Mirante das Lajes: um lugar para contemplação

A promessa de revitalização do principal cartão-postal da cidade ainda não se realizou


André Eustáquio e Emanuelle Ribeiro


Mirante das Lajes de Cima necessita de revitalização. Iluminação precária, acúmulo de lixo e mato são os principais problemas (Fotos André Eustáquio)

O Arraial de Nossa Senhora da Penha de França da Lage, hoje Resende Costa, foi erguido, no final da primeira metade do século XVIII, sobre um escarpado rochedo que desponta na praça Nossa Senhora de Fátima (Mirante da Lajes de Cima), nas Lajes de Baixo (próximo ao quartel da PM) e na antiga Laje da Cadeia (Fórum da Comarca). A história é testemunha da importância deste rochedo para a vida e a cultura dos resende-costenses.

As lajes não são somente os alicerces de Resende Costa. A beleza e o aconchego do lugar atraem, desde os primórdios da cidade, pessoas que transformaram o rochedo num bucólico e agradável ponto de lazer e encontro. Nos finais de semana, especialmente nas tardes de domingo, o movimento nas lajes de cima é intenso. As pessoas sentam-se sobre as pedras para conversar, namorar, tirar fotos e contemplar gratuitamente a beleza que se perde infinita num horizonte que a natureza generosamente presenteou os resende-costenses.

Nas últimas décadas, Resende Costa experimentou o desenvolvimento econômico, impulsionado pela produção e comércio de artesanato. O ramo do artesanato alavancou também o turismo. Durante todo o ano milhares de turistas visitam a cidade, atraídos pelas lojas localizadas na Avenida Alfredo Penido. No entanto, o movimento dos visitantes não se restringe somente às lojas. Diariamente, vê-se no Mirante das Lajes veículos com placas de cidades de diversos estados do Brasil. Os turistas se encantam com a paisagem. No final da visita, todos querem levar uma foto como recordação do principal cartão-postal da cidade das lajes.

Para o presidente da Asseturc (Associação Empresarial e Turística de Resende Costa), Cícero Resende Chaves, o potencial turístico das lajes não está sendo bem explorado: “As lajes são pontos altos das nossas atrações turísticas. Considero que a exploração turística do local ainda não é satisfatória. Sua infraestrutura, iluminação e limpeza, mesmo que não seja a dos sonhos, é boa. A famigerada caixa dágua, que ofusca negativamente o local, dificilmente sairá de lá. Acredito que explorar o potencial turístico das lajes passa mais por investimentos em divulgação do que investimentos no local. Esta é, inclusive, uma meta da atual diretoria da Asseturc, que conta com o apoio da administração municipal”.

 

Consequências

O intenso movimento nas lajes de cima traz também consequências negativas. O lugar vem sofrendo há anos com o abandono do poder público e com a depredação causada, na maioria da vezes, pelos próprios moradores da cidade. A reportagem do Jornal das Lajes esteve no local na manhã da segunda-feira, 24 de abril, e verificou o acúmulo de grande quantidade de lixo sobre as pedras e na praça: papel, copos de plástico, garrafas de vidro quebradas etc. Além do lixo, há também o grave problema do esgoto doméstico lançado ininterruptamente abaixo da praça.

Funcionários da Prefeitura Municipal realizam periodicamente a limpeza das lajes. “A gente faz a limpeza duas ou três vezes na semana. Mas o pessoal não ajuda. Tem gente que joga garrafas de plástico no mato abaixo da praça, acumulando água, tornando-se (o local) um potencial lugar para o desenvolvimento do mosquito da Dengue (Aedes Aegypti)”, diz um dos jardineiros da prefeitura responsável pela limpeza semanal. O mato ao qual ele se refere é justamente onde corre o esgoto doméstico. “Tem muito lixo lá”, completa o jardineiro.

