Tradicional Universidade de Coimbra encerra ano letivo com 2400 estudantes brasileiros


Educação

José Venâncio de Resende0

Vice-reitor Joaquim Carvalho e Pedro Casalero, conservador das coleções científicas.

A Universidade de Coimbra (UC), em Portugal, tem sido chamada de “maior universidade brasileira fora do Brasil”. E não é para menos: no ano letivo de 2017/2018, recebeu cerca de 2400 estudantes brasileiros (na sua maioria em Direito, mas também em Letras, Engenharia etc.), um aumento de 36% em quatro anos, diz o vice-reitor da UC Joaquim Ramos de Carvalho.

Joaquim Carvalho está bastante otimista em relação ao próximo ano letivo que começa em setembro (2018/2019), principalmente porque a UC vai estrear a cátedra de Jurisprudência Brasileira, com o patrocínio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que vai indicar o professor. A ideia é permitir aos alunos conhecer como funciona o sistema jurídico brasileiro. “A perspectiva é muito boa e esse número (de alunos) deve aumentar.”

Desde a época em que o Brasil era colônia, brasileiros procuram a UC para estudar. Data de 1556 o registro do primeiro estudante brasileiro em Coimbra, com o nome de Manuel Paiva Cabral. O inconfidente José de Resende Costa queria enviar seu filho, de mesmo nome, para Coimbra, intenção esta que acabou sendo abortada com descoberta da conspiração mineira do século 18 liderada por Tiradentes.

Segundo o vice-reitor da UC, no início os cursos restringiam-se a direito civil e direito religioso, com foco na formação de administradores para o Estado e a Igreja. Com a chegada do Marquês de Pombal ao poder em 1750 no reinado de D. José I, foi nomeado reitor da UC o bispo brasileiro Francisco Lemos.

Pombal e Lemos foi os responsáveis pela modernização da UC, que passou a se preocupar com a formação de técnicos e cientistas, mas sem perder a perspectiva da gestão colonial. O bispo Francisco Lemos foi reitor da UC por dois períodos (1770-79 e 1799-1821), totalizando cerca de 30 anos. O intervalo entre suas duas administrações coincide com o período em que Pombal perdeu o poder, queda esta que se estendeu aos seus amigos, inclusive Lemos, conta Joaquim Carvalho.

A partir da reforma da UC, uma geração importante de brasileiros passou pela universidade. Entre eles, destaca-se o patriarca da independência, o paulista José Bonifácio de Andrada e Silva, que não apenas estudou leis, matemática e filosofia natural (concluiu o curso em 1788) como também foi professor e responsável pela criação da cadeira de metalurgia da universidade (período de 1801 a 1819). 

Outro estudante da UC foi o baiano Alexandre Rodrigues Ferreira, que estou leis, filosofia natural e matemática na UC, obtendo o título de doutor em 1779. Liderou uma extensa expedição à Amazônia, entre 1783 e 1792, e escreveu a obra “Viagem Filosófica à Amazônia”, na qual descreve a agricultura, a fauna, a flora e os habitantes locais. O naturalista levou com ele ilustradores que fizeram muitas imagens das populações indígenas e das paisagens amazônicas.

Durante a invasão a Portugal, o exército de Napoleão levou para Paris parte do acervo, constituído de máscaras e artefatos indígenas e coleções da fauna e da flora amazônicas. Segundo o vice-reitor Joaquim Carvalho, recentemente foi descoberta nas dependências da UC uma valiosa coleção de peixes da Amazônia, da época da expedição liderada por Alexandre Ferreira.

Outro nome conhecido é o do poeta e jornalista maranhense Antônio Gonçalves Dias que ingressou na Faculdade de Direito da UC em 1840. Durante o curso, escreveu Canção do Exílio – inspirada na saudade da pátria - e parte dos poemas “Primeiros Cantos” e “Segundos Cantos”, entre outras obras literárias.

Fluxo crescente

O fluxo de estudantes brasileiros na UC vem crescendo de maneira progressiva, de acordo com o vice-reitor. Um pico foi verificado em 2012 com os programas Ciências Sem Fronteira e de Licenciaturas Internacionais (Capes). Dos 1500 bolsistas do Ciências Sem Fronteira, em Portugal, cera de 360 foram para a UC. Acrescem-se cerca de 100 bolsistas da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) do Ministério da Educação.

Segundo o vice-reitor da UC, os dois programas do governo brasileiro aconteceram numa fase de crise econômica aguda em Portugal, com empresas em dificuldades e o mercado pessimista. Esta retração afetou a procura por estudantes portugueses, sobretudo na área de engenharia civil. Assim, os estudantes brasileiros ocuparam este espaço ocioso na Universidade.

Novo pico ocorreu a partir de 2014, quando a lei portuguesa foi alterada e permitiu o ingresso de estudantes com resultado do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). Com isso, os estudantes brasileiros podem permanecer por três a cinco anos na UC, dependendo do curso escolhido. Antes, predominavam os alunos de intercâmbio (um ano) e pós-graduação (mestrado e doutorado).

De acordo com Joaquim Carvalho, um fator de entrave ao aumento no ingresso de estudantes brasileiros é a legislação portuguesa que limita a entrada a apenas 20 estrangeiros para cada 100 estudantes nacionais. Entre os países de língua portuguesa, a grande procura é por parte do Brasil mas o interesse de estudantes moçambicanos está a crescer. Entre os países de outras línguas, o que prevalece é o intercâmbio, com a maior procura por parte dos chineses.

Atualmente, são 4800 estudantes de 104 países, dos quais metade em cursos de graduação e pós-graduação (mestrado, doutorado, pós-doutorado), um terço em cursos de intercâmbio e os demais são estudantes de cursos de curta duração como MBAs.

Descoberta

Joaquim Carvalho destaca ainda a presença, entre os alunos, de professores e investigadores (pesquisadores) brasileiros, portadores de bolsas de pós-graduação, principalmente na área de ciências sociais, que vem acompanhados de suas famílias. “Uma das coisas mais interessantes que acontecem aqui é que os alunos fazem amigos (originários) de todo o Brasil. Aqui, toda a gente frequenta os mesmos lugares, toda a gente se encontra. Muitos dizem que aqui conhecem o Brasil.”

LINK RELACIONADO:

Brasileiros na Universidade de Coimbra - http://www.uc.pt/brasil

 

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