Uma história de glórias contada por quem esteve dentro de campo

Padre José Hugo, ex-presidente do Expedicionário, conta como foi a construção do tradicional “Estádio dos Eucaliptos”, que inaugurou novo gramado


André Eustáquio


Registro do placar do jogo de inauguração do Campo do Expedicionário (Arquivo padre José Hugo)

A reinauguração do gramado do Estádio Antônio Argamim de Freitas, o Campo do Expedicionário, como é conhecido, nos dias 8 e 9 de julho, foi um marco na história do glorioso clube que tantas alegrias trouxe aos amantes do futebol de Resende Costa. Ver a bola rolar no novo tapete verde faz-nos também recordar os épicos torneios que agitaram durante décadas as tarde de domingo no tradicional “Estádio dos Eucaliptos”.

O estádio foi palco de memoráveis duelos entre os principais times do município de Resende Costa e cidades da região, como Passa Tempo, Lagoa Dourada, Coronel Xavier Chaves e Desterro de Entre Rios. Expedicionário X Curralinho dos Paulas, Ramos X Barracão, Expedicionário X Coroense e, claro, o sempre esperado Derby resende-costense marcado pela rivalidade: Expedicionário X Boca Júnior. Estes são alguns dos grandes jogos que ficaram indelevelmente marcados na memória do torcedor que lotava as dependências do Estádio Antônio Argamim de Freitas nas tardes de domingo.

Diversas gerações fizeram história com a camisa tricolor desde a sua criação na década de 1940 - especialmente os times montados nos anos 50, 60 e 70 permanecem ainda vivos nas lembranças e no coração da fanática torcida do Expedicionário, sobretudo de quem teve o privilégio de viver as glórias de uma época em que o campo ainda era de terra batida, sem grama.

Histórico - Em 1957, foi eleita uma diretoria do Expedicionário Sport Club formada por Jesus Maria José, o Jesus Barbeiro (diretor), Antônio Honório de Resende, então prefeito municipal (presidente de honra), padre José Hugo de Resende Maia, vigário paroquial (presidente) e Antônio Argamim de Freitas, o Totonho do Sobico (secretário e treinador).

O ex-presidente do Expedicionário, padre José Hugo de Resende Maia, atualmente vigário paroquial da Paróquia de Santo Antônio de Lagoa Dourada, onde foi pároco durante 45 anos, enviou ao JL um precioso relato no qual ele recorda a reconstrução do campo, a construção do primeiro vestiário, estatuto do clube e o memorável jogo de reinauguração do campo entre Expedicionário e Lagoense.

Campo – De acordo com o relato do padre José Hugo, o campo reinaugurado no dia 24 de julho de 1960 possuía praticamente a mesma medida de um campo oficial, um pouco inferior. A sua construção se deu graças ao empenho do então prefeito municipal de Resende Costa e também presidente de honra do time, Antônio Honório de Resende. Ele havia adquirido, naquela ocasião, um trator de pequeno porte que era conduzido pelo saudoso tratorista Nelson, conhecido popularmente como Nelson Tratorista. “Ele ficou durante mais de um mês trabalhando na construção do campo. Rebaixou o nível do campo uns 80 centímetros ou 1 metro para colocá-lo no ‘tamanho oficial’. Tudo isso graças ao prefeito que quis colaborar com o clube e com o esporte da cidade”, diz padre José Hugo. Segundo ele, esse foi o primeiro serviço do pequeno trator adquirido pela prefeitura.

Outra benfeitoria foi uma cerca construída com bambus, conforme descreve padre José Hugo: “Naquela época, não se construíam muros de cimento como hoje, pelo menos em Resende Costa. Devido a essa deficiência e também à falta de recursos financeiros, construiu-se uma cerca de bambu rachado ao meio. E assim, podia-se cobrar uma taxa de entrada para os jogos. Dorense, Lagoense, Sport do Colégio Santo Antônio, times afamados na época lá se exibiram, promovendo uma renda melhorada para o clube”.

