Gente que mora na roça precisa de estrada, escola e posto de saúde (Claret Rodrigues)


Entrevistas

André Eustáquio0

fotoClaret Rodrigues

O presidente do Conselho Comunitário Salva Terra, do distrito de Jacarandira, em Resende Costa, MG, é natural de Juiz de Fora, geólogo, empresário e devoto de Santo Antônio. Claret Rodrigues da Cunha, 62, foi eleito presidente do Conselho Comunitário em dezembro do ano passado, com mandato de dois anos. Formado na Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto, Claret dedicou grande parte de sua carreira profissional à mineração. Entre outros cargos do ramo de engenharia, foi conselheiro do CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) por 16 anos e se aposentou como diretor-presidente da Geosol (Geologia e Sondagens LTDA), uma das maiores empresas de pesquisa geológica do mundo, com atuação na América do Sul e África. “Continuo como conselheiro administrativo da Geosol. Vou lá uma vez por ano”.

Claret dedica-se atualmente a administrar seus negócios, entre eles duas grandes fazendas, uma localizada a dez quilômetros de Jacarandira, no município de Passa Tempo, e a outra no povoado da Micaela, em Resende Costa. Claret é o autêntico empreendedor, que sabe o que quer com seus negócios e os conhece muito bem. A Fazenda Santo Antônio do Rochedo é exemplo disso. A propriedade possui 700 hectares de terra, divididos em campos, serrados e matas. Nesta vasta área Claret preserva 23 nascentes. “Tenho um compromisso comigo mesmo de plantar 15 mil árvores por ano. Conservo minha água e melhoro meu solo porque é melhor pra mim. Com isso, estou valorizando o que é meu. Tem gente que compra terra, toca fogo, arranca tudo, vira erosão e o dinheiro dele vai embora.”

Na sala de estar da magnífica e centenária Fazenda do Rochedo, onde mora com sua esposa Perpétua, Claret concedeu a seguinte entrevista ao JL.

 

Como o senhor se tornou presidente do Conselho Comunitário de Jacarandira? Nós temos essa propriedade aqui em Resende Costa e outra em Passa Tempo. Jacarandira é equidistante a essas propriedades. Então, por deslocamento, eu passo sempre por Jacarandira. E numa destas oportunidades em que eu estava passando por lá, algumas pessoas me pararam e me perguntaram se eu estaria disposto a auxiliá-las no Conselho, mas não na presidência, pois eu tenho outras atividades e pra mim seria complicado. Mas no dia da escolha lá do conselho eu, infelizmente, não pude estar presente. Em negociações das quais eu não participei acabei como presidente.

 

Então o senhor foi eleito presidente numa reunião da qual não participou? É. As pessoas que me convidaram são pessoas que eu conheço muito bem, pois estou aqui na região desde 1983, primeiramente em Passa Tempo. Eu me interesso por Jacarandira porque tenho pessoas amigas, diga-se de passagem, a maior parte delas já no cemitério, inclusive o senhor Geraldo Gouvêa, muito amigo meu. Eu sou asmático e nós éramos colegas no hospital lá em Resende Costa. O senhor Geraldo e eu batíamos longos papos lá à noite, os dois internados lá no hospital. Papos interessantíssimos. Senhor Geraldo foi uma das pessoas mais inteligentes que eu já conheci.

 

A reforma do cemitério foi seu primeiro empreendimento enquanto benfeitor de Jacarandira? Como a administração do cemitério não é atribuição da prefeitura, ou seja, do conselho comunitário, e sim da Igreja, que não tem recursos, eu assumi essa obra de restauração e rearranjo do cemitério. Em razão disso surgiu o convite para eu poder participar do conselho comunitário. O meu interesse em participar do conselho é porque os meus colaboradores, aqueles que fazem com que eu more aqui, são todos de Jacarandira. Então eu assumi. Meu intuito nada mais é do que melhorar as condições de vida e de trabalho das pessoas que me proporcionam poder morar aqui.

