A Escola de Samba Bate Paus foi a campeã do Carnaval Cultural de São João del-Rei com nota 180, seguida da Unidos de São Geraldo, com 179,9. Ambas pertencem ao bairro Senhor dos Montes. Com o enredo “Venha brincar, é pra valer! Anos 80, vamos reviver!”, a Bate Paus alcançou 10,0 da dupla de jurados nos nove quesitos: enredo, bateria, fantasia, comissão de frente, alegorias e adereços, mestre-sala e porta-bandeira, evolução, harmonia e samba-enredo. A Unidos de São Gerado, segundo lugar na classificação, perdeu um décimo no quesito bateria.
Durante o desfile da Bate Paus, na noite de domingo, aconteceu uma coincidência. Enquanto a escola se apresentava na avenida, com a indumentária da bateria aludindo ao fim do militarismo e aos que morreram (fita preta no uniforme), era anunciado que o filme brasileiro Ainda estou Aqui, sobre o auge da ditadura militar, ganhava troféu de melhor filme internacional do Oscar 2025. No início da década de 1970, no Rio de Janeiro, o deputado cassado Rubens Paiva é levado por militares e desaparece, deixando a mulher Eunice e seus cinco filhos.
Em entrevista ao JL, Jussara Marcelino, autora do samba-enredo da Bate Paus, disse que a vitória foi fruto de “um somatório de acertos”, resultante de “um trabalho de formiguinhas, trabalho esse desenvolvido durante o ano todo”. Ela enfatizou que a vontade comum entre todos faz a coisa fluir: “o tema, as ideias, o envolvimento da comunidade, tudo são fatores que contribuem”.
Sobre o desfile
“Tivemos a comissão de frente com o “Thriller” de Michael Jackson; o carro abre alas, com homenagem ao filme “ET”, que foi um grande sucesso; as alas da comunicação (programas como o do Chacrinha, radinho de pilha, TV etc.), das crianças (homenagem ao palhaço Bozo) e do Arlequim; a tradicional ala dos batedores de paus; o carro alegórico de política (queda da ditadura e destaque para Tancredo); a ala das baianas (que trouxe a fertilização in vitro); o casal de mestre-sala e porta-bandeira, Willian e Leilane, que vestia fantasia branca simbolizando a liberdade, o costeiro, com um par de asas estilizadas, representando o Brasil livre de preconceitos e das amarras impostas pela ditadura; a bateria (fim do militarismo e homenagem aos desaparecidos); a ala liberdade e igualdade; as alas da lambada, da brincadeira de rua, do Velho Guerreiro Chacrinha e das paquitas; o carro alegórico com a nave da Xuxa (nesse carro tivemos a cover da Xuxa, Cintia Lopes), que fez bastante sucesso na avenida; e muitos outros personagens maravilhosos dos anos 80. Nosso desfile foi um espetáculo, muitos se identificaram e se empolgaram. Foi mágico!”
Sobre o samba-enredo
“A ideia do samba partiu de uma conversa com o carnavalesco da escola Rodrigo Pomarola, na qual o mesmo expressou o desejo de colocar na avenida o enredo voltado aos anos 80. Na minha visão, um grande presente, pois foi uma época que vivi intensamente e me identifiquei bastante com o tema. A inspiração veio de diversos pontos, artistas, fatos, filmes etc. Pra mim, foi um grande prazer falar dessa época e por isso, talvez, a facilidade em fazer esse samba. Na simplicidade da letra, uma grande emoção. Por isso, fez sucesso.”
Sobre a coincidência com o anúncio do Oscar
“Um dos pontos mais marcantes do desfile foi o fim da ditadura militar e a homenagem aos que morreram durante o período, uma coincidência que tangenciou a indicação do filme Ainda Estou Aqui. Liberdade e igualdade a todos, foi gritado na avenida, pois acreditamos que é um direito da humanidade.”
Sobre o nível do Carnaval
O Carnaval de São João del-Rei alcançou um nível bastante elevado. “As escolas têm crescido muito no nível das fantasias, e até mesmo no das alegorias. Hoje temos fantasias e carros mais elaborados, a criatividade tem sido um diferencial na maioria das escolas. Ainda temos algumas falhas, mas eu acredito que há uma grande preocupação em todas as agremiações de se apresentarem mais bem vestidas e detalhadas. A importação de fantasias mais elaboradas, muito grandes, com muitos adereços, de outro estado, acabou forçando as outras escolas a melhorarem o nível. Até então, as nossas fantasias aqui confeccionadas eram mais simples. O fato de trazer de fora as fantasias para São João acabou forçando as outras escolas a subirem o nível para também poderem disputar com mais condições. A Bate Paus subiu o nível das fantasias, mas preferimos a confecção aqui porque fica mais original, criativo… Gostamos de dar preferência às costureiras da nossa cidade para que o capital de giro seja todo aqui. Pagamos as costureiras do bairro, incentivamos o trabalho delas e isso acaba também favorecendo a economia da cidade. Nós buscamos alguns recursos fora porque aqui em São João não encontramos certos tipos de material. Porém, toda a confecção é aqui. Há uma tentativa de enriquecer as fantasias confeccionadas aqui.”
Sobre o nível dos sambas-enredo
“As escolas têm compositores maravilhosos. Com nível poético riquíssimo, nossos sambas têm encantado as comunidades e os visitantes.”
Sobre a decisão de não disputar o Carnaval em 2024
“Ano passado, optamos por não desfilar (estávamos arrumando a casa). A parte financeira precisava ser colocada em dia. Sendo assim, desfilar seria aumentar despesas. Temos que ter a consciência de preservar o nome da escola para as futuras gerações, e isso vem às vezes de decisões que precisamos tomar para não comprometer o futuro da agremiação.”
A íntegra da apresentação da campeã Bate Paus pode ser vista em https://www.facebook.com/radiosaojoaodelrei/videos/1016838876969532?locale=pt_BR