Duas notícias recentes sobre Resende, Norte de portugal, apenas aparentemente nada tem em comum. A Assembleia da República incluiu, em julho, no plano nacional de investimentos 2020-2030, a ligação rodoviária entre a Ponte da Ermida e uma das auto-estradas mais próximas (A4 ou A24). Já dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) apontam que Resende registrou o mais baixo rendimento médio do país (declarados em 2017 no Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares-IRS), com o valor de 5.481 euros (cerca de R$ 24.5 mil) anuais por habitante.
A economia da Vila de Resende, município de cerca de 12 mil habitantes na margem Sul do rio Douro, é baseada nos setores primário (agricultura) e terciário (comércio e serviços). A principal atividade é a produção de cereja, cuja quantidade é estimada em 3 mil toneladas/ano. O produto é comercializado em Portugal, e uma pequena parte é exportada para outros países europeus. O maior problema é a oscilação do preço.
Outras atividades agrícolas são o cultivo de uva para vinhos e a criação de gado, principalmente da raça arouquesa. A Freguesia do Barrô produz uvas próprias para a produção de vinho do porto e de consumo doméstico e as demais freguesias de Resende produzem uva para vinhos verdes. Já a carne é vendida para talhos (açougues) e parte encaminhada à associação dos criadores, em Cinfães, para a certificação do produto.
Resende carece de indústria agroalimentar, constituída de empresas processadoras de produtos agrícolas. Consequentemente, não há agregação de valor aos produtos agrícolas e faltam empregos de melhor remuneração. O município tem um mercado pouco dinâmico, quase estanque, com pouca oferta e pouca demanda, resume Anabela Oliveira, vice-presidente da Associação Empresarial de Resende (AER).
Menor rendimento do país
Segundo o INE, Resende (no distrito de Viseu) é o município onde o rendimento médio é o mais baixo entre os 300 municípios portugueses, situando-se em 5.481 euros anuais por habitante. Este valor está abaixo da referência nacional cujo rendimento médio bruto (deduzido do IRS) por habitante foi de 8.687 euros.
Também abaixo de 6 mil euros encontram-se municípios como Cinfães, Valpaços, Santa Maria de Penaguião, São João da Pesqueira e Tabuaço. São municípios com as mesmas características (predomínio da agricultura, falta de acessibilidade e venda direta de produtos primários; população envelhecida, etc.), disse o presidente da Câmara Municipal de Resende, Manuel Garcez Trindade, em entrevista à TVI. Faltam empregos e poder de compra, acrescentaram moradores entrevistados pela reportagem.
No outro extremo, encontra-se Oeiras com o valor foi 12.935 euros. Oeiras pertence ao grupo, que inclui Lisboa, Cascais e outros 64 municípios, com rendimentos médios superiores a dez mil euros anuais. Deste grupo fazem parte Entroncamento, Alcochete, Coimbra, Almada, Porto, Vila Franca de Xira, Évora, Seixal, Aveiro, Marinha Grande, Odivelas e Setúbal.
Ligação rodoviária
Uma das deficiências do município é a falta de uma ligação rodoviária rápida que contribua para aumentar a competitividade do território municipal. Desde a inauguração da Ponte da Ermida (que liga Resende a Baião) sobre o rio Douro, em 1998, pelo então presidente Jorge Sampaio, que se aguarda a ligação rodoviária de acesso a uma das auto-estradas nacionais A4 (Porto-Vila Real) ou A24 (Viseu Chaves).
No caso da A4, já existe uma via rápida entre os municípios de Marco de Canaveses e Baião, faltando apenas completar o trecho de ligação entre Baião e Resende (cerca de 12 km). Quanto à A24, a ligação (de cerca de 17 km) seria feita através da povoação de Bigorne no município de Lamego.
Em fevereiro deste ano, a Associação Empresarial de Resende (AER) lançou uma petição (abaixo-assinado), endereçada à Assembleia da República (equivalente ao Congresso Nacional no Brasil), solicitando ao governo português a construção da via rápida de acesso a uma das duas autoestradas nacionais.
