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“Nações em época de desvario”

15 de Outubro de 2019, por João Magalhães

A leitura de um texto de Luiz Felipe D´Avila, com o título acima (O Estado de S. Paulo 29/08/19 A2), motivou-me este diálogo com o leitor.

Desvario: “ato de loucura, delírio, alucinação, desacerto, desatino, extravagância, desvairamento” (Dicionário Aurélio). O desvario costuma trazer consequências funestas para a própria pessoa, família e sociedade. Quando o desvairador tem séquito, tem carisma, tem magnetismo, carrega consigo um perigoso poder social. Quando investido de poder político, então!

Basta folhear algumas páginas da História para alguns exemplos. É o caso de alguns imperadores romanos, como Calígula; de alguns reis, como Jorge III da Inglaterra, interditado pelo Parlamento em 1810; D. Maria I, avó do nosso D. Pedro I, declarada louca em 1792; e de alguns modernos, como Hitler e tantos outros.

Os desvarios têm uma escala de gravidade, desde uma imensa vaidade, o deslumbramento, até a doença mental com delírios, megalomanias, mitomanias etc. O deslumbramento, o narcisismo exibitório de poder, o instinto messiânico, frequentemente, levam ao populismo, quando não ao popularesco. 

A linguagem dos desvarios também é ilimitada. Vai de uma retórica hipnótica, ou gritante, trajes e visual apelativos etc. à criação ou apossamento de inumeráveis símbolos, ora sublimantes, ora satânicos. Recentemente, setores representativos da comunidade judaica brasileira manifestaram preocupação com o crescente uso de símbolos do Judaísmo por alas mais conservadoras dos evangélicos, incluindo o presidente Bolsonaro segurando a bandeira de Israel na “Marcha para Jesus”.

Hodiernamente, como diz D´Avila, “populistas aprenderam a usar as mídias sociais e a imprensa para se conectarem com seus eleitores por meio de uma retórica chocante e de um comportamento vulgar e teatral. Quanto mais suas grosserias são propagadas, maior a sua popularidade entre a tribo que lhe dá voto e apoio. Uma retórica de boçalidade que encanta ogros e deixa estupefatas as pessoas sensatas”.

É inquietante porque o fenômeno do populismo chega agora a um grau quase epidêmico. Basta acompanhar a troca de governos pelo mundo afora. Há uma caminhada cada vez mais numerosa para a ditadura pelo voto. Seu efeito corrosivo desestrutura países, abala a fé nas instituições democráticas, dribla leis. O “messias”, uma vez coroado, raramente deixa o poder pelas vias democráticas. Ou seja, voto livre, gratuito, sem indução e manipulação, irrestrito, sem moralismo, laico etc.

Novamente D´Avila: “Não vamos sucumbir aos males do populismo se tomarmos três providências. Primeiro, manter a sociedade mobilizada em torno das reformas e pressionando o Congresso e o governo para aprová-las. Segundo, contar com o papel responsável do Parlamento e do Judiciário para atuarem como contrapeso e impedirem que a retórica do desvario se torne política pública, ou seja, capaz de criar mecanismos para enfraquecer o papel das instituições democráticas. Terceiro, a imprensa séria deveria focar nos fatos, dados e evidências e ignorar a retórica vazia e sensacionalista para evitar a retroalimentação da narrativa populista. Seguindo esses três mandamentos, atravessaremos o reinado do desvario, incólumes.”

“O jornalismo poderia contribuir para combater o populismo se focasse sua atenção mais nos fatos do que na retórica; se debatesse mais as medidas que estão sendo votadas, aprovadas e implementadas no Parlamento e no governo e ignorasse o discurso populista”, reforça D’Avila.

Há que se criar anticorpos sociais e o antídoto, acho eu, é robustecer a democracia, fortificando as instituições verdadeiramente democráticas, educando permanentemente para a cidadania e mobilizando a sociedade em torno das reformas do Estado.

E, acima de tudo: o Ser Humano! É o que penso. E você?

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