São João del-Rei, em livro sobre igrejas de Bom Jesus de Matosinhos no Brasil


Cultura

José Venâncio de Resende0

Isabel Lago, ao fundo o Santuário de Bom Jesus de Matosinhos.

Já são mais de 30 igrejas e altares de Bom Jesus de Matosinhos, identificados no Brasil pela escritora portuguesa Isabel Maria Lago Barbosa. Desse total, 25 igrejas – entre elas a igreja de Bom Jesus de Matosinhos em São João del-Rei - fazem parte do livro “Uma Rota de Fé”, publicado em 2003 pela Câmara Municipal de Matosinhos, região metropolitana do Porto.

O livro tem como tema a devoção a Bom Jesus de Matosinhos no Brasil, especialmente em Minas Gerais e na Bahia, observa Isabel Lago, formada em Filosofia e História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Esta devoção é vocalizada pelo culto e em alguns casos pelo próprio nome da igreja. “A ideia que tínhamos era de que só havia Bom Jesus de Matosinhos em Congonhas do Campo.”

O trabalho começou por volta do ano 2000, quando o professor de História Joel Cleto, então funcionário da Câmara Municipal, sugeriu a Isabel que escrevesse sobre igrejas de Bom Jesus no Brasil, para além de Congonhas. “Assim, passei três anos da minha vida a procurar igrejas pela internet. Eu tentava encontrar seminários, prefeituras, estabelecimentos comerciais que tinham e-mail.

Naquela época, pouco gente tinha e-mail, o que dificultava a comunicação, lembra Isabel. “Um dia acordei o prefeito de Catas Altas às 5 horas da manhã, no Brasil, para saber sobre a igreja. Não me dei conta do fuso horário.”

Nesses contatos, inicialmente Isabel apresentava as características do Bom Jesus – um olho a olhar para cima (o Pai), outro a olhar para baixo (os filhos) e os pés pregados, saparadamente. “Eu queria saber se havia e depois pedia a fotografia.”

São João del-Rei

Nesta procura, Isabel localizou José Antônio de Ávila através do Instituto Histórico e Geográfico (IHG) de São João del-Rei. “Tudo que era IHG eu consultava também.” O fruto desta parceria foram 15 páginas do livro sobre a história de São João del-Rei, do bairro de Matosinhos, de sua igreja e as tradicionais festas religiosas da paróquia.

O bairro são-joanense começou quando um padre português adquiriu, na segunda metade do século XVIII, uma área entre o Córrego Água Limpa e as margens do Rio do Porto. Ali construiu uma capela e nela entronizou “uma linda imagem de Nosso Senhor crucificado, confeccionada em Portugal, cidade de Matozinhos”.

Em outubro de 1959, o bairro de Matosinhos tornou-se paróquia. A igreja existente era ainda a original, erguida nos anos 1770. Por achar que se encontrava em péssimas condições de conservação e pequena para as necessidades do bairro, o pároco Jacinto Lovato Filho demoliu a igreja antiga e construiu uma nova matriz que apenas em 1980 foi benzida e aberta ao público. Isto, apesar da resistência de moradores do bairro com o apoio do IHG.

Em outra passagem, o livro cita as três festas religiosas do bairro – Semana Santa, Divino e Jubileu – “que, para nós em Portugal, são também as mais importantes”. Sobre o Jubileu, a grande festa do padroeiro que se celebra em maio, diz que é organizado por uma comissão de apoio ao pároco e pela Irmandade do Bom Jesus de Matosinhos. Destaca ainda “a forte componente religiosa” da festa, mas que “também contempla o aspecto profano de diversão e sociabilidade”.

Nova descobertas

“Depois que acabei o livro, já encontrei mais sete igrejas ou altares, que não aparecem citados no meu livro Uma Rota de fé”, conta Isabel Lago. São eles: Igreja Nossa Senhora do Prazeres da Vitória, Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco (1649/1654); Altar do Bom Jesus de Bouças na Igreja de Nossa Senhora da Nazaré, Cachoeira do Campo, Ouro Preto (1700); Altar do Bom Jesus de Matosinhos na Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário, Lavras (reavaliada em 2019 ); matriz do Bom Jesus de Matozinhos, Bom Jardim de Minas (1857); igreja velha e matriz de Campo Belo (século XVIII); igreja nova de Guaicuí, MG (1911); igreja de Lagoa Dourada, MG (1734).

No caso específico de Lavras, a imagem só agora tomou esse nome, explica Isabel. “Depois de anos de avaliação minha e dos responsáveis da Igreja, em Lavras, foi finalmente reavaliada e reconhecida este ano (2019) como um exemplar do Bom Jesus de Matosinhos após estudo sobre as suas características, a sua origem e histórico da sua presença nesta capela.”

Já o altar da igreja de Nossa Senhora da Nazaré, de Cachoeira do Campo, foi localizado há 5 anos por Isabel. “Ele é uma beleza. Descobri através do professor (de História) Alex Bohrer, de Ouro Preto. Ele fez um estudo sobre o altar de Bom Jesus de Bouças, de Cachoeira.”

Bom Jesus de Bouças

Este é o nome pelo qual também é conhecido Bom Jesus de Matosinhos. Diz a lenda que uma imagem de Jesus, esculpida em madeira por seu amigo Nicodemos, foi lançada ao mar Mediterrâneo na Palestina para fugir da perseguição aos cristãos. Atravessou o Estreito de Gibraltar e chegou à praia de Matosinhos. Encontrada, a escultura, que faltava um braço, passou a ser venerada pela população no Mosteiro de Bouças.

Depois de muitos anos, uma pobre mulher encontrou na praia um pedaço de madeira, que resistiu ao fogo por diversas vezes. A filha muda desta mulher, ao ver aquilo, falou pela primeira vez, dizendo que aquele pedaço de madeira era o braço que faltava ao Senhor Bom Jesus de Bouças. Encaixado o braço na imagem, a partir daí, todos os anos, sete semanas depois da Páscoa, se realizam as festas em honra ao Senhor de Matosinhos.

A Confraria que reúne os devotos de Bom Jesus de Bouças foi fundada em 1607, de acordo com Isabel Lago, Já o santuário de Matosinhos foi erguido no século XVIII, para receber a imagem de Bouças, com dinheiro de Minas Gerais. Em 1719, a pedido da Mesa da Confraria de Bom Jesus de Matosinhos (ou de Bouças), o rei D. João V autorizou João Alvarez de Carvalho ir ao Brasil pedir “esmolas” aos cristãos do “districto das Minas do ouro” para o “Senhor Jezus de Bouças”.

Para completar o “coração da devoção ao Bom Jesus” em Matosinhos, no século XIX foi construído o prédio ao lado do santuário, com dinheiro dos irmãos da confraria que se encontravam em Minas Gerais. “No Brasil, a devoção ao Bom Jesus de Matosinhos se desenvolveu nos ciclos do açúcar e do ouro”, resume Isabel Lago.

Nova publicação

Isabel Lago pretende atualizar o primeiro livro a partir das atas (resumos) apresentadas em congressos realizados em Portugal. Para isso, falta apenas concluir as pesquisas no Rio de Janeiro sobre a rua e travessa do Bom Jesus de Matosinhos (encostadas no sambódromo) e a Basílica de Werneck.

Além de ser encontrado na Câmara Municipal de Matosinhos, o primeiro livro está disponível na internet: https://www.academia.edu/12487793/UMA_ROTA_DE_F%C3%89 e blog https://rotadefe.blogspot.com/

 

 

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