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A polêmica da telemedicina

12 de Marco de 2019, por João Magalhães

No final de fevereiro o CFM (Conselho Federal de Medicina) revogou a resolução que promulgara, regulamentando a prática da medicina a distância, via internet, computador, telefone etc. e que provocara grande polêmica. Dentro de seu espírito, que é um estímulo à reflexão ante assuntos controversos e tratando-se de resolução com importantes repercussões sociais, a coluna procurou sintetizar os argumentos pró e contra à telemedicina

Conforme a resolução revogada, a telemedicina seria voluntária para o médico e o paciente deveria consentir por escrito, além de estar acompanhado por um profissional de saúde durante a consulta. A primeira consulta deveria ser presencial, admitindo exceções em áreas de difícil acesso. No caso de atendimento por longo tempo ou de doenças crônicas, o paciente só poderia ficar sem consulta presencial por, no máximo, quatro meses.

A telecirurgia só poderia ser feita em ambientes com infraestrutura adequada e com, no mínimo, dois cirurgiões: um remoto e outro presente no local da cirurgia. Seriam permitidas trocas de informações sobre diagnósticos entre os médicos distantes entre si, o esclarecimento de dúvidas etc. E também a teletriagem, ou seja, que um médico avaliasse os sintomas do paciente, a distância, para depois encaminhá-lo ao especialista necessário. Também seria possível monitorar, remotamente, dados sobre saúde dos pacientes – como no caso daqueles que estivessem internados em casa.

De acordo com o que previa a resolução, imagens e dados deveriam ser gravados e mantidos sob sigilo. As informações, mantidas por 20 anos, e a forma de arquivá-las ficariam sob responsabilidade do médico.

Críticas e temores quanto às consequências dessa resolução emergiram de um princípio básico de uma medicina de qualidade: a relação médico/paciente, ou seja, a personalização.

A telemedicina foi tema predominante, aliás, da terceira “Summit Saúde Brasil”, realizada em São Paulo, em agosto de 2018. Nesse simpósio, acentuou-se muito que o avanço da gestão e das tecnologias no setor passam por trabalhar mais com o paciente e com as comunidades. “Os pacientes não querem ser pacientes, mas pessoas. Não querem ter um plano de saúde, mas saúde”, frisou o dr. Clay Johnston na conferência de abertura.

Inovação, sim; tecnologia, sim. São necessárias.  Mas o dr. Johnston insiste: “Estamos aqui para melhorar a vida das pessoas. Antes de pensar no paciente, temos de pensar para o paciente.” Segundo ele, “a proximidade traz resultados a curto prazo, cria uma zona de conforto e faz com que o indivíduo se sinta ‘abraçado.’”  

A coluna ouviu a opinião dos dois médicos de mais longeva atuação em Resende Costa e cercanias quanto à telemedicina.

Dr. Paulo Cezar Fortuna Dias é favorável, pois, de acordo com ele, facilita o contato com centros avançados para se discutir diagnóstico e tratamento; é importante para a atualização médica, principalmente para quem exerce a profissão no interior; o CFM exige o contato do médico especialista que atende a distância com um profissional junto ao paciente para troca de informações e definição do melhor tratamento; é um avanço fundamental no setor de imagens, uma vez que os exames realizados no interior poderão ser avaliados com emissão de laudos muito mais precisos por um especialista a distância;  dá segurança aos profissionais que trabalham em pequenas comunidades, ao fazerem contato com especialistas em casos complexos para se definir a melhor conduta.

Dr. Luiz Antônio Pinto tem sérias objeções: “Acho que descaracteriza a relação médico/paciente desejada, correta. Esse é o problema maior...” “É a desumanização da medicina. Você tem que estar frente a frente com o paciente, conversar, examinar. Na telemedicina, por exemplo, você não vai perceber as agruras dele, da família. E isso responde por uma grande maioria dos atendimentos que a gente faz hoje. Num consultório de atenção básica, hoje, há um percentual de 50 a 60 por cento que se relaciona a problemas ligados à família, à homofobia e a violências por várias razões. Coisas que na telemedicina você não vai discutir. É tudo mecanizado.”

Ainda segundo Luiz Pinto, “trata-se também de uma questão de mercado de trabalho muito clara. Neste difícil mercado de trabalho, vamos colocar tudo na internet porque facilita. Não vai ter que contratar tanta gente”. O médico alerta também para a venda de tecnologia: “A gente sabe que quem domina a tecnologia são as multinacionais. Vai passar muito dinheiro às multinacionais. Daqui a pouco, até o governo entra nisso. E quem não tem condição de acesso a essa tecnologia? E as prefeituras do interior sem recursos? Elas vão ter um computadorzinho fazendo uma consultinha ordinária”, conclui dr. Luiz.

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