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“Lições de Cigarra” do Evaldo

14 de Outubro de 2021, por João Magalhães

Resende Costa tem sido berço de bons poetas. Teve poetas que versejaram poemas até em latim. Caso do Zé Procópio, que foi meu paraninfo quando de minha ordenação sacerdotal. Seu discurso no salão do grupo escolar Assis Resende foi escrito e pronunciado num latim clássico em odes horacianas. Até hoje tenho a cópia ilustrada que ele me deu.

Caso também do Milled Hannas, que deixou belos poemas em latim, assinados com o nome poético: Theofilus a solitudine (Teófilo (amigo de Deus) da solidão). Era prefeito de Resende Costa quando se comemorou o cinquentenário de criação do município. No programa/convite paras os festejos, Milled saúda a cidade com “Carmen ad dilectissimam urbem Resendecostensem” (hino à diletíssima cidade resende-costense), poetando em latim a modo do “Carmen Saeculare”, de Horácio.

Para ilustrar, uma estrofe com livre tradução minha: “Carmine insignem celebrare festo/ Civitatem nunc decet ore pleno/Rupis aeternae positam perite// Culmine summo!” (Agora, faz-se necessário celebrar de boca cheia, com um festivo canto, a insigne cidade, assentada caprichosamente no supremo cume de uma laje eterna) E outros poetas, como o Abel Lara, Terezinha Hannas e José Antônio Oliveira de Resende etc.

Modernamente é o Evaldo Balbino, nosso colega e amigo aqui neste jornal. Meu vizinho até de página, pois, às vezes, nossas colunas saem no mesmo espaço.

Minha experiência com poemas infanto-juvenis foi longa, uma vez que por 22 anos fui professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira e também de Literatura Infantil no Curso Normal (atualmente Magistério). O quarto ano era de especialização para o pré-primário, com estágio acompanhado por nós professores. Implicava o estudo e a prática da Literatura Infantil.

Meu primeiro contato com o Evaldo poeta foi quando li seu livro de poemas “Moinho”, que acho um dos melhores que já publicou. Evaldo antecipava o que atualmente vem se chamando de “Escrevivências”, ou seja, o autor transforma suas vivências e influências em arte, em textos, pinturas etc.

Senti o Evaldo transpirando, “suando” numa criativa poesia, sua educação, seu ambiente, suas situações vitais, sobretudo lá no povoado do Ribeirão, onde nasceu.  Agora vem seu mais recente lançamento:“Lições de Cigarra”, publicado pela Ed. Helvetia.

Nos muitos anos de ensino de literatura para jovens, sempre insisti com eles que o método de avaliar uma prosa e até uma poesia épica não pode ser o mesmo para a poesia lírica. Se na prosa e na poesia épica você pode comentar as estruturas narrativas, a formação das personagens, a criatividade da trama, o vigor da ambientação, o fluxo da linguagem, na poesia lírica não vejo esta possibilidade.

A avaliação do poema lírico se dá mais pela intuição, pelas agulhadas que ele dá em nossa sensibilidade, pelo clima psicoemocional que cria, pelos versos inusitados, por uma sonoridade rítmica no momento e espaço certos.

Quanto ao poema para crianças – e aproveito para dizer que um poema bom para os pequenos é bom também para os grandes, porque em nós adultos existe uma faixa criança que nunca desaparece – há que se observarem muitas características para ponderá-lo.

Tomo emprestado o conceito de matéria e forma da metafísica aristotélico-tomista para apresentar algumas dessas características. Matéria (ou seja, os temas, os assuntos): animais, brinquedos, brincadeiras, árvores, flores, seres fantásticos, objetos curiosos, partes do corpo, choro, alaridos e tantos outros. No livro do Evaldo: Cigarra, sapo, tanajura, minhoca, saci-pererê, casa, flor, barco e muitos mais.

A forma (isto é, a criatividade na expressão dos temas.): são fundamentais a sonoridade e ritmo, que geram a musicalidade; o drama, que possibilita movimentação, encenação, figurinos; a comicidade, que provoca o riso, a gargalhada, as palmas; a facilidade para decorar (poema orecchiabile, como falam os italianos); a práxis: desenhos, modelagens, colagens; as ilustrações muito necessárias. De preferência, as metonímicas (apresentam só uma parte, a imaginação completa o restante).

E é o momento dos aplausos para a ilustradora Liss Thane. Belíssimas. Amplificam maravilhosamente a significância dos poemas.

Em tudo, o “Lições de cigarra” é opulento. Muito rico. Um primor.  Merece o sucesso que está obtendo.

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