 

Então a grande maioria dos seus funcionários é de Jacarandira? Para não dizer que é 100 por cento, eu tenho funcionário aqui do Córrego Fundo, que é também Resende Costa e da Micaela. Mas eu prometi pra mim mesmo que vou me aposentar de trabalho comunitário e social. Quando eu fiz 40 anos de trabalho social e comunitário eu disse, agora vou parar, vou cuidar das minhas fazendas.

 

Hoje, qual é a maior necessidade do distrito de Jacarandira?

Você precisa estabelecer realidades maiores. E a necessidade maior de Jacarandira hoje, inclusive o prefeito Aurélio está nos ajudando bastante, é a água. Foi feita lá, pela prefeitura, uma captação emergencial de água. Mas foi feita de maneira muito precária. Posso dizer que o problema de Jacarandira é cabeludo, vai ficar sem água. Isso eu disse antes de assumir o conselho. A obra que estamos realizando através da parceria entre o conselho e a prefeitura é para minimizar a perspectiva de chegarmos em setembro sem água. Não temos muitas opções. O volume de água lá é de vazão baixa e a opção que existe está sendo bem tratada.

 

A sua preocupação em preservar as matas e as nascentes das suas fazendas revela que o problema da escassez da água lhe chama a atenção. Eu me preocupo com essa questão da água há muito tempo. Sou geólogo de formação. Um dos motivos que me levaram a comprar essa fazenda foi devido às nascentes que tem aqui. Todas hoje são cercadas. Mesmo assim eu fiquei sem água no ano passado. Então, como você vai imaginar um lugar com 400 moradores sem água. O caminhão-pipa vai puxar de onde? Eu sei o que é morar numa cidade onde os moradores passam uma semana sem água, sem uma gota d’ água. É uma experiência pessoal. Morei em Caetité, na Bahia, durante três anos. Não é ver passar na Globo, é morar lá. Não quero isso para a gente não.

 

A partir da sua experiência e do seu conhecimento, qual seria a solução não emergencial para Jacarandira? A primeira coisa é preservar o que já tem. Não cortar nenhuma árvore nativa. Realizamos uma captação de 8.000 litros/hora. São 8 horas de bombeamento por dia. Na escassez você pode fazer a estocagem de água. É o que se pode fazer. E é o que estamos fazendo, ou seja, um sistema de depósito de água. Paralelamente estou negociando com o Aurélio a reforma de alguns tanques da Copasa, para aumentar a estocagem. É a única maneira que se tem. Tentar paralelamente. Estou brincando com o pessoal lá, até pesadamente, dizendo que vou cobrar essa água. É para a pessoa parar de lavar passeio.

 

Há abusos da parte dos moradores?

Estou explicando pra eles: Se vocês não cooperarem, vai faltar.

 

E a mineração em Jacarandira?

Qual delas? Existem três. Olha, todo o meu patrimônio eu tirei da mineração. Eu fico muito revoltado quando chamam determinados empreendimentos de mineração. Mineração é coisa de gente séria e responsável, que preza pela segurança, pela preservação do meio ambiente e pela responsabilidade social. Nem todas as empresas têm isso. Para sorte de Jacarandira, a empresa que está em operação tem sido muito responsável. A melhor estrada de terra da região é a que liga Jacarandira a Passa Tempo, obra feita por essa empresa [Metais Mineração LTDA – MML]. A MML tem um decreto de lavra muito bem feito. Ela tem uma licença para explorar 480 mil toneladas de minério de ferro por ano.

 

Como a mineração pode ajudar no desenvolvimento do município, consequentemente, de Jacarandira? Mineração, para o prefeito, é uma bênção de Deus. O município que tem uma mina em sua área é uma beleza, uma benção. Agora, depende de o administrador saber conduzir uma negociação sadia para ambas as partes. O município ganha, com toda certeza.

