Lei Orgânica protege árvores e monumentos do centro de Resende Costa

Três espécies são protegidas, entre elas uma árvore da Praça Cônego Cardoso que muitas pessoas conheciam como sendo o mítico Pau-Brasil


André Eustáquio


Árvore da Praça Coronel Sousa Maia, protegida pela Lei Orgânica (Foto André Eustáquio)

A Lei Orgânica do Município de Resende Costa, promulgada no início da década de 1990, na seção Cultura, artigo 185, considera “monumentos municipais de conservação permanente” as lajes existentes na sede do município; a caverna denominada ‘Buraco do Inferno’, as reservas florestais e fontes situadas no centro e na periferia da cidade, as praças, cachoeiras, grutas, Teatro Municipal, os Cruzeiros, os Passinhos e as árvores situadas nas praças Coronel Sousa Maia, Dr. Costa Pinto e o “Pau-Brasil existente na Praça Cônego Cardoso”. O parágrafo segundo do artigo 185 atribui ao Executivo Municipal a “obrigação de manter e preservar todos os monumentos do município”.

Dentre os monumentos protegidos pela Lei Orgânica, as três árvores situadas nas principais praças do centro da cidade despertam curiosidades. Muito já se discutiu acerca de qual espécie de fato pertence a histórica árvore plantada no centro da Praça Cônego Cardoso, próximo ao cruzeiro. A maioria dos resende-costenses cresceu ouvindo a informação (inclusive nas escolas) de que se trata de um Pau-Brasil  espécie de árvore nativa de algumas florestas do Brasil que tanto lucro gerou aos portugueses, na época em que ainda éramos colônia.

Uma entrevista com Murton de Carvalho Moreira, Técnico Ambiental e funcionário da agência avançada do Instituto Estadual de Floresta (IEF) em Resende Costa, trouxe informações interessantes e ao mesmo tempo reveladoras sobre as três árvores das principais praças do centro da cidade. “A árvore da Praça Cônego Cardoso é conhecida popularmente em nossa cidade como Pau-Brasil, mas ela não é um legítimo Pau- Brasil. Trata-se de uma espécie nativa conhecida como Sobrasil (Saguaraji Sobrasil) e seu nome científico é Columbrina glandulosa”, informou Murton.

Segundo o técnico do IEF, a árvore é bastante utilizada para construções na zona rural, uma vez que possui madeira de cerne vermelho e de grande durabilidade. “Quanto ao Pau-Brasil, é uma espécie nativa, porém não encontrada em nossa região. Sua presença se dá com maior frequência no leste de Minas, próximo ao Espírito Santo e ao sul da Bahia”, esclareceu Murton Moreira. “A árvore de Pau-Brasil possui folhas pequenas de coloração verde escuro e em seu caule há presença de acúleos (espinhos), que ficam na superfície da casca. Sua flor é pequena e amarela, com centro vermelho”, completou.

 

Outras espécies preservadas 

Além da árvore da Praça Cônego Cardoso, que agora sabemos se tratar de um Sobrasil, o artigo 185 da Lei Orgânica preserva também as belas e frondosas árvores que ornamentam e sombreiam as praças Coronel Sousa Maia e Dr. Costa Pinto, ambas no centro da cidade. Murton Moreira falou ao JL sobre essas duas espécies. “A árvore do Rosário (Praça Coronel Sousa Maia) é uma planta nativa da flora brasileira, conhecida popularmente como ‘Orelha de Negro’ ou ‘Tamboril’. Ela é encontrada em quase toda a flora brasileira, desde Pernambuco até o Rio Grande do Sul e pertence à família da Fabaceae. O seu nome científico é Enterolobium Maximum. É uma árvore de grande porte e chega a atingir 45 metros de altura. Sua madeira não é de boa qualidade para uso nobre. Já a árvore da Praça Doutor Costa Pinto não é uma planta nativa. Ela é oriunda da África, sendo conhecida como Espatódea ou também como Bisnagueira. É uma árvore de crescimento rápido, chegando a 25 metros de altura, e faz parte da família Bignoniaceae. Essa espécie foi muito utilizada para arborização nas décadas de 60 e 70, devido à beleza de sua florada vermelha e ao crescimento rápido. Hoje ela já não é mais recomendada para arborização, pois suas raízes quebram calçamentos e as flores, de acordo com os especialistas, são tóxicas para as abelhas.”

Sobre o Tamboril que sombreia o Largo do Rosário, sua presença na praça costuma despertar polêmica na cidade e dividir opiniões. Nas últimas décadas, a árvore, que chega a atingir de 20 a 35 metros de altura e de 80 a 160 centímetros de diâmetro, ganhou grandes proporções, levando algumas pessoas a defenderem o seu corte ou uma poda radical. No entanto, há mais defensores da permanência da árvore do que quem deseja extirpá-la da praça.

