Antiga sede da prefeitura: um cartão postal abandonado, no centro histórico de São João del-Rei


Cultura

José Venâncio de Resende0

Um prédio abandonado (foto: José Antônio Ávila)

Desde Outubro do ano passado, a sede da prefeitura municipal está instalada, de maneira improvisada, no sobrado que pertenceu a Ernesto Pereira da Silva - Barão de São João del-Rei, número 174 da praça Frei Orlando, próximo à igreja de São Francisco. Durante muitos anos, até o início de 2010, o local abrigou a sede da Superitendência Regional de Ensino.

Na época da mudança, a administração Helvécio Reis alegou, por intermédio da assessoria de comunicação da prefeitura, que o antigo prédio necessitaria de restauração (reparos no telhado) devido a infiltrações provocadas por chuvas. Inclusive, disse que já existiam recursos previstos para a obra no PAC das Cidades Históricas.

“O prédio da prefeitura foi abandonado em estado lastimável pela anterior administração”, diz José Antônio de Ávila Sacramento, membro do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural de São João del-Rei (CMPPC) e do Instituto Histórico e Geográfico. “Enquanto deu, a administração anterior utilizou o histórico casarão até outubro de 2016. É certo que não estava em condições favoráveis, mas o imóvel deteriorou-se muito nestes últimos quatro anos em que não deram mínima manutenção no imóvel.”

Segundo José Antônio, o prédio foi abandonado “sem dar lastro imediato a ações de restauração dele. Lacraram-no cheio de goteiras e infiltrações e defeitos de toda sorte. Há fiações arrebentadas expostas e tenho receio de que a umidade/goteiras possam ocasionar curtos-circuitos e até propagar incêndio”.

Ainda segundo o membro do CMPPC, “criou-se também ali um ambiente propício para deterioração da alvenaria e da madeira. Sabemos que num ambiente fechado e úmido, cria-se uma espécie de estufa favorável ao desenvolvimento de colônias de insetos xilófagos, fungos e bactérias, que são os principais organismos que destroem a madeira. Movimentações são provocadas por variações térmicas e em face da umidade constante. Desenvolvem-se, também, em ambientes quentes e úmidos, várias patologias que prejudicam as alvenarias (adobes, taipas, tijolos, pedras, etc.)...”

Estaria este cartão postal de São João del-Rei em perigo? “É um patrimônio precioso que estamos perdendo... Ou perderemos? Até quando?”, questiona José Antônio de Ávila.

Biblioteca Municipal 

A antiga sede da Casa de Câmara (andar superior) e da Cadeia (andar inferior) foi construída a partir do ano de 1829, num terreno doado por Baptista Caetano dAlmeida. Consta que o projeto seja de Jesuíno José Ferreira. Em 1849, o imóvel foi inaugurado. Em 1925, a cadeia foi transferida temporariamente para o Largo do Carmo, abrindo espaço para a instalação no local (térreo) da Biblioteca Municipal.

Com a instituição da “prefeitura” na década de 1930, que passou a exercer as funções executivas do município, o prédio passou a ser sede do novo poder municipal, que dividia o espaço com a Biblioteca Municipal.

José Orozimbo de Resende, pai do professor e cronista José Antônio Oliveira de Resende, foi bibliotecário durante o período em que a Biblioteca Municipal funcionou no prédio. “Ele trabalhava à tarde e à noite (até as 21 h). O meu pai era uma espécie de Google da época.”

A demanda era grande, principalmente à tarde quando era maior a frequência dos consulentes (pesquisa). À noite era marcada pela presença de leitores. José Antônio recorda as noites em que passava com a mãe pela Avenida Rui Barbosa (atual Tancredo Neves) e via o andar inferior todo iluminado, com a silhueta do seu pai e de algumas pessoas lendo.

Uma vez, nos anos 1960, a Biblioteca recebeu uma equipe de carnavalescos do Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela do Rio de Janeiro. Eles vieram a São João del-Rei para pesquisar um tema para o samba enredo da escola. “Foram tão bem atendidos que deram uma flâmula da escola de presente para o meu pai”, conta José Antônio. “A partir desse dia, a família toda passou a torcer para a Portela.”

José Orozimbo participou da transferência da Biblioteca para os fundos da casa que pertenceu a Bárbara Heliodora, próximo à igreja de São Francisco, onde trabalhou até se aposentar.

Influências neoclássicas

A construção traz influências neoclássicas, partido quadrado, ligação com a rua direta, dois pavimentos e cobertura com quatro águas, relata José Antônio de Ávila. O térreo foi construído em pedra com paredes de um metro de largura; ainda há sinais das grades da antiga cadeia, que foram retiradas e levadas para local ignorado.

“Ornamentando a fachada, na parte superior, há uma série de cabeças de boi, simbolizando a pecuária, uma das riquezas da época. Acima da portada principal há símbolos do Poder e Justiça: um barrete com penacho, uma balança com dois pratos, um azorrague, um cutelo e um livro.”

No edifício existe o salão nobre Basílio de Magalhães, no segundo pavimento, onde funcionou por muitos anos o plenário da Câmara dos Vereadores. “No dito salão, está abandonada e se perdendo preciosa galeria de retratos de pessoas importantes da história brasileira, incluindo ex-presidentes da República e ex-prefeitos da cidade. Há mobiliários históricos, incluindo um oratório com bonita e mui antiga imagem de Cristo entalhada em madeira (os quais não sei se estão abandonados por lá ou se foram retirados). Há, ainda, ou havia no interior do prédio abandonado da Prefeitura lustres e lanternas (arandelas) de época, antigos”.

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