 

O que se pode fazer para a preservação ambiental? Se for uma mineração de verdade, ou seja, o cara realmente está honrando o diploma dele, pode melhorar muito. Toda mineradora quando recebe o decreto de lavra assina um termo de compromisso com o Ministério Público de medidas compensatórias. Não existe decreto de lavra sem medida compensatória. É aí que o município ganha. Mas, para isso o município tem que estar preparado e conscientizado do que vai pedir em troca. Tem município que pede bobagem. Em vez de ficar pedindo parque de diversão ou iluminação de fonte, vamos pedir para limpar os rios, desassorear nascentes etc. Tem que ter jogo aberto. O impacto ambiental pode ser minimizado através das medidas compensatórias.

 

A pequena mineração, como vemos aqui na região, é um empreendimento economicamente viável? Presta atenção. Qualquer coisa bem feita é viável. Se você tem uma lanchonete pra vender sanduíches, que é bem tocada, você ganha dinheiro. Tenho esse princípio. Mineração não é tamanho. Tamanho não é documento. É a técnica; você ter um projeto bem dimensionado, pesquisa geológica. E a MML tem um projeto. Aqui não é Carajás e nem Itabira. Esqueçam. Estou falando agora como geólogo. Aqui na nossa região temos corpos geológicos pequenos, pontuais. Eles vão ter minério para dez anos, no máximo. Por isso, montaram um projeto para uma área pequena.

 

No topo da Serra da Galga tem uma placa da Mineradora Vale. Todas essas áreas são requeridas pela Vale. A Vale fez um programa de sondagem geológica muito grande aqui. Mas para uma empresa que explora 400 milhões de toneladas/ano, não tem área aqui. A jazida da MML duraria quatro dias nas mãos da Vale.

 

Além do problema da água, o que demanda maior atenção em Jacarandira? Saneamento básico. Primeiro, a água, segundo, o saneamento básico, pois lá só tem fossa, e terceiro, calçamento. Em Jacarandira só são calçadas a rua principal, Dr. Costa Pinto, e a rua anterior. Tem mais três ruas que são intransitáveis em dias chuvosos. Então, num segundo momento, é negociar com a prefeitura. Hoje estamos administrando escassez, devido à incompetência. Mas, nós temos um problema grave em Jacarandira, que vocês precisam nos ajudar através do jornal: nós não temos padre. É uma luta conseguir ter uma missa em Jacarandira. Nós tínhamos um padre, um amigo pessoal de quem eu gostava demais, o padre Raimundo [Inácio da Silva, falecido em 22 de julho de 2014, aos 60 anos], inclusive pretendo homenageá-lo na praça aqui embaixo, na igreja da Micaela. O período em que ele ficou lá foi muito bom pra nós. Ele está fazendo muita falta. Depois que o padre Raimundo morreu, nós não temos mais missa aqui na Micaela.

 

O desejo é ter um padre que resida em Jacarandira? Nós não temos essa pretensão. O que queremos é que tenha pelo menos uma missa semanal. É o mínimo. Uma igreja lotada todo fim de semana com o ministro fazendo culto?! Será que a Igreja Católica não é capaz de atender a comunidade? Pelo amor de Deus, Né?

 

Como o senhor começou a produzir a Cachaça Passatempo de Minas? Comecei para consumo próprio, literalmente. Fiz um alambique pra mim, do meu jeito. Só que um dia eu levei para a Geosol. Na Geosol eu tinha na minha sala meu bufê com meu copinho. E ao final do expediente quem quisesse tomar uma cachaça com o presidente podia tomar. No geral tinha muita gente tomando cachaça, inclusive clientes. E aí começou. A Geosol tem clientes no mundo inteiro, então o cara viajava e ligava pra mim: “manda uma garrafa, uma caixa.” Até hoje, o pessoal liga pra mim, eu fecho uma caixa e mando.

 

 

Colaboração: José Venâncio e Murton Moreira.

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