O JL conversou com o advogado e Oficial de Justiça da Comarca de Resende Costa, Cláudio Luís Resende, que, no início da década de 90, foi vereador constituinte da Lei Orgânica do Município. Ele exerceu, na ocasião, o cargo de relações públicas da Lei Orgânica. “Pude ofertar algumas propostas substanciais ao projeto original, que era um modelo para todos os municípios. Neste esboço original, dentre outras questões relevantes, entendi que o património histórico cultural não era protegido pela lei. Foi então que propus ao plenário algumas mudanças que culminaram na aprovação do artigo 185 que trata dos monumentos históricos que, no meu entendimento, mereciam ser protegidos por lei”, disse o ex-vereador.

Cláudio Luís, que atualmente preside a ACRADATEC/Rádio Inconfidentes FM, explicou o motivo que o levou a escolher os monumentos que passaram a ser preservados pela Lei Orgânica: “A questão das árvores protegidas se prendeu ao fato de que o Pau-Brasil existente (na Praça Cônego Cardoso) era a única espécie plantada nas praças. Embora não seja o legítimo, foi o que se adaptou na nossa região e serve para lembrar o nome do nosso país, como árvore símbolo. A árvore da Praça do Rosário sempre foi o marco mais imponente ali existente. Os demais monumentos jamais poderão ser esquecidos do dever de serem preservados, tanto pelo poder público como pela sociedade em geral. Afinal, um povo sem história e sem memória não pode seguir rumo ao futuro. Outro fator que me chamou atenção em proteger as lajes se deve ao fato de que partes delas foram transmitidas a terceiros, quer pela ocupação ilícita ou pela outorga do poder público.”

O advogado e ex-vereador esclarece que, se houver necessidade, o artigo 185 da Lei Orgânica pode ser modificado, porém deve-se respeitar o trâmite necessário. “Gostaria de lembrar que, embora a Lei Orgânica necessite de rito próprio para modificação, esse artigo envolvendo os monumentos culturais poderá ser modificado em virtude de novos fatos e atos que vislumbrem a necessidade de alteração, seja para incrementar ou erradicar monumentos, sem, contudo, perder a essência da preservação e da história que cada monumento representa para nossa cidade. ”

 

Cidade mais arborizada

Nas grandes cidades, o verde vem perdendo cada vez mais espaço para o cinza dos prédios, do asfalto e da poluição. Nuvens de fumaça já não permitem às pessoas verem o azul do céu, tampouco contemplar o brilho das estrelas numa noite enluarada. Esse cenário um tanto quanto poético felizmente ainda é possível de ser admirado nas pequenas cidades do interior, onde o nível de poluição ainda está controlado e a ganância selvagem da especulação imobiliária não destruiu a natureza por completo.

Em Resende Costa, a Capoeira Nossa Senhora da Penha, uma mata nativa localizada no centro da cidade e também protegida pela Lei Orgânica, vem resistindo a duras penas. Vista das Lajes de Cima, a Capoeira aos poucos vai se tornando apenas um pequeno amontoado de árvores sufocadas por casas e ruas.

Para muitas pessoas, as árvores nas ruas são sinônimo de incômodo. Os incomodados argumentam que as árvores sujam e danificam as calçadas, colocam em risco pessoas e veículos. Murton Moreira pensa diferente. Para ele, quanto mais arborizada for uma cidade, melhor qualidade de vida terá a população. “O que precisamos é de conscientização da população do quanto é benéfico termos uma cidade arborizada. Uma maior quantidade de árvores nas cidades proporciona melhorias no microclima e na qualidade de vida em geral; melhora muito o aspecto estético, atrai a presença de pássaros; diminui o calor do sol, os ruídos e, principalmente, colabora com a renovação do oxigênio. De acordo com algumas pesquisas, uma área arborizada pode ser até 4 graus mais fresca do que uma área sem árvores”, defende o funcionário do IEF.

A topografia de Resende Costa dificulta, segundo Murton, a presença de mais árvores nas ruas. O que não impede de se elaborarem projetos de arborização adequados. “A cidade de Resende Costa, como todas as cidades mais antigas, foi construída com ruas mais estreitas, principalmente na área central. Isso traz certas dificuldades de se realizar arborização. Contudo, nada impede de se fazer o plantio de árvores de pequeno porte e mais adequadas para arborização urbana”, explica o técnico ambiental.

Cláudio Luís, vereador constituinte que propôs o artigo 185 da Lei Orgânica que preserva os monumentos municipais de conservação permanente, revela o seu sonho de ver um dia as Lajes de Cima, principal cartão-postal de Resende Costa, revitalizadas. “A principal motivação desse artigo da Lei Orgânica foi sem dúvida a preservação. No entanto, uma questão me chama a atenção até hoje e se prende ao meu desejo maior que era, e continua sendo, a revitalização das Lajes de Cima, dado o seu potencial turístico. Daquele tempo até os dias de hoje, passaram-se muitas administrações que pouco ou nada fizeram, pelo menos naquilo que entendo ser necessário, para a realização do meu sonho de ver transformadas as lajes em um local totalmente adaptado aos novos tempos”, conclui o ex-vereador.

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