O que representa Otto Lara Resende na região de suas origens?


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Guilherme Rezende*0

fotoOtto e seu pai Antônio de Lara Resende (foto - arquivo Guilherme Rezende)

Otto Lara Resende completaria 100 anos de nascimento agora em maio. Considerado por Silviano Santiago, “o homem de letras mais completo de sua geração”, pela capacidade de aliar “a limpidez de estilo a um bom humor sob a forma de fina ironia machadiana”, Otto, segundo Antônio Cândido, “tinha um profundo senso da vida, uma cultura sólida, uma inteligência luminosa e o dom da prosa portuguesa”.

A sua grandeza vai além de sua obra. Em um meio como o do jornalismo e das artes, no qual a vaidade muitas vezes transborda além do limite do mais descarado narcisismo, Otto era uma figura irradiante que seduzia todos que se aproximavam dele, dos mais poderosos aos mais humildes, dos mais famosos aos cidadãos anônimos.

Não por acaso, Afonso Arinos dizia que Otto era, antes de tudo, “um grande fazedor de amigos”, tanto pela qualidade de contador de prosa e de inventor de frases extraordinárias, quanto pelo dom de ser uma ponte entre as pessoas, mesmo as que assumiam posições polarizadas.

Jornalista consagrado por sua condição eclética de executar qualquer função, escritor de estilo refinado e obcecado pela forma de expressão precisa, os cenários da obra ficcional que publicou, restrita em razão de uma autocrítica severa, embora não se passem em lugares identificados, reportam-se a localidades do interior mineiro, especialmente São João del-Rei e Resende Costa.

Anos atrás, quando ocupava o cargo de vice-diretor de Assuntos Comunitários da Fundação de Ensino Superior de São João del-Rei, FUNREI, atual UFSJ, leitor diário das maravilhosas crônicas que Otto escrevia para o jornal Folha de S. Paulo, tentamos trazê-lo para uma conferência durante o V Inverno Cultural. Amável e gentil, agradeceu o convite e se desculpou por não poder aceitá-lo em razão de uma viagem ao exterior.

Meses depois, em 28 de dezembro de 1992, fui surpreendido com a terrível notícia de sua morte. Pesaroso, pensei que, se não teria como acolhê-lo presencialmente, ao menos restava-me o conforto de continuar apreciando o seu talento através da leitura de suas obras.

O tempo passou e, em 2001, publiquei um artigo para o Jornal “Gazeta de São João del-Rei”, questionando a indiferença generalizada entre seus conterrâneos de sua importância na história da cultura brasileira. Otto não passava de um ilustre desconhecido em sua terra natal.

Recebi dias depois uma carta de seu irmão mais velho, Gilberto, agradecendo, em nome da família, pelo reconhecimento dos méritos do irmão, falecido quase dez anos atrás. Como ninguém mais reagiu ao meu questionamento, o desconhecimento em relação a Otto tornou-se uma suposição confirmada.

Minha admiração por Otto não se interrompeu aí. Convidado pelo professor José Marques de Melo a participar de um projeto de celebração dos 200 anos da Imprensa no Brasil, ao serem completados em 2008, coube-me a tarefa de elaborar um texto destacando a contribuição de Otto na formação das raízes do jornalismo nacional.

O texto foi publicado primeiro como encarte da Revista Imprensa e, posteriormente, no Volume II da Coleção Imprensa Brasileira-Personagens que Fizeram História, editado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo.

Quatro anos depois, coincidentemente no Inverno Cultural, surgiu a possibilidade de um reencontro com Otto Lara Resende. Coordenei uma programação intensa de seminário sobre sua obra e de homenagens públicas ao, enfim, ilustre conhecido conterrâneo.

Na presença de sua esposa, Helena Pinheiro, filhos, irmãos e palestrantes qualificados, a dimensão e as peculiaridades da escrita de Otto foram sucintamente apresentadas. Pela cidade, espalharam-se faixas com frases geniais que Otto criou. A biblioteca da UFSJ adotou o seu nome e uma placa comemorativa foi descerrada na casa onde nasceu e viveu os primeiros 16 anos, atualmente sede do DAMAE.

O evento teve repercussão nacional, sobretudo no jornal Folha de S. Paulo e na Rede Globo de Televisão. Pareciam estar definitivamente (r)estabelecidas as ligações do escritor, imortal da Academia Brasileira de Letras, com suas origens.

Tantos anos depois dessa enfática homenagem, permanece a indagação: o que Otto Lara Resende representa para São João del-Rei e região? Como as instituições culturais da cidade, área de Letras e jornalismo da UFSJ, Secretaria da Cultura, Academia de Letras se expressam diante do seu centenário de nascimento?

 

*Professor e Jornalista. Doutor em Comunicação. Autor do Perfil “Otto Lara Resende – Visceralmente Conciliador”. In: MARQUES DE MELO, José. Imprensa Brasileira: Personagens que fizeram História. Vol .2. São Paulo: Imprensa oficial; São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2005.

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