Criadora do Real Tapete une técnica e terapia no aprendizado


José Venâncio de Resende


Tapetes de Rosely em exposição do Centro de Apoio ao Turista (CAT)

Rosely Antunes Pires, 60 anos, natural de Desterro de Entre Rios e cidadã honorária de Resende Costa (desde 2023), Química pelo CEFET-MG, artesã de profissão, é a criadora do Real Tapete. Atualmente, ela trabalha enquanto cuida da netinha de 7 meses, “aproveitando cada momento da vida dela”. Assim, pratica um pouco do que ensina a outras mulheres: “É gratificante, você pode fazer esse trabalho em casa vendo televisão e cuidando dos filhos, na companhia de alguém no hospital, na casa de um parente na roça ou na praça pública”.

Rosely trabalhou cerca de 15 anos com retroescavadeira na empresa do pai em Belo Horizonte, antes de aderir ao artesanato. Por volta de 2005, a depressão de um filho mudou a vida dela: “O artesanato permitia que eu ficasse 24 horas em casa para cuidar dele porque houve uma tentativa de suicídio”.

Ao filiar-se à associação “Mãos de Minas” (http://www.maosdeminas.org.br/), Rosely passou a participar de feiras anuais no Minas Centro, em BH, expondo trabalhos variados, feitos com madeira, tecido, velas, bambu, massa de biscuit etc. Fora dos eventos, vendia em casa seus produtos, frutos do artesanato livre (chaveiro corujinha, móbile, enfeites de feltro para berço etc.). 

Outro problema de saúde levou a uma nova mudança na vida de Rosely. Desta vez, foi sua mãe Gizelia Pires Silva, que morava em Resende Costa e adoeceu vítima de demência. “Eu me mudei para Resende Costa para ajudar a cuidar de mamãe. Ela faleceu em 2014 e eu continuei em Resende Costa, pois me encantei com a cidade e o artesanato está aqui.”

 

Aprendizado

Então, Rosely decidiu passar do artesanato livre para o tear, só que “o tear não queria conversar comigo porque sou pequena, ele judiava da coluna”, entre outras coisas. Mas foi assim que ela conheceu o retalho; “e então eu pensei: ´Posso fazer outra coisa com essa matéria-prima´”.

Foi assim que Rosely resolveu fazer os desenhos do Arraiolo com a malha existente na cidade. “Foi um ano de testes: tipos de tela para tecer, tipos de malha, largura das malhas... até conseguir um padrão.” Ela descobriu, por exemplo, que o retalho tem de ser picado na largura de 7/8 milímetros, dependendo da espessura. “Eu percebi que a técnica do Arraiolo não se adequava totalmente ao Real Tapete”.

 

Como identificar?

A primeira diferença é que o Real Tapete é de retalho, e não de lã. “Visualmente, ele lembra o Arraiolo, mas, quando a gente explica, a pessoa vê que o Real Tapete é de retalho.” Além disso, “as cores do Real Tapete ficam mais vivas porque o retalho é mais colorido - eu faço o teste para ver se o retalho desbota (controle de qualidade)”. A diferença básica, conta Rosely, é que o Real Tapete não necessita ser engomado. Outras diferenças importantes são que a franja do Real Tapete são no próprio tapete; e ele adere melhor ao chão por ser mais pesado.

Fazer o Real Tapete é mais trabalhoso “porque tem que cortar o retalho com a mesma espessura, do início ao fim (para não dar diferença no bordado”), acrescenta Rosely. “O Real Tapete tem que ser tecido todo no mesmo sentido (inclusive as bordas) para não deformar, pois a malha é muito encorpada (diferente da lã).

Detalhe importante: Rosely cria os próprios desenhos num programa de computador. “E as possibilidades de desenho são infinitas.”

 

Terapia

Além de gerar renda, a confecção do Real Tapete é um processo terapêutico, revela Rosely. Ao criar a primeira turma, denominada “Formigueiro Real”, para ensinar a técnica do Real Tapete, ela se mirou em mulheres em casa, “porque eu tenho uma preocupação muito grande com as mulheres, essa é uma das minhas bandeiras”.  Tal preocupação está relacionada principalmente com a depressão, seja por violência doméstica, seja por violência psicológica, que é invisível.

As aulas aconteciam nas Lajes ou em praças públicas, e “combinávamos quem ia levar o café e o bolo; tínhamos assim o nosso momento recreio, que era o momento no qual acontecia sutilmente o acolhimento”. Das 10 “meninas” que começaram o curso, sete continuaram e, destas, cinco já estão cadastradas no Selo de Procedência. Esse grupo se tornou o encontro terapêutico “Tecendo Histórias” e continua até hoje, com cerca de 20 mulheres aprendendo bordado livre.

Em junho de 2023, Rosely iniciou duas novas turmas, desta vez atravésda ASARC (Associação dos Artesãos de Resende Costa), como parte do projeto “Artesão Amigo”. Foram cerca de 10 pessoas, a grande maioria de mulheres que ficam em casa cuidando do lar e dos filhos. O curso teve a duração de cinco meses, mas o ideal é que continue por mais cinco meses.

 

Aqui é o meu lugar

Rosely não patenteou a técnica porque Resende Costa conseguiu o Selo de Procedência, no qual o Real Tapete se encaixa perfeitamente. “Eu tenho o Selo de Procedência (artesanato manual) e acabei de adquirir a Carteira Nacional do Artesão”, outra conquista de Resende Costa.

A artesã já recebeu propostas de empresas e entidades para montar oficinas e formar alunas para levar o Real Tapete a outros lugares. “Eu não aceitei porque quero que ele seja de Resende Costa e que ofereça oportunidades a mulheres daqui que não têm uma renda e enfrentam dificuldades financeiras.” Afinal, “As mulheres carregam nos braços, juntamente com os seus filhos, o futuro do planeta”.

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