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Gentil Vale

12 de Novembro de 2010, por Rosalvo Pinto

Se existe um resende-costense que amou ao extremo sua cidade natal, este com certeza terá sido o Gentil Ursino Vale. Tendo se casado, em 1948, com uma moça de Passa Tempo, ele tentou, junto às autoridades e políticos locais da época, a transferência de sua mulher, professora primária, para Resende Costa. Não conseguiu, tendo que mudar-se para aquela cidade. Em uma de suas obras ele se queixa amargamente: “Resende Costa foi madrasta para com este filho, que a ama demais e que nunca a esqueceu”.

Filho de Francisco Rodrigues Vale (Chico Cassiano, 1873-1927) e de Zita Agripina dos Reis (falecida em 1949), Gentil nasceu na Lavra, cercanias de Resende Costa. Teve uma infância um tanto atribulada, por problemas familiares. Com a morte de seu pai em 1927, Da. Zita se casou novamente em 1929 com o coletor estadual Joaquim de Melo. Com as naturais dificuldades de aceitação de um novo casamento, os filhos do casal se dispersaram e Gentil foi morar com seu irmão Onésimo, em Cel. Xavier Chaves. Em fins de 1930 voltou a morar com a mãe, em Resende Costa. Em 1934 foi estudar no Caraça, onde permaneceu até 1937. No ano seguinte, apresentou-se como voluntário ao 11º. Regimento de Infantaria de São João del-Rei. Em 1942 deixou o exército e foi trabalhar na Fábrica de Armas do Exército em Itajubá. Em 1948, casou-se em Passa Tempo com Maria Imaculada Faleiro (falecida em 1979), tendo tido com ela 11 filhos. Morou em Passa Tempo até 1956, trabalhando na agência local da Estatística, quando foi transferido para a agência de Divinópolis, como chefe da mesma.

Enquanto esteve morando em Resende Costa, ele se destacou pela a dedicação à cultura e à arte. Amante das letras e do teatro, com certeza uma herança da primorosa formação recebida no renomado educandário do Caraça. Gentil foi um dos protagonistas dos tempos áureos do teatro em Resende Costa nas décadas de 30 a 50. E lembrar esses tempos é lembrar os nomes do Agenor Gomes de Souza (avô do Agenorzinho Gomes) e do José Ramos. Sob a direção do Gentil foram encenadas as peças “Compra-se um marido”, comédia de José Wanderley; “O homem que nasceu duas vezes”, do Oduvaldo Viana, um dos maiores teatrólogos do Brasil; “Pertinho do céu”, de Mário Lago; “Deus lhe pague”, de Juraci Camargo; “A ditadora” e “A cigana me enganou”, de Paulo de Magalhães, entre outras. Essas peças eram levadas, sempre bem recebidas, às cidades vizinhas de Prados, Ritápolis e Dores de Campos.

Vivendo em Divinópolis, dedicou-se à atividade do magistério de Língua Portuguesa e à arte de escrever. “Confidências do agreste” (1982), “Lamento da Terra Verde e outros contos” (1986) e “Clara fonte” (1990) foram algumas de suas produções em crônicas e contos. Destacou-se também como memorialista. A produção de suas memórias pessoais teve como objetivo, segundo ele, “tentar construir a perenidade para pessoas e coisas de minha terra”. Essas memórias compõem o trio “Escavações no tempo” (1984), “Ecos de ontem” (1989) e “Visões perdidas” (1991), nas quais ele recupera fatos, curiosidades, festas, costumes, personalidades de destaque e a vida simples e folclórica de inúmeros resende-costenses. “São lembranças que teimam em não morrer em mim”, lembra o escritor, abrindo “Escavações no tempo”. Poucos escreveram tanto sobre Resende Costa como ele, colocando-se ao lado do Prof. José Augusto de Resende, do Prof. Antônio de Lara Resende e do Mons. Nelson Rodrigues Ferreira.

Foi, em 1961, um dos fundadores da Academia Divinopolitana de Letras, da qual foi o primeiro presidente. Tendo sido indicado para integrar a Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, de Belo Horizonte, tomou posse, excepcionalmente e para sua alegria, em Resende Costa, em 1984. Escolheu como patrono o Dr. José Vilela da Costa Pinto, médico e político por mais de 30 anos em Resende Costa, da qual foi prefeito na década de 40. Sua posse foi patrocinada e prestigiada, além da Academia que o acolhia, pela Paróquia Nossa Senhora da Penha (Pe. Nelson Rodrigues Ferreira) e pela Prefeitura Municipal (Prefeito Gilberto Pinto) e homenageado pela Associação Cultural Movimento Raízes, ainda atuante àquela época.

Gentil abre sua obra “Visões perdidas” mais uma vez lembrando-se de sua terra natal. “Que o passado de minha saudosa e amada Resende Costa, em determinada etapa de sua vida, continue vivo e atual para os que hoje lá respiram seus ares vivificantes e para os que ainda hão de vir, sucedendo-se no tempo”. E, confirmando ainda uma vez seu acendrado amor: “São páginas de saudades, escritas com as tintas do coração”.

(Agradeço ao Tomás da Tereza (o “Chefe”) a sugestão de escrever sobre a figura do Gentil Vale. “Era uma pessoa que amava muito nossa terra”, justificava-me o Tomás. E ele tinha razão).

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