Outros problemas são constatados nas lajes de cima. A iluminação é precária, facilitando, inclusive, a utilização do local para consumo de drogas ilícitas. Além disso, alguns condutores de veículos e motos usam e abusam das lajes para aumentar o volume do som automotivo e fazer rachas de moto, conforme o ocorrido na noite do feriado de 21 de abril, sexta-feira.

O empresário Ricardo de Lima Pinto é morador do Mirante das Lajes e revelou ao JL o que vem presenciando nos finais de semana: “Nos finais de semana à noite isso aqui vira um caos. Motos fazendo rachas, som alto nos carros, moleques soltando bombas, uma bagunça generalizada. O que era para ser um lugar de tranquilidade para as famílias de Resende Costa está sendo transformado num ambiente degradado”.

De acordo com Ricardo, outros moradores dos arredores das lajes também já se sentem incomodados. “Você pode conversar com outros moradores que também estão reclamando da bagunça que se tornou as lajes”. Ele chama atenção também para a escassez de iluminação, acúmulo de lixo, esgoto e depredação. “Não adianta termos um lugar bonito, mas que não é bem cuidado. Posso te dizer que infelizmente não está compensando mais morar aqui”.

Cícero Chaves afirma que vale a pena investir: “As lajes, antes mesmo de ganharem estes status de produto turístico, são pra nós, ‘lagartixas’, um local de encontro, de passeio, um refúgio. E mesmo sem estas sonhadas infraestruturas e revitalizações, o sentar na pedra durante um pôr do sol é um charme, uma satisfação. Quanto mais limpo, iluminado, acessível for este local, mais a gente vai frequentar, mais fotos serão publicadas nas redes sociais e mais gente irá conhecer e aproveitar o local”.

Agora, para atrair o turista, que muitas vezes conhece apenas a avenida de entrada da cidade, Cícero cita que, primeiramente, é preciso entender que a criação e a exploração de um produto turístico é complexa: “O número de turistas com tempo e propensos a visitar as lajes é menor que aquele que escolhe a cidade para passar uma manhã de compras e voltar a São João del-Rei ou Tiradentes para outras atividades. Uma atitude eficaz para levar o turista ao cume da cidade é informar e divulgar a existência deste local bonito e marcante. É preciso instigar a curiosidade de conhecer um lugar diferente e com raízes históricas”.

 

Revitalização

Nas últimas eleições, a revitalização do principal cartão-postal da cidade foi destaque nas promessas de quase todos os candidatos a prefeito de Resende Costa. Mas até agora foram poucas intervenções. Quase insignificantes.

O arquiteto resende-costense, Eduardo Henrique (leia entrevista no Jogo Aberto), apresentou sua monografia (“Lajes, centralidade e apropriação pública do espaço urbano – Resende Costa/MG”) de conclusão de curso sobre a revitalização do Mirante das Lajes. Um estudo completo sobre o local que, se tivesse sido implementado há doze anos, teria mudado inclusive a forma com que a população se relaciona com o espaço público. “O projeto foi feito visando à população de Resende Costa. A nossa concepção é de que o espaço urbano tem que ser voltado para a população local. O turismo é consequência”.

O projeto desenvolvido pelo arquiteto destaca as lajes como “um lugar de contemplação”. “Procurei limpar o local de tudo que pudesse atrapalhar a visão. Portanto, retirei o máximo possível de edificações altas”. No projeto original, o arquiteto previu a construção de um amplo espaço multiuso, abrangendo a área onde foi construída a sede da Biblioteca Municipal. “O projeto possibilita uma visão de quase 180 graus do mirante, além de oferecer espaço multiuso para shows, feiras e outras atividades”, explica Eduardo.

 

Poder Público

O prefeito municipal Aurélio Suenes, em seu segundo mandato, afirma que a revitalização das lajes continua sendo uma das metas da administração: “No mandato passado foi feito um projeto desenvolvido por uma arquiteta da AMVER (Associação dos Municípios da Microrregião dos Campos das Vertentes), mas, infelizmente, não tivemos condições de executá-lo. Um dos motivos foi a crise que nos surpreendeu no decorrer do mandato. Além disso, como é de conhecimento geral, nosso município tem carências de infraestrutura, especificamente calçamentos e escoamento de água pluvial. Isso sempre nos faz colocar na balança qual prioridade é maior. Como a pressão e as cobranças da população dos bairros são grandes, o sonho de revitalizar as Lajes está sendo adiado”, explica Aurélio.

