Dizem que os olhos são as janelas da alma. Eles são mais do que isso. Os olhos são as línguas da alma. Intrometem-se no lugar dos outros sentidos, de outros verbos, de outras expressões. Línguas soltas mesmo.
Falamos vendo.
Não sei qual a sua visão sobre isso, mas eu sempre olhei com curiosidade as coisas do olhar sendo vistas com outros sentidos. E olhe que tem muita coisa interessante!
Igual àquela conversa que um dia vi acontecendo. O cara precisava de um favor do amigo:
– Veja isso pra mim. Preciso até amanhã.
– Vou ver se consigo.
Para o primeiro, ver é resolver. Para o segundo, vou ver é vou tentar. Viu só?
Também tem aquela fala da minha vizinha:
– Não concordo com isso. Onde já se viu?
A razão e o perfeccionismo são olhos. A razão é o olhar clínico. O perfeccionismo é o olho de santo.
E quando aparece um cheiro estranho? A gente logo lasca a pergunta:
– Tá vendo o cheiro?
Ouvimos com os olhos também:
– Olha só que música bonita!
Ou:
– Você não viu a gritaria do povo lá fora?
Ou ainda:
– Veja só como ele está rouco!
Lembro-me de mim garoto ainda e minha mãe me repreendendo por causa de alguma coisa errada que fiz:
– Estou gostando de ver!
E eu via as coisas se complicarem para o meu lado...
Quando você compra algo muito caro, é porque custou os olhos da cara.
Se alguma coisa é do conhecimento de todos, então está tudo a olhos vistos.
Ao aconselhar alguém: “Olho vivo, rapaz! Veja bem o que você vai fazer!”
De repente, você aparece com um carro novo, de encher os olhos; ou compra uma casa na qual você estava de olho havia muito tempo. Ou mostra uma coleção rara, que é a menina dos seus olhos. Quem é que aparece? O olho gordo. Sempre tem aquele que cresce o olho.
Até pra ser demitido a gente vai parar no olho da rua.
E a Silvinha com o Fagundes? Ela toda moderna, com uma visão mais aberta. Ele todo conservador, com uma visão mais fechada. Quando viram, já era tarde. Nenhum dos dois via mais sentido na relação.
É por isso que o bebê chora quando nasce. Quando chega aqui fora, ele logo vê uma voz sibilando perto dele, indo e voltando, que nem olho-de-sogra, alertando que ele vai ter que escapar do mau-olhado e ficar de olho em tudo. Ainda por cima, tudo isso vai acabar um dia, quando, no futuro, ele finalmente fechar os olhos. E a voz diz:
– Você vai ver só!
Aí o bebê chora.