Segundo Anabela Oliveira, foram distribuídos 117 blocos, com 60 assinaturas cada um, à população, empresas e comerciantes de Resende, Baião, Cinfães e Mesão Frio, que seriam beneficiados com esta obra. Esses municípios estão inseridos na Comunidade Intermunicipal do Tâmega e Sousa, que engloba ainda Marco de Canaveses, Penafiel, Paços de Ferreira, Lousada, Amarante, Castelo de Paiva e Felgueiras.
“A existência de uma ligação rodoviária rápida e direta da Ponte da Ermida a uma Auto-estrada poderia permitir em Resende a criação e/ou instalação de empresas, apoiando as que já cá estão instaladas e ajudando também à fixação das populações, contribuindo assim para o desenvolvimento socioeconômico de Resende e da região”, diz um trecho da petição.
A petição assinala que Resende é o concelho da região que tem perdido mais população nos últimos cinco anos; tem a pior taxa de criação de empresas da região (0.14% em 2017, abaixo da média nacional de 0.36%) e do país; tem um dos piores indices de poder de compra per capita (os produtos chegam caros e com atraso para um rendimento médio baixo); tem uma taxa de desemprego superior à média regional e nacional.
Além disso, há “dificuldades em fazer entrar e sair produtos em Resende. Temos transportadoras a recusarem-se e/ou a demorar para efetuar as suas entregas”, bem como “custos adicionais na produção e na distribuição de bens e serviços, o que reduz a competitividade empresarial, reduz a atratividade de investimentos para o concelho”.
Na área da Saúde, o Hospital Central da região, ao qual Resende está ligado, localiza-se em Penafiel, a 1 hora de distância.
A coleta de assinaturas vai continuar porque a inclusão no plano nacional de investimentos (2020-2030) é apenas o começo, explica Anabela Oliveira. “Ainda tem um caminho muito longo a percorrer até (a ligação rodoviária) se chegar a concretizar em obra efetiva.”
Câmaras Municipais
Os presidentes das Câmaras Municipais de Baião e de Resende, Paulo Pereira e Manuel Garcez Trindade, “desenvolveram diversas diligências (nos últimos meses), no sentido de sensibilizarem para a importância estrutural da obra para toda a região”. Os autarcas “têm feito forte pressão em instâncias diversas para que esta obra veja, finalmente, a luz do dia”, disse Pereira.
Segundo o presidente da Câmara Municipal de Baião, foram promovidas “várias reuniões de trabalho com os grupos parlamentares com assento na Assembleia da República, nomeadamente PS, PSD, CDS-PP e PCP eleitos pelo Círculo do Porto. Apenas o Bloco de Esquerda não respondeu ao pedido de reunião. Houve ainda uma reunião conjunta com Resende, reunindo os deputados do PS Porto e PS Viseu, com a presença dos respectivos Presidentes Federativos – Manuel Pizarro e Antônio Borges”.
Pereira disse, ainda, que “em esforço conjunto com Garcez Trindade também batalhou junto de Antônio Costa, primeiro ministro, e Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e Habitação, lembrando-os da necessidade de se executar a obra, ´pelo bem da região´. Os dois autarcas apresentaram à tutela, recentemente, um estudo aprofundado e objetivamente sustentado que enfatiza a importância da infraestrutura, não só para Baião e Resende, como para toda a região”. Também os presidentes de Câmara de Mesão Frio, Régua e Marco de Canaveses “subscreveram a importância estruturante da mesma para todo o território”.
A ligação de Baião à Ponte da Ermida já “chegou a ser lançada a concurso no dia 31 de julho de 2009, ao fim de 27 projetos, com o valor de cerca de 26 milhões de euros e com previsão de realização em 2010/2011 e poria fim a uma espera de 25 anos. Até hoje, nunca se concretizou”, acrescenta Pereira.
A inclusão da obra no plano nacional de investimentos (PNI 2030) foi aprovada, no dia 5 de julho, pelo plenário da Assembleia da República com votos do Partido Socialista (PS), Partido Social Democrata (PSD), Centro Democrático Social (CDS-PP) e Partido Comunista Português (PCP).
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