O prefeito acredita que a situação é complexa e resultado de falta de planejamento no passado: “Sei que vou ser repetitivo, mas se os loteamentos de Resende Costa tivessem sido aprovados de forma correta no passado, nós teríamos outros níveis de prioridade. Certamente em Resende Costa, teríamos praças mais aconchegantes e modernas, sem contar outras ações que poderíamos fazer para melhorar a vida das pessoas. Para se ter uma ideia do tamanho do problema, somente em 2017 está previsto um investimento de 500 mil reais em calçamentos de ruas. Esse recurso seria mais que suficiente para revitalizar as lajes e outras praças”.

Sobre outros problemas de infraestrutura nas lajes de cima, Aurélio comenta: “Nós investimos em iluminação pública. Colocamos cinco luminárias no final do ano passado. Mas reconheço que ainda há o que melhorar. Sobre a depredação, colocamos uma câmera 360° na esquina da Biblioteca Municipal, monitorada pela Polícia Militar, para evitar esse tipo de ação. Tem muita coisa para fazer na cidade e, todas as vezes que fazemos Audiência Pública por exemplo, a demanda por revitalização das lajes não é citada por ninguém. Apesar disso, pessoalmente eu sei que devemos investir mais no local”.

O presidente da Asseturc, Cícero Chaves, concorda e defende que revitalizar um local imenso como as lajes não é fácil: “Ouvem-se muitas ideias para o local que custariam milhões. Dentro da realidade, acho que ainda não houve esta revitalização mais marcante devido ao entendimento de prioridades da gestão pública. Sabemos que a situação financeira dos municípios brasileiros não é confortável. Então, acho que dificilmente veremos gastos substanciais para revitalização das lajes em curto prazo. O que não impede de iniciarmos este trabalho de divulgação e informação”.

Aurélio destaca que o projeto para as lajes continua de pé e esperando recurso para ser executado: “Entendo a importância de desenvolver um projeto nas lajes para explorar o turismo no local. Continuo com esse propósito e espero poder realizar na medida em que as necessidades básicas da população forem sendo superadas”.                                     

 

A caixa d’água da Copasa

No início da década de 1980, Resende Costa festejou a chegada da Copasa que solucionou o grave problema da falta de água tratada na cidade. O local escolhido pela empresa para a construção do reservatório foi o Mirante das Lajes, por situar-se na parte mais alta da cidade. Não houve, na ocasião, questionamentos tampouco preocupação das autoridades locais com o patrimônio público e natural da cidade. Hoje, o reservatório é a edificação que mais agride e polui visualmente o mirante.

Nos últimos anos, incansáveis tentativas de retirar o reservatório do mirante foram perpetradas junto à Copasa. No final do último mandato do ex-prefeito Gilberto Pinto (PSDB), falecido no final de 2015, o sonho da grande maioria da população de Resende Costa de ver o Mirante das Lajes sem a presença da famigerada caixa d’água quase se tornou realidade. Um projeto de transferência do reservatório para outro ponto das lajes (mais escondido) foi apresentado pela prefeitura e aceito pela Copasa - como também pelo Conselho Municipal de Patrimônio e Cultura e pela Câmara Municipal. Mas infelizmente a obra não foi executada.

Posteriormente, a Copasa manifestou-se contrária à retirada, apresentando um projeto de requalificação do reservatório. O Conselho de Patrimônio não aceitou o projeto entendendo que “agrediria ainda mais a paisagem do mirante”.  “O meu projeto prevê a retirada do reservatório. Seria perfeito (a retirada), pois daria um novo desenho à praça, de acordo com a utilização que se faria dela”, sublinha o arquiteto Eduardo Henrique.

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