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Fábrica de sucessos

26 de Junho de 2024, por Renato Ruas Pinto

Música é uma coisa que sempre me marcou muito. Sempre que ouço determinadas músicas, gostando ou não delas, imediatamente vêm à memória certos momentos porque eu estava ouvindo muito aquela canção na época ou porque ela estava na moda e tocava à exaustão no rádio, televisão ou festas. Por exemplo, eu não sou fã do Black Eyed Peas, mas os tenho ligados a dois momentos bacanas da minha vida por conta de suas músicas. A primeira é “Dont Phunk With My Heart”, que a banda emplacou nas paradas mundiais em 2005, exatamente nas semanas da minha primeira viagem à Europa. A segunda é “Big Girls Don’t Cry”, da carreira solo de Fergie, vocalista do grupo, e grande sucesso nos dias de outra viagem inesquecível, quando percorri o Caminho dos Diamantes, em 2007. É ouvir qualquer uma delas para reviver as viagens e seus bons momentos.

Esse pequeno exemplo mostra como um grande sucesso, ou hit, pode fazer parte de nossas vidas e de nossas memórias afetivas. Entretanto, emplacar nas paradas nunca foi tarefa simples no rádio e na TV ou nos tempos atuais do streaming. Mesmo sabendo que existem mecanismos nefastos, como o “jabá”, que consiste em pagar para rádios e disc-jóqueis promoverem as músicas artificialmente, levar uma canção para o topo da lista de execuções e gravá-las nas cabeças das pessoas demandam bem mais que dinheiro. Assim, não são muitos os artistas que conseguiram, ao longo da carreira, emplacar algum grande sucesso.

Entretanto, há alguns que parecem ter descoberto alguma fórmula mágica e se tornaram presença constante na música que chega até nós. E é justamente uma dupla de compositores que dominou as paradas no Brasil por vários anos que foi escolhida para ser o tema de um ótimo documentário disponível no Globoplay: Michael Sullivan e Paulo Massadas. O documentário “Retratos e Canções” mostra os caminhos que levaram a dupla a se tornar uma potência da indústria fonográfica nacional e a quem grandes artistas recorriam quando precisavam de um sucesso comercial. Fazendo uma retrospectiva desde o início da carreira de cada músico, passando pelo encontro e primeiras composições e indo até o final da parceria em 1994, a série surpreende com a quantidade enorme de hits que a dupla compôs. Eu reconheci as músicas mostradas e me lembrava dos artistas associados a elas, mas algumas eu não fazia ideia de que saíram dos cadernos e violões de Sullivan e Massadas.

Dirigido pelo notório jornalista e escritor André Barcinski, o documentário promoveu o reencontro dos parceiros, que não se viam há quase 30 anos. E destacou muito bem pontos interessantes, como o ritmo frenético de trabalho da dupla. Em dezesseis anos de trabalho saíram cerca de 700 músicas para artistas tão diversos em estilo, como Tim Maia, Gal Costa, Roberto Carlos ou Roupa Nova. Ou para projetos de música infantil do Trem da Alegria e da joia da coroa da dupla em termos de vendagem: a Xuxa. Além disso, a série traz uma reflexão importante sobre a falta de reconhecimento dos compositores, que sempre foram tachados de bregas ou comerciais pela crítica especializada ou seus pares. Esse tema pode render outro texto, mas é interessante ver que o trabalho de compositores profissionais do passado está começando a ter o devido reconhecimento, e o caso de Sullivan e Massadas encontra paralelos até com duplas internacionais notórias, como Carole King e Gerry Goffer ou Jerry Leiber e Mike Stoller. De comentário negativo, senti falta na série de saber o que aconteceu com cada um após a dupla se desfazer, em 1994. Além disso, o último episódio, composto só de interpretações um tanto quanto sem sal de músicas da dupla, é quase desnecessário.

A série de cinco capítulos vai mexer com memórias afetivas de muita gente ao escutar canções como “Dia de Domingo”, “Whisky a Go Go”, “Deslizes” ou “Talismã”. E vai surpreender quem não conhecia a extensão do que foi o trabalho de Sullivan e Massadas. É diversão garantida e uma aula sobre um capítulo interessante da música brasileira.

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