Luiz - que foram como mestres me guiando, estendendo a mão nos momentos necessários e ensinando diariamente a rotina de uma especialidade, vou chamar aqui de “clínico do interior”, que está em extinção. Hoje, não se formam médicos capazes de atuar tão belamente dentro do consultório, do pronto atendimento, do bloco cirúrgico e obstétrico como eles. O que posso dizer do meu primeiro emprego é isso, foi uma honra, um presente.

Atualmente, o mercado de trabalho é favorável ao médico? Sim, mesmo com todas as dificuldades do sistema de saúde, existe espaço para todo mundo. Sabemos que somos uma classe mal distribuída territorialmente e isso às vezes pode acarretar em alguma dificuldade na inserção no mercado de trabalho. No entanto, nas áreas mais distantes, nos locais de maior risco social ainda temos uma grande parcela da população sem assistência médica.

O que você diria a alguém que pretende cursar Medicina? Se essa vontade é genuína não pense duas vezes! Mesmo com a correria, os plantões longos, a grande demanda de estudo, a Medicina é muito gratificante. Quando estamos diante de um paciente e conseguimos ajudá-lo de alguma forma e podemos ver a gratidão em seus olhos é reconfortante.

Importante falar aqui que nem tudo são flores na Medicina, os médicos são cobrados cada vez mais, processos de causas médicas acontecem o tempo todo. O errar é cada vez mais crucificado e divulgado pela população. Vivemos tempos de condutas e diagnósticos cada vez mais contestados por pacientes que chegam ao consultório após passar por uma “primeira consulta com o doutor Google”, onde existem milhares de informações, que, sem a seleção adequada, acrescentam apenas mais dúvidas e medos.

Quais são os maiores desafios e responsabilidades do médico? Manter-se atualizado ao longo da carreira, diante da acelerada produção de pesquisas médicas. Nunca se acomodar. A maior responsabilidade é saber agir com ética e honestidade para com seu paciente e seus familiares.

A Medicina é um dos cursos mais procurados pelos jovens que iniciarão a faculdade. Por que isso acontece, em sua opinião? Acho que a principal razão seja pelo fato de ser uma profissão com tantos caminhos possíveis e pela idealização da possibilidade de “cuidar das pessoas”. É interessante o que observo entre meus colegas que, muitas vezes, a motivação é por questão familiar: após perder algum ente querido por alguma doença, na vontade de não permitir que isso se repita em outros lares; pessoas com familiares com doenças crônicas; até mesmo pessoas que passaram por dificuldades em acessar o sistema de saúde, buscando melhores condições para seus iguais. E é claro que conta muito a idealização de um status social e bons salários que a profissão ainda permite, mesmo que mais desmistificado hoje em dia.

O fator financeiro é um atrativo para os estudantes que procuram o curso. Você acredita que pensar por esse lado é um erro? Não considero um erro, mas também não se trata de uma verdade absoluta. Hoje, em busca de salários bons, o médico precisa acumular cargos, contratos e horas de serviço. Claro que ao formar é um curso que oferece um bom salário de partida, no entanto, a carreira na medicina é cada vez mais difícil.

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