Percepções dos resende-costenses sobre a atividade turística


José Venâncio de Resende


Avenida Alfredo Penido, conhecida em Resende Costa como Avenida dos Artesanatos

Para os residentes em cidades pequenas, os impactos socioculturais da atividade turística são mais importantes do que os impactos econômicos, concluiu um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Coimbra (UC) e do Instituto Politécnico de Viseu (IPV). A pesquisa envolveu 350 habitantes de cidades portuguesas.  

O trabalho analisou a relação entre a ligação ao lugar e os impactos percepcionados pelos residentes em cidades pequenas relativamente à atividade turística. E visa contribuir para um melhor planejamento destes destinos com vistas ao pós-pandemia, diz a pesquisadora Cláudia Seabra, da UC. Nessas comunidades, “as pessoas geralmente estão ansiosas para conhecer novas pessoas e se conectar com outras culturas e gerações diferentes”. “Os turistas são vistos como pessoas que trazem oportunidades de negócios, visitando bares, restaurantes, hotéis e atrações da região, ao mesmo tempo que compram produtos locais para levar. Por outro lado, os turistas são fontes de rejuvenescimento cultural.”

Não há pesquisa do gênero para Resende Costa, por isso o JL optou por ouvir algumas lideranças locais. Para o artesão e consultor de cooperativismo Luís Cláudio dos Reis, “mesmo sem perceber, para o resende-costense, os aspectos social e cultural têm maior relevância, impactados pelas atividades turísticas. Qualquer reportagem sobre Resende Costa, mesmo com foco na sua economia, não sai sem mencionar a sua trajetória histórica e tradicional da cultura de um povo, que fez e faz do seu maior legado cultural seu principal produto econômico”.

Também para Luciene Cardoso, empresária do ramo do artesanato e ex-presidente da Asseturc (Associação Empresarial e Turística de Resende Costa), os três aspectos estão interligados. “Um favorece o desenvolvimento do outro. O turista proporciona e favorece uma relação sócio-cultural-econômica de grande relevância para qualquer cidade turística.” Ao que acrescenta Cícero Resende Chaves, sócio-proprietário da Arraial da Lage Hospedaria. “O turista que vem adquirir um produto artesanal busca peças com aspecto cultural e artístico, mas que tenham utilidade prática ou que componham algum tipo de decoração. E, buscando atender melhor este turista em suas vontades/necessidades, estamos constantemente aprimorando e alterando nossas percepções e, consequentemente, nossa cultura e sociedade.”

Além do aspecto econômico, “há parcela da população que considera positiva a intenção de muitos turistas que aqui chegam e procuram saber dos bens culturais do município”, acrescenta Edésio Lara, da Amirco (Associação de Amigos da Cultura de Resende Costa). “Frequentam a biblioteca pública, visitam as igrejas e se deliciam com o mirante das lajes. Consomem produtos alimentícios locais. Querem saber mais das festas religiosas e populares, dos imóveis urbanos e rurais antigos. Os artistas artesãos chamam-lhes a atenção. Interessam-se pelas caminhadas ecológicas, pelos passeios ciclísticos e trilhas com motos, que ajudam a preservar as belezas naturais do município. Há os que estão interessados em conhecer os nossos escritores, em comprar os livros lançados pela Amirco. Ora, se isso acontece, as pessoas do lugar sentem, percebem as reações dos visitantes. Sentindo, verbalizam o que pensam, comentam os fatos acontecidos que estão distantes do simples ato de vender produtos.”

“Os eventos culturais, além de saciar anseios da população local, atraem visitantes. Estes, por sua vez, fomentam o comércio local. E assim se dá o fluxo econômico na cidade”, assinala Emerson Gonzaga, presidente do Instituto Rio Santo Antônio (IRIS). Com a pandemia, sem visitantes, a cidade deixa de ser uma cidade “bem situada” - próxima a Tiradentes e São João del-Rei, grandes centros turísticos e econômicos - e volta a ser a Resende Costa pacata de 30, 40 anos atrás, constata. “É neste momento que percebemos o quão importante é o turismo para nosso município, que, além de visitantes para fomento da economia local, atrai pessoas interessadas em vivenciar nossas experiências culturais.”

 

Pandemia. O aspecto psicológico, para além do impacto negativo sobre a economia, de “momentos extremos” como este é destacado por Cícero Chaves. “Mas, mesmo sob esta carga atual nestes aspectos econômico e psicológico, com certeza os resende-costenses reconhecem a importância dos impactos sociais e culturais trazidos pela atividade turística.”

Resende Costa está-se ressentindo da presença do turista, que “proporciona e favorece uma relação sócio-cultural-econômica de grande relevância para qualquer cidade turística”, admite Luciene Cardoso, da Asseturc. “Sem turista, a cidade está ‘morta’, vazia... Acredito que até desestimula algumas empresas e pessoas a trabalhar, devido a dificuldade de lidar com as inovações.” As ferramentas tecnológicas (WhatsApp, Instagram, Facebook etc.), utilizadas para vender e manter o empreendimento, ao representar “uma relação à distância, não proporcionam a mesma experiência e/ou os mesmos objetivos”. Ou seja: “A presença é insubstituível; o ser humano precisa desse contato humano para sobreviver e se desenvolver  em todos os sentidos”.

Salta à vista a preocupação das pessoas com os impactos econômicos negativos advindos da baixa atividade turística nesse tempo de pandemia, diz Edésio, diretor tesoureiro da Amirco. “A cidade depende desse vai e vem de turistas, e isso é real. Sem vendas, há redução da atividade econômica. Isso é fato e implica na renda familiar de muitos trabalhadores.”

Os mais afetados foram os serviços considerados não essenciais, acrescenta Emerson, do IRIS. “Por ser uma cidade que obtém grande parte de suas receitas advindas do fluxo de visitantes, turistas em busca de produtos artesanais, a pandemia afetou significativamente a visitação.” Vários segmentos tiveram suas ações restringidas, como os movimentos culturais e as festividades, inclusive as religiosas, “enfim, todo o calendário cultural da cidade foi readaptado pela pandemia”. Entre os eventos culturais prejudicados, cita a tradicional Semana Santa, a Mostra de Artesanato e Cultura e o movimento Luau nas Lajes, evento cultural de iniciativa do próprio IRIS. “Sem público e sem eventos, as bandas locais ficaram sem espaço para se apresentarem, assim como os grupos de teatro que também deram uma pausa em suas atividades.”

Luciene, da Asseturc, conclui que os empresários estão se reinventando e enfrentando os desafios para sobreviver à pandemia. Por isso, acredita que, por ser este um “momento passageiro”, “estamos nos preparando para reverter as perdas e colher bons frutos, quando tudo isso passar”. Para Cícero Chaves, ao atender melhor o turista, “estamos constantemente aprimorando e alterando nossas percepções e, consequentemente, nossa cultura e sociedade”.

Para o artesão Luís Cláudio, mesmo sendo o aspecto econômico “a mola propulsora da atividade turística no município, no entanto ele não sobrevive sem a valorização e o desenvolvimento dos aspectos social e cultural. O viés econômico só ganhou força pela ação do desenvolvimento cultural, desencadeado pela transmissão dos saberes das nossas tradições”.

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