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Dona Guiomar Sampaio

15 de Junho de 2010, por Rosalvo Pinto

Dias atrás recebi, via correio, um livro intitulado “Lagoa da Prata em prosa e verso”. Surpresa das mais agradáveis: foi-me enviado pela Maria da Consolação Sampaio. Com a dedicatória: “Rosalvo, a fim de que você conheça a pequena ‘vida cultural’ de Lagoa da Prata”. Depois de bisbilhotar o livro de cabo a rabo, devo discordar de você, Consolação: nada de “pequena”! Pela publicação – aliás, coordenada pelo seu irmão, o Antônio de Pádua Lima Sampaio -, vê-se que, nessa lagoa, que dizem ser muito bonita, proseia-se e verseja-se com maestria. Pelos 87 textos do livro vejo que por aí acontece muita coisa boa. A começar, claro, por sua mãe, a dona Guiomar Sampaio. Não é por nada que ela mereceu uma homenagem especial, de folha inteira, no início do livro. Depois da homenagem ao sempre merecido Machado de Assis, segue-se a de dona Guiomar: “Pela imortal lembrança, justifica-se outra homenagem à patrona da Academia Lagopratense de Letras, Guiomar Sampaio, incondicional batalhadora em prol da cultura – uma causa tão sublime”.
 
Os escritos de dona Guiomar, da Consolação e do Toninho de Pádua de imediato me fizeram voltar ao passado. Aliás, esse é o título do gracioso poema de dona Guiomar, “Volta ao passado”: “Nem que seja necessário – Buscar o relicário – Mais escondido – Do meu coração – E tirar de lá – Com emoção
 
Também eu guardo, no relicário mais escondido do coração, tantas lembranças e emoções de minha terra natal. E em meio a essas lembranças encontrei a da família Sampaio. Aliás, entre tantos “causos e cousas”, revirando tempos atrás meu relicário, já havia encontrado as figuras de dona Guiomar e da Consolação. Alguém levou um dos meus textos à Consolação, em Lagoa da Prata (talvez o Antônio
 
“Fiqueiadmirada como você se lembra de nossa presença em Resende Costa. Foram tempos risonhos, ingênuos dos quais tenho muita saudade”, assim me escrevia a Consolação dias atrás.
 
Em um dia qualquer, a chegada de um desconhecido casal e seus quatro filhos quebrou a monotonia da vida pacata da cidade: eram o senhor Floriano Sampaio e dona Guiomar e seus filhos Consolação, Antônio de Pádua, Terezinha e Mariinha. Sô Floriano veio com o encargo de “coletor federal”. Algum tempo depois nasceu, com honra para nós, a resende-costense Mariazita. Continua escrevendo a Consolação: “Mudamos para Resende Costa em 1951, em janeiro. Ficamos no hotel de José Pio. Saímos em outubro de 1956 para Lagoa da Prata”. Lembro-me também da família morando na casa da esquina, em frente à loja do Gérson, E, mais adiante: “Rosalvo, gostaria de saber de pessoas do meu tempo aí, que fim levaram. Meus colegas de grupo, Toninha, filha de Dona Elzí, enfermeira, Nozito, Geraldo de Melo, filho de um comerciante. Umas meninas cantoras que moravam nos Quatro Cantos, órfãs de mãe, Dona Inésia. As filhas do Sr. Quinzinho (perto do Grupo), Isabel, Heloísa, Teresinha. Éramos muito amigas”. Acho que as “meninas cantoras dos Quatro Cantos” a que a Consolação se refere eram a Jamila, a Filomena e a Dalila, filhas do Sr. Miguel Turco.
 
Como compositora e poetisa, dona Guiomar deixou uma pérola de hino sacro em Resende Costa: o “hino aos neo-sacerdotes”, composto para a ordenação sacerdotal dos padres Antônio das Mercês Gomes e José Hugo de Resende Maia, em 1955. Por muitos anos esse hino abrilhantou ordenações e missas novas na cidade. A meu pedido, a Consolação me enviou a letra do hino. A música eu a tenho, ainda hoje, gravada na memória. E acrescentou: “Sei que ela [dona Guiomar] fez o hino a São Tarcísio, padroeiro da Cruzada Eucarística. Posteriormente lhe envio com a partitura”. Lembro-me dele. Nós crianças o cantávamos, empoleirados e empoeirados, na carroceria do caminhão do Zizi Vale, naqueles gostosos passeios promovidos pelo dinâmico Pe. Adelmo.
 
Dona Guiomar nasceu em Visconde do Rio Branco, em 1911. Dedicou-se desde criança à música e às letras (a poesia, o português e o francês, que falava fluentemente). Como musicista, foi pianista, violonista, compositora e coralista. Participou do “Mineiros frente a frente” da antiga TV Itacolomi, levando para Lagoa da Prata o troféu de vice-campeã. Compôs o hino de Lagoa da Prata e hinos para as escolas da cidade. Dois meses antes de seu falecimento, em 1996, recebeu sua última homenagem: a “Comenda da Inconfidência”, das mãos do então governador Eduardo Azeredo, pela sua merecida produção cultural para Lagoa da Prata e para Minas. Em seu poema “Minha mãe”, Consolação Sampaio pergunta: “Que dizer de minha mãe? – Ela foi minha estrela-guia – A cotovia-irmã de Guerra Junqueiro. – Com ela aprendi a sentir a música. – Suas nuances e harmonias - Como combinar os sons ... – E encontrar acordes perfeitos ...” 
 
Valeu a pena, Consolação, abrir com delicadeza o relicário de nossas tantas boas recordações.

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