Desde quando conheci esta bela canção de Ataulfo Alves, me lembro das “minhas professorinhas” do antigo primário, de Resende Costa e de São João del-Rei. Isso mesmo, comecei em Resende Costa em 1949 e terminei em fins de 1952 em São João del-Rei. Tive três professoras: dona “Tenga”, 1º semestre do 1º ano, dona Terezinha Macedo Lara, do 2º semestre de 1949 ao 1º semestre de 1952, no Grupo Escolar Assis Resende e dona Hilda, em São João del-Rei, no Grupo Escolar Tomé Portes del-Rei, 2º semestre de 1952. Pena que aqui e agora não me lembro dos nomes completos da primeira e da última professora, com uma ressalva ainda, de que “dona Tenga” era o apelido familiar da professora, vinda de Belo Horizonte naquele ano.
Dona Tenga, jovem bonita, chegou em Resende Costa em princípios de 1949 com uma bagagem moderna, fazendo furor com suas novidades didáticas. Hoje eu falo assim, mas naquele tempo a gente se encantava com as novas artimanhas para o acesso às primeiras letras e aos primeiros números. Lembro-me de que, nas primeiras aulas, ela já vinha distribuindo mãos cheias de tampinhas de garrafa nas carteiras para o início da famosa aritmética. Morava na pensão do Osório Chaves, ali nos “Quatro Cantos”, onde hoje está o supermercado “Sobrado”.
Mas durou pouco o alvoroço didático de dona Tenga. Ela conseguiu voltar para Belo Horizonte para ocupar uma vaga inesperada. Quando a diretora do Grupo, dona Ana Rocha (dona Nininha), veio à sala para informar que ela voltaria para BH no dia seguinte, ficamos perplexos e tristes. Dona Tenga despediu-se da turma e informou que no dia seguinte ela passaria de avião por cima da cidade, por volta das nove horas da manhã e haveria uma surpresa para nós. Naqueles tempos havia uma companhia aérea chamada ONTA (Organização Mineira de Transportes Aéreos) que fazia uma linha SJdR/BH, entre outras. Naquela noite os meus pais, o Góes e a Trindade, me levaram à pensão para me despedir dela. Ganhei uma caixinha de lápis de cor, daquelas de 6 cores, para nós naquele tempo e naquela pobreza era um presentão.
E assim aconteceu. Ali pelas nove horas, a turma já estava reunida na pracinha do centro (hoje Praça Doutor Costa Pinto). Quando todos se perguntavam qual seria a surpresa, veio chegando o ronco do avião. O piloto fez um rasante e um objeto foi jogado, caindo na horta ali onde moram hoje a dona Naná do Hugo, a Lúcia, sua filha e o Nego. Corremos para lá. Era uma sacola de balas. E foi-se a Dona Tenga, deixando saudades.
Dona Terezinha Macedo Lara ficou com a turma, a partir do 2º semestre. E nos levou, com galhardia, paciência e competência, até o 4º ano, em 1952. Lembro-me de todas as “professorinhas” da época: as donas Marisica, Nair, Ivone Maia, Célia, Nonó, Ruth, Olga, Ninfa, Maria José Hannas, Inésia Hannas, Guiomar e Márcia (essas duas de passagem por Resende Costa). Lembro-me dos funcionários: meu tio “Geraldo Porteiro” a Donana do Zé Reis e a Delfina. Tio Geraldo, além de porteiro, era um disciplinador que, às vezes saía do Grupo para buscar, na marra, alguns dos mais desordeiros e fujões, como o Valmir, neto da Sá Maria Rita e o Marcinho, do Osvaldo Maia. Tio Geraldo também era o encarregado de distribuir o lanche para os alunos mais pobres, que pertenciam à “Caixa”. Eu, da turma dos “remediados”, levava no embornal de pano uma garrafinha (daquelas de magnésia) com o café e os biscoitos da dona Trindade. Os meninos andavam de calça curta, com suspensórios de pano. Não havia uniformes. Nada de sapatos: pé-no-chão. Os sapatos, feitos na cidade, eram para festas e para as missas.
Em julho de 1952 meus pais se mudaram para São João del-Rei. Dona Ninfa, antes professora em Resende Costa, batalhou para me encaixar numa turma de 4º ano no Grupo escolar Tomé Portes del-Rei, no Matozinho. Havia duas turmas, uma dos menores e outra dos maiores, na qual havia uma única vaga. Dona Hilda sofria com os marmanjos que pintavam e bordavam na sala e a chamavam de “dona zebra”. Fiquei horrorizado, no meu cantinho, com saudades da dona Terezinha... Chegou o fim do ano e tivemos a festa de formatura, realizada no salão da Rádio de São João del-Rei.
E recorro ao Ataulfo:
“Eu daria tudo que eu tivesse
Prá voltar aos dias de criança.
Eu não sei pra que a gente cresce
Se não sai da gente essa lembrança
...
Que saudades da professorinha
Que me ensinou o bê-a-bá...”