As casualidades são como estrelas cadentes. Têm origem desconhecida e enfeitiçam justamente pela sedução do acaso. Ver uma estrela cadente é sentir o privilégio de presenciar algo único; é imaginar-se escolhido para uma visão que se manifesta a poucos e por pouco tempo.
A graça da casualidade está no seu inesperado repente. O acaso não combina com preparações. Se for prevista, a estrela cadente vira estrela decadente.
E foi na graça do acaso que eu te reencontrei. Surpreendidos pela casualidade, ali estávamos. Por ironia do acaso (ou acaso da ironia), compartilhando a mesma mesa.
De frente para mim e ao lado de teu companheiro, conversavas polidamente com todos e comigo.
Discreta e bela.
Entre as muitas palavras trocadas à mesa, nossas frases íntimas – agora silenciadas – lutavam contra a mudez da conveniência, num esforço sutil de se fazerem lembradas.
O cardápio era variado, porém insuficiente para satisfazer um outro jejum, mais fundo, mais escravo da ausência.
O tempo passou, mudou algumas coisas em ti, porém não levou detalhes tão queridos para mim. Permaneceu o mesmo sorriso... o movimento da cabeça ao mexeres no cabelo... ainda os mesmos trejeitos das mãos...
Eras tu!
Acima da história e do discurso.
Poucas palavras trocamos, mas uma semântica secreta sussurrava sentidos codificados somente por nós dois.
Minha pele não abraçou a tua carne, porém nossos dedos se tocaram rápida e incidentalmente. Por acaso.
Não senti de perto o teu hálito, que sempre me trazia a fragrância lúbrica da tua língua. Eu que tanto invadi as tuas narinas com o meu desejo cítrico e prazer campestre...
Houve um momento, um momento só, em que consegui o travamento dos teus olhos na armadilha dos meus. Tu ficaste séria, porém meiga. Tuas pupilas pulsavam.
Na despedida, no meio de tantas pessoas e falas, ainda aconteceu um outro olhar. Teu sorriso conseguiu se esgueirar para um canto discreto de teus lábios.
A estrela cadente seguia a cadência do caso que há no acaso.
E saíste.
Sei que também fui embora contigo de algum modo. Peguei carona no teu aceno e me fiz passageiro de tua memória.