Região das Vertentes volta a ser povoada por canário da terra ou “cabeça de fogo”


Cidades

José Venâncio de Resende1

fotoIniciativa de repovoamento de canários na região das Vertentes (Foto Cláudio Márcio Lopes)

“Sempre fui apaixonado por pássaros. E isso tem uma explicação: quando minha mãe casou, seu enxoval era quatro gaiolas com pássaros”. No seu tempo de infância, mais de 40 anos atrás, Paulo Afonso Palumbo convivia com tantos canarinhos que “quando voavam faziam até sombra”.

Com o passar do tempo, começou a diminuir o número de canários – também conhecidos por canário da terra, cabeça de fogo ou chapinha - principalmente porque as pessoas pegavam estes pássaros para prender em gaiola e para vender, recorda o técnico da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ).  Pior ainda, “a gente quando era criança saía para matar passarinho com bodoque, não distinguindo a espécie. Pelo puro prazer de matar, mesmo que não fosse para comer”.  O resultado é que há uns 26 anos, por volta de 1985 a 87, o canarinho tinha desaparecido da região.

Palumbo estava então com cerca de 30 anos de idade. “Aí eu resolvi fazer o repovoamento de canários.” Então, começou a conversar com várias pessoas para formar uma idéia de como fazer reprodução em cativeiro para posterior soltura.

               

Decepções - Palumbo teve muitas decepções. Perdia filhotes porque, por falta de conhecimento, colocava para chocar antes do tempo, quando o canarinho ainda estava “frio”, ou seja, não estava no ponto certo para o acasalamento. Resultado: o casal acabava brigando, acontecia inclusive de um matar o outro. 

Depois de alguns fracassos, Palumbo também descobriu que não podia colocar irmãos para chocar por causa da consanguinidade. Os filhotes nasciam doentes e fracos ou nem procriavam.  “Isso levou a gente a marcar os filhotes de cada casal para não misturar.” Para isso, ele usava capas de fio de luz de várias cores. 

Além disso, por ansiedade, não desgrudava os olhos do ninho para ver se a fêmea havia botado ovo ou se havia nascido algum filhote. Resultado: atrapalhava o processo.

Outro desafio foi acertar a alimentação das aves. Só depois de conversar com muita gente Palumbo acertou o tipo de alimento. Passou a tratar o canarinho com angu, semente de braquiária, banana, maçã, ovo, pão molhado, larvas de tenébrio e de cupim.

Depois da surpresa da cria dos filhotes, surgiram outros problemas: como preparar a soltura; como promover a readaptação deles quando soltos; onde soltar...

 

Repovoamento - Palumbo iniciou a fase de conversas com sitiantes, chacareiros e fazendeiros, e o caminho natural foi apelar para amigos. “Fui muito bem recebido, eles me ajudaram muito. Sem eles, não tinha como funcionar.” Por volta de 1990, Palumbo conseguia tirar 40 a 60 filhotes que eram entregue aos amigos.  “Eu mesmo cheguei a soltar muitos filhotes em São João del-Rei (na cidade e no distrito do Rio das Mortes), em São Tiago, Morro do Ferro, Santana do Garambéu, Cajuru...”

Palumbo entregava aos amigos um ou dois casais de filhotes. “Eu combinava com eles para deixar presos por um certo tempo, até acostumarem com a paisagem.” Passados um mês ou 40 dias, no final da tarde, apenas um filhote era solto. A tendência dele era passar a noite numa árvore por perto. Cinco a dez dias depois, soltava-se outro filhote. E assim sucessivamente.  Palumbo recomendava aos amigos que tivessem o cuidado de não deixar pessoas estranhas se aproximarem dos filhotes

Depois dos filhotes soltos, deixava-se a gaiola aberta e comida disponível em seu interior. Nessa fase de adaptação à natureza, a alimentação passou a ser basicamente fubazão misturado com ração para codorna poedeira (uma forma de aumentar a quantidade de ovos). Quando esses canários começaram a procriar, a média era de 10 filhotes por casal por temporada. “Como o canário é territorialista, ele toca os filhotes para outra região. Isso vai promovendo a mistura que permite a constante reprodução sem o problema da consangüinidade”.

 

Legislação - Com a nova legislação ambiental, Palumbo tentou legalizar o trabalho. “Cheguei a conversar com o pessoal do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). A maior dificuldade que eu tive era na hora da soltura e em caso de algum filhote morrer”.

Palumbo não possuía documentação dos canários porque o trabalho era informal. “O IBAMA exige pagar uma anuidade e estar filiado a uma associação e, quando existe o processo de reprodução, é preciso adquirir anilha do IBAMA (que contém registro ou identidade da ave). Mas, no meu caso, como era só soltura, a legislação não prevê isso. O meu objetivo nunca foi o comércio, era repovoamento e soltura”.

Quando a fiscalização começou a apertar o cerco, Palumbo desistiu da criação em cativeiro. “Eu comecei a criar na minha roça. Como a burocracia para legalizar é muito grande, resolvi comprar um sítio e criar eles todos soltos”. O problema está na soltura, pois a ave tem de estar identificada e alguém ser responsável por ela. “Como eu vou ser responsável por um pássaro que está solto? Aí eu percebi que ia arrumar confusão pra mim”.

Felizmente, quando veio a nova legislação, a maior parte do trabalho já estava concluída. “A satisfação é muito grande quando a gente anda em São João del-Rei e nas cidades vizinhas e vê que estão entupidas de canário. Mas estão faltando o tico-tico e o azulão”.

Comentários

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    Gostaria de fazer um trabalho assim, num bairro aqui de Santos, SP. para isso pergunto se há alguma literatura sobre o assunto ainda que informal?


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