Quem vem acompanhando a situação do Oriente Médio nos últimos tempos, nos países de maioria islâmica, vê constantemente os desentendimentos, até violentos, entre sunitas e xiitas. Afinal, quem e que significam ser sunita ou xiita?
Após a morte de Maomé (570-632, d.C), o supremo profeta de Alá, ou o fundador do Islamismo para os não muçulmanos, aconteceu um cisma religioso entre seus seguidores. Separaram-se pelo desacordo sobre quem deveria suceder Maomé, como califa do Islã. Os sunitas achavam (e acham) que a sucessão cabia a Abu Bakr, pai da mulher de Maomé e amigo pessoal dele. Para os xiitas, o califa deveria ser Ali Ibn Abi Talib, primo e cunhado de Maomé.
Explicando um pouco os nomes: sunita vem de Ahl al Sunnah: o Povo do Caminho”; xiita provém de Shi’at Ali, que significa Partido de Ali e Califa vem de khalifâ: lugar-tenente, sucessor, título de soberano muçulmano. Portanto, califado, termo usado hodiernamente por causa dos territórios conquistados pelo dito Estado Islâmico, é um território governado por um califa.
Hoje, os sunitas são maioria: aproximadamente 87 a 90% da população muçulmana. Os xiitas, em torno de 10 a 13%. São maioria apenas no Irã; 95% da população iraniana é xiita.
Mas demografia não significa controle político. Por exemplo, na Síria, ainda em trágica guerra civil, a maioria é sunita, mas o poder está, há anos, com os Al Assad que são alauítas, uma corrente do islamismo xiita. No Bahrein, a maioria é xiita, mas a liderança é sunita. O Iraque, de maioria xiita, foi governado por anos pelo ditador sunita Saddam Hussein.
Convém observar que esses movimentos não são monolíticos. Entre os xiitas há ramificações com diferentes interpretações quanto à sucessão de Ali. Há um ramo que acredita que houve 12 líderes, chamados imãs, após Maomé. Entre os Sunitas há, também, várias escolas de pensamento, com interpretações diferentes da lei islâmica.
E outros, como o Sufismo, com sua ênfase nos elementos espirituais e místicos da fé, que tem vínculos tanto no sunismo quanto no xiismo e um grupo predominante em Omã, que se sente predecessor das escolas sunita e xiita. E há mais.
Acho importante considerar o comentário de Adam Taylor, jornalista do Washington Post (in Oesp,7/7/15 A10): “O cisma entre os movimentos sunita e xiita começou de modo sangrento, com Ali Ibn Abi Talib assassinado e seu sucessor morto e degolado em batalha. No decorrer dos anos, a minoria xiita às vezes foi perseguida por autoridades sunitas e vice versa. Posteriormente, quando a dinastia Safávida estabeleceu o islamismo xiita como religião de Estado da Pérsia, entrou em conflito com o califado sunita que tinha sua base no império Otomano (Império turco). Mas representar a rivalidade entre os dois grupos como um choque constante é totalmente equivocado. Sunitas e xiitas viveram muito felizes juntos, casando-se entre si e compartilhando locais de oração. E além disso, onde havia confronto entre eles, ocorriam também choques com outras religiões nesses períodos. E como alguns observaram, jamais houve uma guerra entre sunitas e xiitas com a ferocidade da Guerra dos Trinta anos, que envolveu diferentes movimentos cristãos - e que segundo estimativas deixou 8 milhões de mortos. A divisão entre sunita e xiita também diminuiu no início do século 20 com o aumento dos movimentos nacionalistas árabes. O movimento Baath, que chegou a dominar o Iraque e a Síria, mesmo com partidos políticos separados, enfatizava o nacionalismo e o socialismo acima de divisões religiosas”.
Infelizmente não é o que acontece hoje. O mundo muçulmano está dividido em seitas, cujas forças se contrapõem. É o caso da guerra civil na Síria, dos combates no Iêmen, das profundas tensões no Paquistão e no Afeganistão, do emperramento político do Iraque etc.
Os grupos de países liderados pelas grandes potências: Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Rússia, China etc. não são neutros a estas situações sócio-políticas. Pior, não são unidos. Há apoio para sunitas e apoio para xiitas, o que torna muito difícil a solução dos conflitos.
É dentro desses campos rivais que brotam os grupos fanáticos, radicais, fundamentalistas, cada um a seu modo, que adotam o terrorismo como estratégia de luta e apavora, sobretudo nosso mundo ocidental, cujo exemplo mais em evidência é o Estado Islâmico.
Loas e lástimas
*Loas para Janaina Resende e Beatriz Resende pela indicação e comentário que fizeram, respectivamente, na coluna “Vc no JL” sobre “Ensaio sobre a Cegueira” de José Saramago e “Rangers: Ordem dos arqueiros – Ruínas de Gorlan” de John Flanagan.
*Lástimas para a Agência do Banco do Brasil de Resende Costa que no final de semana, sábado e domingo, 27 e 28 de fevereiro, deixou alguns clientes sem dinheiro (inclusive eu). Numa cidade em que muitos estabelecimentos não aceitam cartão, isto não pode acontecer.