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Homens públicos e pivetes

15 de Maio de 2018, por João Bosco Teixeira

Contou-me um amigo que certo cidadão, visitando uma biblioteca que, em tempos idos, havia frequentado e que, no momento, estava um tanto abandonada, retirou de lá um ou dois livros que lhe interessavam. O amigo, por julgar o fato um tanto suspeito, indagou de mim “o que você acha disso?”.

Tentando lhe dar uma resposta, falei-lhe de meus tempos em Belo Horizonte quando via e conhecia pivetes nas ruas que, sem a menor sem-cerimônia, cometiam pequenos assaltos. Destituídos de qualquer sentimento de culpa, pensavam estar em seus legítimos direitos. Muitos não tinham onde dormir, desconheciam relações familiares, escapuliam das escolas, onde eram discriminados e que não lhes favoreciam relações respeitosas, capazes de ajudar na formação de um caráter oportuno para a vida em sociedade.

Falei mais com meu amigo. Desta vez, no entanto, com uma indagação:  você acha que nossos homens públicos ao se permitirem apossar-se do dinheiro comum, receber propinas, sentem algum mal-estar? E, se católicos, vão por acaso se confessar e restituir o que “roubaram”?  Na minha opinião, não. Nem se sentem mal, nem se confessam. Julgam estar em pleno direito de fazer o que fazem, com a desculpa de que gastaram muito para se eleger e para chegar onde chegaram; administram fortunas e parece-lhes que os salários não são suficientes dada a “importância” das vidas que levam.

Penso realmente assim dos pivetes e dos homens públicos que cometem tais crimes. A única diferença entre as duas categorias fica no montante que é surrupiado. E o mesmo penso do cidadão que retirou livro da biblioteca. Nada de escrúpulos.

O amigo que solicitara minha opinião disse apenas: que tempos, que costumes!

A Lava Jato anda já em seu terceiro ou quarto ano. Há gente que ainda se comporta como se nada estivesse acontecendo. Para tal gente o cargo que ocupa, o poder de que está imbuída garante-lhe impunidade e a certeza de que os crimes que comete não passam de direito que possui.

Aquele ideal ético, imperativo categórico, apregoado pelo grande filósofo Kant, que em palavras simples se expressa com “o dever é o bem”, pivetes e políticos desconhecem. Estes pelo desprezo que nutrem para com uma vida que servisse de modelo para outros. Aqueles, pela simples ignorância. Para ambos, o tal ideal ético nem é imperativo, e tão pouco categórico. 

Tudo isso leva Wilson Campos a desabafar, em O Tempo, ao dizer: Causa engulhos e revolta o desplante dos sem-caráter que, de forma acintosa, praticam os mais ignóbeis atos de canalhice.... Causa tristeza assistir a tudo isso e não poder deletar da vida pública os autores das ilicitudes, colocar na cadeia os ladrões de vidas e banir da sociedade os destruidores de sonhos”.  Quem dera fosse isso apenas “literatura”. É mais. E não é ficção.

Retirar livro de biblioteca. Perpetrar ligeiros assaltos. Desviar dinheiro público de sua finalidade para uso próprio são nomes diferentes para crimes semelhantes.

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