Estádio dos Eucaliptos – Até hoje o Estádio Antônio Argamim de Freitas é conhecido popularmente como “Estádio dos Eucaliptos”, embora restam poucas árvores no local. Padre José Hugo conta como foi o plantio dos primeiros eucaliptos que apelidaram o estádio: “Mudas doadas ou compradas foram plantadas na frente do campo de bola e na lateral-nascente, onde batia mais sol. Jesus Barbeiro, os Coroinhas (entre os quais, o hoje pároco de Resende Costa, padre Fábio Rômulo Reis) e ainda o popular ‘Boquinha’ e eu combatíamos as terríveis ‘formigas cabeçudas’, para as quais o eucalipto era a mais atrativa de todas as plantas. Foi uma guerra! Colocávamos, também, esterco de gado ou de cavalos, carregados pelos Coroinhas. Jesus Barbeiro, Boquinha e eu nos encarregávamos de jogar uma minguada xícara de água, quase que diariamente, em cada muda. E assim, com o correr do tempo, pudemos ter aquelas gigantescas árvores de eucalipto, sombreando o campo e a plateia. Uns 20 anos mais tarde, por motivos de conveniência, cortaram aquelas árvores, que talvez foram vendidas para as serrarias. Foi devido a essas árvores que, em determinado tempo, o estádio foi apelidado de “Estádio dos Eucaliptos”.

Vestiário – O primeiro vestiário do campo do Expedicionário foi construído a partir de doações e de alguma economia do pouco dinheiro que o clube conseguia arrecadar na bilheteria dos jogos. Segundo o nosso cronista, tratava-se de um “pequeno e rústico vestiário para o Expedicionário. Havia um salãozinho rodeado de uma bancada de cimento, um mictório comum e um vaso sanitário. Não sei se havia um ‘vestiariozinho’”.

Inauguração – No dia 24 de julho de 1960, 57 anos atrás, uma épica partida entre Expedicionário e Lagoense marcou a inauguração do novo campo e do vestiário. Recorda-se o ex-presidente do Expedicionário: “Levamos o, naquele tempo, afamado time Lagoense, de Lagoa Dourada. Após discurso de inauguração pelo presidente e foto, deu-se a esperada partida. Não é que, por sorte nossa e azar do Lagoense, vencemos a partida por 9 a 1?! Mas, não é que, indo o Expedicionário a Lagoa Dourada, perdeu por 3 ou 4 a 1?! São coisas do esporte”.

Ainda segundo padre José Hugo, para a partida de inauguração do campo foi pintada uma grande placa, que na verdade era o placar, contendo o nome “Expedicionário X Visitante”.

Regra é regra – Os atletas do Expedicionário seguiam duras regras de conduta, previstas no estatuto do clube. “A diretoria se reunia mensalmente e tínhamos um estatuto com regras de ‘boa conduta’ para os jogadores. Dava-se até ‘balão’ por uma ou duas semanas aos jogadores infratores. E isso, muitas vezes, desagradava aos faltosos, mas... ‘regra é regra!’. No final das reuniões, fazia-se uma ata”, recorda-se padre José Hugo.

Um atleta de batina – Padre José Hugo não foi só presidente do Clube. Ele foi também jogador e treinador dos meninos da Cruzada Eucarística (antigo movimento da Igreja Católica) e dos Coroinhas. “Aos sábados, após a reunião mensal com a Cruzada Eucarística e com os Coroinhas, levávamos os que gostavam de esporte para treinos no campo do Expedicionário. Salvo algum engano, à tarde dos sábados, eu levava também os Congregados Marianos mais novos, solteiros, para treinar futebol. E também eu, de batina arregaçada, participava desses jogos. Naqueles tempos, não se permitia aos padres tirar a batina para jogar bola. Mais tarde, após muitos apelos, Sua Excia. Revma. Dom Helvécio Gomes de Oliveira, Arcebispo de Mariana, liberou os padres e seminaristas desta exigência”.

No dia 28 de fevereiro de 1961, padre José Hugo foi transferido para a Paróquia de Lagoa Dourada como pároco. “Por motivos pastorais tive que me abster do esporte”. O ministério sacerdotal em sua nova paróquia o obrigou a se afastar das atividades do Expedicionário em Resende Costa, mas não apagou a paixão de torcedor e atleta que viveu o início de uma saga gloriosa.

Na manhã do dia 9 de julho último, quando o time principal do Expedicionário pisou no novo gramado do “Estádio dos Eucaliptos” e venceu por 2 x 0 o duelo contra a boa equipe do União Santa Fé, de Ribeirão das Neves/MG, campeão da Copa Itatiaia, mais um importante capítulo foi escrito nas páginas da história do Expedicionário Sport Club - o mais tradicional clube de futebol de Resende Costa.

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